Em que consiste o programa ResPig?
O programa ResPig foi criado para juntar, numa só ferramenta, todo o tipo de serviços de apoio técnico, como avaliação e diagnóstico de problemas respiratórios em suinicultura. Se já eram proporcionados dois tipos de serviço – análises de diagnóstico e avaliações de matadouros – passaram a ser feitas auditorias às explorações. Estas avaliam o estado da exploração face a diferentes agentes, assim como factores gerais como a instalação, ventilação, medidas de maneio, limpezas, higiene e desinfecção. É, no fundo, um sistema de avaliação de parâmetros que vai de zero a três, sendo zero equivalente a ‘ausente’ e três a ‘grave’.
Depois da avaliação, quais os próximos passos?
Numa fase inicial faz-se a auditoria à exploração, da qual se obtém uma pontuação que é introduzida numa ferramenta online, de onde obtemos um relatório da exploração num esquema de cores tipo semáforo. Desta forma conseguimos perceber quais os pontos que estão a funcionar bem, quais os que precisamos de rectificar e quais os que necessitam de ser alterados. Este relatório é baseado nos resultados das análises de diagnóstico, na avaliação do matadouro e na auditoria à exploração. Os dados de cada doença são introduzidos, então, numa outra ferramenta online – o simulador económico – que mostra o retorno de investimento de doenças como o circovírus (PCV), o síndrome reprodutivo e respiratório suíno (PRRS), pneumonia enzoótica (mycoplasma hyopneumoniae) e a pleuropneumonia (actinobacillus pleuropneumonia – APP). Para cada uma destas patologias, o simulador económico vai dizer-nos quanto é que ganharíamos, por animal, se iniciássemos uma nova vacinação. Por exemplo, uma exploração que vacina apenas para mycoplasma (estamos a falar apenas de leitões) e se quiser iniciar uma nova vacinação, o simulador vai revelar qual a doença que, em teoria, iria trazer um maior retorno económico se começasse o tal programa de vacinação. Sintetizando, através do simulador obtemos respostas como: ‘com a vacinação que se está a fazer, consegue-se retorno económico de X’, ‘se deixar de a fazer vai ter um prejuízo de Y’ e ‘se iniciar uma nova vacinação, se for de APP, alcança um retorno de três euros e de aborto de azul de quatro’. O valor do retorno económico já inclui o custo das vacinas, portanto apenas expressam o lucro. O Respig contempla ainda outras patologias como doença de Aujeszky, gripe, rinite atrófica e Haemophilus parasuis.
Em que consiste a auditoria à exploração?
A auditoria é um formulário de 24 páginas, com respostas de zero a três. Eu, o médico veterinário e a equipa de trabalho da exploração preenchemos o questionário durante uma visita ao local. Um dos aspectos positivos da auditoria é que a informação fica registada e disponível online, portanto está acessível a qualquer momento. O ResPig consiste em dois momentos de avaliação, sendo que no primeiro aconselhamos certas medidas, em função do diagnóstico que fazemos da exploração. No segundo avaliamos os resultados com o objectivo de perceber aquilo que melhorou e que lucro se obteve. As duas auditorias são espaçadas por seis meses.
Referiu o registo da informação como um aspecto positivo. Que outras mais-valias aponta neste programa?
O programa inclui uma bateria de análises muito completa. Permite a qualquer médico veterinário saber que tipo de problemas respiratórios estão presentes numa determinada exploração, nomeadamente quais os agentes patogénicos que estão a circular e a causar problemas. Possibilita, no fundo, obter um quadro geral muito bom da exploração. Outro ponto a realçar é o da avaliação do matadouro, bastante importante ao nível do mycoplasma e do APP já que, por vezes, há ausência de sintomatologia clínica, mas chegamos ao matadouro e é detectado o problema. Depois há a componente da auditoria cuja mais-valia é um relatório global com um esquema de cores que, de uma forma muito simples e directa, traduz os problemas na exploração. Com o ResPig, de uma forma sistemática, é possível fazer a avaliação do estado da exploração, sendo que a avaliação no tempo permite observar o controlo que tivemos de determinadas doenças. Por último temos a parte do simulador económico. Hoje em dia, em suinicultura, cada vez mais se tenta produzir ao máximo, gastando o mínimo e torna-se por isso muito importante perceber quais as vacinações de leitões que representam um retorno económico mais significativo. Por exemplo, alguns dos produtores que vacinam os leitões contra o PRRS estão a trocar esta vacina pelo circovírus… o programa ajuda-nos a perceber se essa troca pode ou não ser vantajosa, dado que nos possibilita saber o retorno económico de iniciar novas vacinações ou manter o protocolo actual. Já houve casos de auditorias cujos resultados, no terreno, não foram a introdução de novas vacinas, mas o ajuste dos calendários existentes.
E, como já referiu, toda a informação que é gerada fica disponível online.
Sim, existe um registo online que pode ser acedido a qualquer momento pelo médico veterinário. O que é bastante útil para, por exemplo, defender a sua posição perante o produtor. Por outro lado, também é uma óptima ferramenta de trabalho do dia-a-dia, dado que muitas vezes são feitas sugestões que não são anotadas e, por isso, podem acabar esquecidas.
O ResPig só se aplica às explorações com problemas?
Não, o programa também pode ser usado em explorações que não tenham problemas, pois permite-nos monitorizar se continuam a funcionar correctamente.
E só se aplica a doenças respiratórias?
A auditoria é focada nos problemas respiratórios, mas estende-se às boas práticas de maneio em suinicultura. O ResPig é muito abrangente pois inclui a classificação de instalações, medidas de biossegurança, taxas de crescimento, assim como diversos dados zootécnicos. São medidas que devem ser optimizadas para minimizar os prejuízos económicos relacionados com as doenças. De destacar ainda que o ResPig é um programa centrado na descendência, ou seja, na recria e engorda.
Há quanto tempo está a decorrer?
Iniciámos a implementação do programa há cerca de um ano, nomeadamente com a tradução de todos os materiais, como a brochura ou a informação contida no site, que em breve terá uma versão em português. É nesta página que é guardada a informação relativa às auditorias e intervenções que realizamos. No início fizemos ainda auditorias experimentais com alguns clientes, para percebermos como melhor direccionar o programa. A difusão do ResPig para um mercado mais alargado principiou a meio de 2010.
Que balanço faz da sua implementação?
Um balanço extremamente positivo, pois o programa permite de forma muito sistemática e estruturada avaliar as explorações. Apesar de não nos dar uma solução milagrosa, permite-nos sistematizar uma série de conceitos que nos possibilitam diagnosticar um vasto conjunto de problemas, alguns deles já identificados. Mas tendo uma nova abordagem desses problemas, são sugeridas medidas que os ajudam a resolver, com excelentes resultados. Por exemplo, em casos em que se suspeitava qual a doença envolvida, como não se tinha a certeza, não se iniciava qualquer medida de controlo. Além disso também tenho tido um bom feedback por parte dos colegas. O ResPig é uma ferramenta muito útil que, em certas circunstâncias, justifica determinadas medidas perante as administrações. Hoje em dia torna-se cada vez mais complicado sugerir novas vacinações, pois implicam mais um custo. O programa permite olhar para as novas vacinações como um investimento. E reitero que, frequentemente, os resultados das auditorias revelam que aquilo que é necessário é optimizar medidas de maneio e não a introdução de vacinas.
E que balanço faz em termos da saúde das explorações portuguesas?
Ao nível respiratório, quase 90 por cento das explorações vacinam contra o mycoplasma. Esta vacinação, com o recurso a um calendário ajustado a cada exploração, permite de forma eficaz minimizar os problemas relacionados com este agente. Por outro lado, tendo sido recentemente lançadas as vacinas de circovius, percebeu-se uma melhoria substancial da sanidade de muitas explorações, nomeadamente através da redução da utilização de antibióticos. No fundo, a sanidade tem vindo a melhorar. Não obstante, por outro lado, descobriu-se problemas que são muitas vezes alvo de sub-diagnóstico. Apesar de não se encararem como problemas, de tempos a tempos há surtos que resultam em perdas económicas muito grandes, como é o caso do APP que foi diagnosticado em 50 por cento das auditorias que fizemos. Portanto, está identificado como uma causa de perdas económicas reais e a implementação de medidas tem resultados quase imediatos, nomeadamente ao nível da rejeição em matadouros. Com o controlo dessa doença, quer através de medicação, quer de protocolos de vacinação conseguiu-se melhorar a situação. Em termos de sanidade respiratória em Portugal, saliento o circovirus, o mycoplasma e o PRRS, que em algumas explorações é um problema respiratório, além de reprodutivo, como os agentes primários. No entanto, o APP é cada vez mais um problema emergente. Nos países nórdicos, que trabalham com reduzida carga de agentes, o APP é uma situação grave, já descrita como um problema de explorações com alta sanidade. Em Portugal, algumas explorações tendem nesse sentido, cada vez melhores medidas de biossegurança e de higiene, mas conforme as explorações evoluem, surgem outras doenças.
Estas doenças podem co-existir numa mesma exploração?
Sim e quando co-existem interagem entre si aumentando o impacto económico umas das outras, tornando difícil perceber qual é o player principal em cada exploração.
À medida que o programa vai sendo implementado vão tendo, cada vez mais, noção da realidade das explorações do nosso país. Sabendo que Portugal se debate com o problema da falta de dados/estudos, tencionam utilizar os dados recolhidos para efectuar algum trabalho de investigação mais detalhado?
Numa fase inicial não está agendada qualquer utilização nesse sentido. Mas a longo prazo, partindo do pressuposto que cada vez mais pessoas vão usar o programa, há a perspectiva de elaborar um estudo que permita aprofundar os principais problemas identificados em Portugal.