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FisioPet Algarve: “A fisioterapia e a reabilitação são um Mundo”

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Com as portas abertas desde o início de março deste ano, o FisioPet Algarve – Fisioterapia e Reabilitação Animal trouxe para esta região do País uma resposta clínica que faltava no âmbito da medicina veterinária. Clarisse Breda explica à VETERINÁRIA ATUAL como nasceu este Centro de Atendimento Médico-Veterinário (CAMV) diferenciado e como os colegas da região receberam bem este ramo do saber clínico cada vez mais utilizado na recuperação dos animais de companhia.

Era uma ideia que “estava atrás da orelha” de Clarice Breda há algum tempo. A médica veterinária tem um CAMV no Algarve há quase 10 anos com o marido, também ele médico veterinário, no qual viam entrar-lhes pelo consultório uma frequência crescente de casos que poderiam beneficiar de uma resposta na área da fisioterapia e reabilitação. “Eram sobretudo casos ortopédicos que necessitavam de fisioterapia, mas não tínhamos onde a realizar. Existem [na região] alguns colegas que se dedicam um pouco a esta área, mas não havia um sítio que fizesse fisioterapia e reabilitação, com um espaço e equipamentos adequados”, conta a médica veterinária.

 

O interesse por esta área foi crescendo no íntimo da médica veterinária, contudo, foi um caso em particular a espoletar toda uma série de acontecimentos que culminaram na criação do  FisioPet Algarve – Fisioterapia e Reabilitação Animal na freguesia da Guia, em Albufeira. “Foi uma cirurgia ortopédica em que, depois, a paciente necessitou de fisioterapia e nós começámos a fazer. Entretanto, por essa altura, a empresa também passou a ter outro espaço físico e quisemos que fosse dedicado unicamente à fisioterapia e reabilitação”, recorda.

Com estes dois apontamentos, Clarisse Breda admite que as carências sentidas na prática clínica impulsionaram o nascimento desta nova unidade, mas acaba também por reconhecer que o gosto pessoal pelas matérias da recuperação de animais de companhia – que foi crescendo dentro dela quando via os casos que lhe passavam pelas mãos – acabou por ser determinante.

 

“Existem [na região] alguns colegas que se dedicam um pouco a esta área, mas não havia um sítio que fizesse fisioterapia e reabilitação, com um espaço e equipamentos adequados” – Clarisse Breda, diretora clínica do FisioPet Algarve

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A curiosidade sobre os assuntos ligados à fisioterapia e à reabilitação animal acabou por levá-la até ao Hospital Veterinário do Restelo para fazer uma formação com a equipa do Centro de Reabilitação Veterinária – Pet Restelo Fisio & Spa, liderada por Ana Ribeiro, e passou igualmente pelo Hospital Veterinário da Arrábida para beber do conhecimento de mais de 15 anos de experiência de Ângela Martins no campo da medicina veterinária. Depois dessas experiências decidiu que necessitava de aprimorar ainda mais o conhecimento e, neste momento, está a realizar uma formação em Madrid em medicina física e de reabilitação através da Improve Veterinary Education e tudo o que tem aprendido leva-a a dizer com entusiasmo: “A fisioterapia e a reabilitação são um Mundo”.

 

Da ortopedia à neurologia e ao desempenho desportivo

Clarisse Breda percebeu que o mundo de possibilidades existente no ramo da recuperação funcional do animal lhe dava a oportunidade de ajudar a melhorar a qualidade de vida dos clientes que seguia, fosse em contexto cirúrgico ou não, e incrementar os resultados dos atos médicos, o que também é apreciado pelos profissionais médicos.

 

É certo, reconhece, que a área onde é mais utilizada a medicina física e de reabilitação é a ortopedia, seja no contexto de uma cirurgia ou então de recuperação e manutenção da mobilidade do animal. A médica veterinária dá o exemplo da displasia da anca nos cães. Se existir a possibilidade de uma cirurgia, o animal pode começar a fisioterapia logo após a intervenção, o que ajudará a recuperar a mobilidade mais rapidamente e também a melhorar os outcomes clínicos do ato clínico realizado. Se, por questões clínicas do animal, como a idade avançada, ou por questões de oportunidade dos tutores, o animal não puder ser intervencionado, a fisioterapia “vai ajudar no fortalecimento muscular e no controlo da dor. Esse é mesmo o principal objetivo da reabilitação: controlar a dor no animal”, explica.

A neurologia é outra área clínica em que os animais podem retirar benefícios da fisioterapia e reabilitação, nomeadamente os casos com paresias, hérnias discais ou síndrome vestibular. “Neste grupo de doenças a parte locomotora é muito afetada, assim como a parte psicológica. Acreditamos que os animais também têm um lado emocional e na medicina física e de reabilitação conseguimos ajudá-los nesse campo. Afinal, um animal que está debilitado fisicamente também acaba por ficar debilitado emocionalmente”, explica a diretora clínica do FisioPet Algarve. Ao minorar a dor e ao recuperar a funcionalidade, o animal consegue readquirir a mobilidade que lhe permite voltar aos passeios ou às brincadeiras, fundamentais para o bem-estar emocional.

Depois existem outros campos clínicos de aplicação da fisioterapia, como as doenças metabólicas, que também podem afetar a locomoção e, claro, as questões do peso. Não é de desprezar que, tal como acontece com os humanos, os dados sobre o excesso de peso e a obesidade estejam a aumentar entre os animais de companhia, com as consequências já descritas pela ciência ao nível das articulações e da mobilidade.

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No entanto, não é apenas em casos de prevenção da doença ou de recuperação de estados de doença que é usada a medicina física e de reabilitação. Clarisse Breda mencionou também os benefícios que cães saudáveis, olhados como atletas de competição, podem ter com estas técnicas, como por exemplo os cães praticantes de  agility. São verdadeiros atletas que precisam recuperar músculos e articulações do esforço realizado numa competição ou necessitam de preparar-se para as exigências de um campeonato em particular. E, tal como acontece com os atletas humanos, um plano de acompanhamento de fisioterapia pode ajudar a potenciar os resultados.

Referenciação: a chave-mestra da medicina veterinária moderna

Voltando à história do CAMV. Com um interesse objetivo pela área e com um espaço já apetrechado com os equipamentos necessários, estava na hora de apresentar o projeto aos colegas médicos veterinários da região. Clarisse Breda organizou um evento a 9 de março deste ano que marcou a inauguração das instalações, a apresentação da equipa – composta pela médica veterinária e por uma enfermeira veterinária – e a apresentação dos serviços que o CAMV tem para a comunidade médica veterinária. A diretora clínica relata que “a ideia foi bem acolhida, disseram-nos que fazia mesmo sentido [apostar nesta área] e que faltava este tipo de resposta na região. Foi juntar o útil ao agradável como se costuma dizer”.

O espaço é pequeno, pouco mais de 40 m2, e por isso foi tudo pensado ao pormenor para distribuir pelas duas divisões os serviços que pretendiam disponibilizar aos colegas, já que a ideia é funcionarem por referenciação dos outros CAMV da região.

Na divisão de entrada, que acolhe os clientes, está a receção e a coqueluche do FisioPet Algarve, se assim se pode chamar: a passadeira subaquática para realizar hidroterapia. “É, sem sombra de dúvida, o serviço mais completo em termos de indicações, a par do laser”, indica a médica veterinária. O treino muscular e a perda de peso estão, talvez, entre as principais indicações desta técnica realizada numa passadeira rolante colocada numa micro-piscina com cerca de 1500 litros de água aquecida a 28º, tratada tal como acontece nas piscinas de modo a poder ser reutilizada. “Só quando temos acidentes com xixi ou cocó é que acabamos por ter de descartar essa água, caso contrário é controlada diariamente, desinfetada com raios UV e reutilizada”, explica Clarisse Breda. Um pormenor que acaba por ser de vital importância numa região do País que, de tempos a tempos, se depara com constrangimentos relacionados com a falta de água, como aconteceu no início deste ano.

As restantes técnicas são realizadas na outra sala. Entre elas a laserterapia tem, também, um grande número de indicações, nomeadamente o tratamento de feridas, o tratamento de edema pós-operatório ou os casos de osteoartrite, já que o laser ajuda na regeneração dos tecidos, pelo aumento da circulação e criação de neovascularização.

“[A fisioterapia] vai ajudar no fortalecimento muscular e no controlo da dor. Esse é mesmo o principal objetivo da reabilitação: controlar a dor no animal” – Clarisse Breda, diretora clínica do FisioPet Algarve

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Outro serviço disponível é a eletroestimulação, com particular relevância na recuperação da parte muscular, pois, como explicou a médica veterinária, “sabemos que quando um músculo deixa de ser utilizado, em cinco dias pode perder 50% da sua capacidade”.

Nessa segunda sala são ainda aplicadas a termoterapia, tanto de frio como de calor, as massagens, o ultrassom, a acupuntura – realizada por um profissional externo – e a cinesioterapia, uma terapia que utiliza o movimento, tanto passivo como ativo, para trabalhar certos ossos, tendões e músculos.

O método pelo qual os clientes chegam ao CAMV é, então, por referenciação dos CAMV vizinhos, que, com a apresentação feita por Clarisse Breda, além de ficarem a conhecer todos os serviços da clínica, também tomaram conhecimento das indicações e potencialidades de cada uma das técnicas disponíveis. “Por exemplo, alguns não tinham noção de que a reabilitação a seguir a uma cirurgia ortopédica pode, salvo raras exceções, começar a ser feita logo no dia a seguir”, explica a diretora clínica, reconhecendo que o balanço do primeiro mês de atividade – altura em que falou com a VETERINÁRIA ATUAL – é bastante positivo.

Na grande maioria das situações, os casos referenciados têm sido de cães. Os gatos, pela personalidade única e desafiante podem, eventualmente, dificultar o momento da fisioterapia, mas Clarice Breda aponta os bons resultados que estas técnicas têm também em felinos como, por exemplo, no tratamento de feridas.

Depois de indicado pelo profissional de medicina veterinária, o animal é avaliado por Clarisse Breda em toda a sua complexidade, se for necessário são pedidos mais exames complementares de diagnóstico ao médico que referenciou e é feita toda uma anamnese que vai determinar um plano terapêutico com a técnica mais indicada para o caso clínico em questão e o número de sessões recomendadas. Esse plano é depois partilhado com o médico referenciador e ajustado às possibilidades do tutor (ver caixa).

“Acreditamos que os animais também têm um lado emocional e na medicina física e de reabilitação conseguimos ajudá-los nesse campo. Afinal, um animal que está debilitado fisicamente também acaba por ficar debilitado emocionalmente” – Clarisse Breda, diretora clínica do FisioPet Algarve

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O trabalho do FisioPet Algarve e de outros centros com diferenciação em determinadas áreas clínicas só é possível pela mudança de paradigma que a medicina veterinária tem vivido nos anos mais recentes. Uma cada vez maior diferenciação dos profissionais nas várias áreas do saber médico veterinário tem vindo a desconstruir a velha ideia “de que todos tínhamos de saber de tudo”. “Cada vez mais estamos a diferenciarmo-nos e as pessoas (os tutores) percebem a importância desse conhecimento mais direcionado para determinada área”, refere a clínica ao explicar um processo que em muito se assemelha ao que se passa há décadas na medicina humana.

E tal como acontece em muitas equipas multidisciplinares que acompanham pessoas em hospitais de medicina humana, também o FisioPet Algarve trabalha em equipa com os médicos que referenciam os casos, fazendo pontos de situação sobre a evolução do animal e reavaliando os progressos alcançados pelas terapias utilizadas. Uma proximidade relacional que faz com que “os tutores se sintam acompanhados e felizes (pela atenção dada ao caso) e os colegas também fiquem agradados por verem que, com este trabalho em equipa, os casos que eram expectáveis recuperarem ao fim de três meses, recuperam ao fim de um mês. É verdadeiramente uma relação de win-win”, remata. Sobretudo, ganham os animais: ganham saúde e ganham qualidade de vida.

Investir na saúde do animal de companhia

Uma das matérias sensíveis na medicina veterinária é a questão dos custos. Sem um serviço público de saúde animal e com o ramo dos seguros de saúde para animais ainda com um mercado pouco expressivo em Portugal, as expensas acabam por estar sempre do lado do tutor.

Questionada sobre a forma como os tutores encaram o investimento em planos de fisioterapia e reabilitação para o animal de companhia, Clarisse Breda tem uma perspetiva otimista. “Os planos terapêuticos de reabilitação do animal são sempre elaborados não só consoante a necessidade do paciente, mas também conforme as possibilidades dos tutores. Há uma adaptação [do plano], porque cada caso é um caso”, clarifica. E dá exemplos: se um animal necessita de fazer três sessões por semana, mas isso é incomportável para o tutor, seja por impedimentos financeiros ou laborais, adapta-se o plano para ser realizada uma sessão por semana e o tutor leva instruções sobre os processos que pode realizar em casa. “Os tutores são compreensivos, trabalham também em equipa connosco, e pedimos vídeos dos trabalhos de casa” para ver os progressos alcançados e ajustar o que for necessário, conta a médica veterinária.

Mas, da experiência que o tempo de portas abertas já lhe permitiu recolher, a diretora clínica considera que, cada vez mais, “se um tutor já fez um investimento numa cirurgia no animal, é comum que, para melhorar os resultados desse ato médico, aceite investir um pouco mais em medicina física e de reabilitação”.

*Artigo publicado na edição 183, de junho, da VETERINÁRIA ATUAL.

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