A conferência foi organizada pela Provedoria Municipal dos Animais de Lisboa no passado dia 25 de janeiro e dedicou toda a manhã ao tema “Animais e Pessoas, a vida e a morte”, uma questão que diz muito à classe dos médicos veterinários e à restante equipa que lida com a saúde animal em todas as suas fases, do nascimento à morte. Nesse sentido, Sónia Miranda, vice-presidente da Ordem dos Médicos Veterinários (OMV), reconheceu na intervenção que fez no momento de debate do evento, que as equipas em medicina veterinária sentem “uma responsabilidade muito grande” quando ficam com a vida de um animal nas mãos, “como se lhes entregassem uma criança”.
Fazer a leitura das sensações, da dor que possivelmente o animal pode sentir, das emoções que este expressa “faz com que os profissionais de saúde se envolvam muitíssimo com os animais que estão hospitalizados, que estão [internados] para cirurgia, etc.” e por esse motivo, acrescentou a médica veterinária, os elevados índices de burnout verificados entre os profissionais das equipas em medicina veterinária – desde médicos veterinários, enfermeiros veterinários a auxiliares − “tem a ver, obviamente, com as cargas de trabalho, mas, sobretudo, com o nível de emoção com que se trabalha”.
“O apoio pensado por parte da OMV passa pela criação de ‘um gabinete de apoio psicológico’ ao qual as equipas poderão recorrer sempre que sentirem necessidade” – Sónia Miranda
 
A dirigente reconheceu que “existe uma necessidade identificada [de cuidar da saúde mental] e a Ordem neste momento está empenhada em ajudar estes profissionais na forma como lidam com a morte − muitas vezes com um envolvimento emocional gerado por uma relação de tratamentos crónicos, por exemplo, e da responsabilidade de terem ficado com o animal [internado] − e, obviamente, em muitas situações, com algum sentimento de falha porque cabia ao profissional fazer com que aquela morte pudesse não existir”. E atendendo às necessidades identificadas entre os profissionais de saúde animal, “a Ordem também está envolvida naquilo que pode ser o apoio, não só aos médicos veterinários, mas também às equipas, para estarem preparados para lidarem com a perda e também para lidarem com o segundo passo que é fundamental, e extremamente doloroso, da comunicação da morte ao tutor. São eventos emocionais muito fortes para estas equipas”.
À margem do encontro, Sónia Miranda explicou à VETERINÁRIA ATUAL que o apoio pensado por parte da OMV passa pela criação de “um gabinete de apoio psicológico” ao qual as equipas poderão recorrer sempre que sentirem necessidade e que também pode ter no plano de atividades a realização de ações de formação que capacitem os profissionais que lidam com a saúde animal a gerir as questões de saúde mental.
Aquando da realização do encontro, a dirigente da OMV não avançou com a data da criação dessa estrutura, revelando que ainda estão num processo de auscultação de gabinetes de psicologia sobre o melhor desenho organizacional e de funcionamento dessa valência na Ordem.
Certo é que a questão da saúde mental dos profissionais da veterinária “tem-se agravado” ao longo dos anos e a tendência é para continuar, até porque, como frisou na intervenção que fez na palestra, as carências financeiras das famílias, adensadas pela inflação, colocam igualmente pressão sobre as equipas. A questão dos valores praticados em medicina veterinária “são mais um peso para as equipas que estão a trabalhar porque são elas que lidam com a incapacidade [financeira dos tutores], com o facto de nem toda a gente ter capacidade económica para pagar os tratamentos e têm de lidar com esta frustração porque também é uma frustração para os profissionais que estão a trabalhar” verem que não é possível prestar melhores cuidados ao animal, explicou a vice-presidente da OMV.