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Entrevista Jorge Cid: Estamos a arriscar muito este ano

Entrevista Jorge Cid: Estamos a arriscar muito este ano

Voltar aos comandos da APMVEAC não estava nos seus planos. Então o que fez Jorge Cid voltar a presidir a Associação Portuguesa de Médicos Veterinários Especialistas em Animais de Companhia? A perspetiva de que a associação morreria se nada fizesse e o desafio que tem pela frente: voltar a dar vida ao projeto que iniciou em 1990.

As eleições da APMVEAC decorreram no passado mês de setembro. Porque sentiu necessidade de se candidatar ao cargo de presidente?

 Não senti propriamente necessidade, quase que me obrigaram a apresentar uma candidatura (risos). Houve uma demissão da anterior direção, numa altura em que já estava completamente desligado da APMVEAC. Fui sócio fundador e passei pelos cargos todos, desde secretário-geral, vice-presidente, presidente e presidente da assembleia geral. Saí em bom tempo, numa altura em que a associação estava num fase áurea da sua vida, com muita atividade, muito empenho e muitos sócios. Representou um papel fundamental na classe, nomeadamente na aprovação do ato médico-veterinário, do regulamento dos CAMV’s, foi tudo feito por nós. A associação era sempre contactada, quer pela OMV, quer pela DGV e tinha um certo protagonismo.

 

Então o que correu mal?

Por vários motivos as coisas não vieram a correr tão bem. A última direção demitiu-se, um pouco pressionada por algumas demissões internas da sua equipa e quase que me obrigaram a concorrer. De uma lista já feita e que me pediram para presidir, limitei-me a fazer uma composição muito pequena de duas pessoas. Alguns sócios fundadores falaram comigo e pediram-me para não deixar morrer a associação. Até ao penúltimo dia do prazo limite de apresentação das candidaturas tinha-me recusado, pois era algo que tinha deixado para trás. Ainda assim era uma associação que me dizia algo a nível sentimental porque vi-a nascer e contribui muito para o seu desenvolvimento. Custou-me ver a associação no estado em que estava, em que já ninguém acreditava nela e quase sem sócios. É um desafio porque acho que cada vez mais, e nesta altura de crise profunda em toda a classe portuguesa, faz falta uma organização de classe que defenda e represente os interesses de todos. Haver alguém que tenha uma palavra a dizer no exercício desta profissão, que é um ramo da veterinária – o exercício da clinica de animais de companhia – que cada vez tem mais protagonismo, pois também não há muitas mais saídas profissionais neste momento.

 

No nosso país é complicado encontrar outras saídas profissionais?

É complicado. Antes a medicina veterinária tinha várias saídas profissionais, nomeadamente clínica de grandes e pequenos animais e toda a parte de inspeção sanitária, investigação. Havia um setor que absorvia imensos veterinários: o Estado. No tempo em que me formei era muito fácil ir para o Estado, para as direções regionais ou para a DGV. Hoje em dia o Estado não admite ninguém e a nível rural também houve uma concentração em grandes explorações, em que um só veterinário, com um ajudante, faz muitos animais concentrados numa exploração grande, sobretudo nas explorações leiteiras. Com a diminuição da produção pecuária e com a concentração dessas explorações cada vez há menos saídas profissionais. Houve um incremento muito grande da clínica de equídeos e nos pequenos animais. Hoje em dia faz-se praticamente tudo o que se faz em medicina humana aos animais e há uma consciencialização maior por parte dos donos dos animais para o tratamento.

 

Mas é importante que os veterinários façam essa divulgação dos novos tratamentos disponíveis.

Exato. Acho que a associação não pode continuar a ser o que era no passado, uma organização para fazer eventos, congressos e encontros científicos. Isso está um pouco esgotado porque há muita gente a fazer o mesmo, quer em Portugal, quer no estrangeiro. Hoje em dia é muito fácil ter acesso à informação e as pessoas não precisam ir a um congresso para absorverem informação. Têm palestras, por vezes promovidas por laboratórios, que são gratuitas, outras promovidas por organizações que cada vez fazem mais formação e até por alguns hospitais e clínicas que também se estão a virar, como fonte de receita, para a organização de cursos teórico/práticos. No fundo é uma tentativa de arranjar mais uma fonte de receita numa altura em que é necessário, em que as coisas não estão tão bem.

 

Após vencer as eleições, o que sentiu necessidade de fazer imediatamente?

Como não estava minimamente à espera de voltar à associação, estava completamente desligado e nem estava muito inteirado dos problemas internos. Deparei-me com uma situação difícil, senti-me quase a começar do zero, com muito por fazer e achei que a associação tinha que se profissionalizar. Daí ter pensado em contratar um colega para que começasse a trabalhar mediante as nossas diretivas. A APMVEAC não pode mais trabalhar como uma associação em que nos tempos vagos, à noite e um pouco ao fim de semana disponibilizamos um pouco do nosso tempo. A associação tem de estar preparada para responder aos desafios que se colocam à classe que exerce a clínica de animais de companhia. Neste momento vejo-a mais como uma organização de classe, com essa vertente de defender os clínicos dos animais de companhia, do que propriamente de organização de eventos e congressos. Acho que temos de organizar sempre um congresso nacional, já está marcado – 11 e 12 de maio – e com um programa muito bom. Isso sempre foi apanágio da APMVEAC, que fez sempre congressos de grande valor científico, mas que muitas vezes não são tão correspondidos pelos colegas. Haverá outros eventos com menos valor científico que são mais concorridos. Como entidade independente, sem fins lucrativos e só virada para a classe, escolhemos os oradores com um critério de mais-valia e analisamos quem são os grandes oradores do momento, o que sem sempre acontece se for uma organização comercial a fazer os congressos. Por vezes estão ligados a laboratórios ou são patrocinados pelos respetivos laboratórios. Nós não, todos os oradores que convidámos e que vêm falar não são patrocinados por ninguém, não têm ligações a laboratórios, não foi nenhuma empresa que os indicou para virem falar. São pessoas que escolhemos, dentro da panóplia de oradores, pelo seu valor científico. Pagamos o que nos pedem e temos uma independência que não terá mais nenhuma organização.

Nota: Ler a entrevista na íntegra na edição de Abril da Veterinária Atual

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