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CAMV

A clínica que aposta na medicina preventiva

A clínica que aposta na medicina preventiva
Quando se licenciou em medicina veterinária, o sonho de Duarte Diz-Lopes era ser o verdadeiro James Herriot transmontano. Depois de uns anos dedicado à atividade pecuária, passou a dar resposta às necessidades da população de Bragança. A VetSantiago, fundada por si, tem 24 anos de existência, aposta na medicina preventiva e participa em escalas de urgência, em conjunto com outros CAMV da cidade. O serviço, inédito em Portugal, tem como objetivo levar cuidados de saúde animal à população.

O dia 1 de setembro de 1995 marcou o arranque das atividades da clínica VetSantiago, em Bragança. Inicialmente aberta em horário de final de tarde, das 18 h às 20 h, em complemento com o trabalho de campo que Duarte Diz-Lopes, diretor clínico, realizava na área das espécies pecuárias, rapidamente se percebeu que as solicitações crescentes exigiam mais. “Após seis anos, em 2001, e com a entrada de uma nova colega, este foi o primeiro CAMV a funcionar a tempo inteiro em Bragança”, conta o responsável.

Quando se licenciou, há 30 anos, na denominada Escola Superior de Medicina Veterinária de Lisboa, a única faculdade que formava médicos veterinários na época, o objetivo inicial do médico veterinário era comum ao da maioria dos colegas e passava sobretudo pela clínica de campo. “Portugal tinha entrado na então CEE e havia uma grande necessidade de desenvolver a produção pecuária, particularmente na área da sanidade animal”, explica. Na primeira década, ainda conseguiu concretizar, no terreno, a sua vocação de recém-licenciado mas, com o passar do tempo, a redução da atividade pecuária e, em particular, das explorações de bovinos de leite, fizeram-no redirecionar a sua atividade clínica e passar a dar maior ênfase aos animais de companhia “com novos desafios e uma necessidade de formação permanente, o que tem tornado a atividade muito estimulante”. No fundo, o seu sonho inicial era “ser um veterinário de província, um James Herriot transmontano”, comenta.

 

A mais recente intervenção na modernização da clínica realizou-se em 2017, momento escolhido para criar um espaço dedicado exclusivamente ao atendimento de felinos. Nascia assim o Consultório do Gato. Apesar da aposta, a VetSantiago não tem ainda a certificação cat-friendly. “Para lá caminhamos. Temos sentido um crescimento das consultas de felinos, como se tem verificado também a nível nacional”, assinala o médico veterinário. O investimento contínuo é uma preocupação e, no ano passado, a aposta foi a melhoria do serviço de ecografia, no qual a médica veterinária Alexandra Esteves realizou formação especializada.

“Não tenho dúvidas de que temos hoje, em Portugal, profissionais e estruturas de atendimento ao nível do melhor que existe na Europa”- Duarte Diz-Lopes

E se há 30 anos o isolamento do trabalho em medicina veterinária no interior era sentido de forma particular, o paradigma dos últimos anos tem vindo a alterar-se, sobretudo com “as novas tecnologias de comunicação e as novas vias rodoviárias, o que tem facilitado a formação contínua”, explica o médico. Atualmente, diz, existem seis CAMV em Bragança, o que “garantidamente permite um acesso mais fácil a cuidados médico-veterinários por parte da população”.

 

Duarte Diz-Lopes e a sua equipa assumem, desde o arranque do projeto, uma vertente de medicina preventiva. “Reconhecemos que há um longo caminho a percorrer.” Além do atendimento clínico rotineiro e do serviço de cirurgia, a VetSantiago disponibiliza a realização de exames complementares de diagnóstico e integra equipamento de radiologia direta e de ecografia.

A equipa, composta por quatro elementos (dois médicos veterinários, uma enfermeira veterinária e uma auxiliar) divide-se por áreas de interesse. “A médica veterinária Alexandra Esteves tem a seu cargo o setor de imagiologia da clínica. A enfermeira Patrícia Fernandes tem particular interesse na área de laboratório e no apoio à cirurgia, e a auxiliar Bina Nascimento é a responsável pelos banhos e tosquias”, explica o diretor clínico, que, por sua vez, ocupa a maioria do tempo ao serviço da cirurgia.

 

A trabalhar em medicina veterinária há três décadas, considera que o seu papel se foi modificando com o passar do tempo. “Com a redução da atividade pecuária tradicional, o foco principal dos médicos veterinários virou-se para os animais de companhia, que assumem hoje um papel muito valorizado na vida das famílias portuguesas e que exigem cada vez mais serviços de saúde especializados”, defende.

A equipa tem vindo a recorrer, cada vez mais, a formação em plataformas nacionais e internacionais. “Realizamos cursos integralmente online e assistimos a webinars, além de participarmos presencialmente nos congressos de referência nacionais mais importantes”, partilha Duarte-Diz Lopes, destacando o crescente volume de informação que exige atualmente “um esforço formativo contínuo” por parte da classe.

Aproximar a clínica da comunidade

 

Em 2012, a VetSantiago juntou-se aos quatro CAMV que existiam na altura em Bragança e, em conjunto, instituiu-se um projeto que, numa fase inicial, possibilitava o acesso a serviços de urgência aos tutores, aos fins de semana e feriados. A clínica foi uma das promotoras deste serviço inédito em Portugal, que consiste em promover escalas de urgência veterinária em Bragança. “Neste momento, são já seis os CAMV aderentes, a escala alargou-se e assumiu uma rotatividade semanal. Além desta iniciativa, participamos em projetos comuns, como por exemplo, o programa de adoções/ esterilizações da Associação AMICA e temos também promovido sessões de formação técnica em conjunto.”

A VetSantiago disponibiliza a esterilização das gatas pelo flanco esquerdo, uma técnica menos invasiva do que a realizada tradicionalmente pela linha média ventral, e que possibilita uma recuperação mais rápida.

Ao nível da responsabilidade social, a clínica também tem participado em ações de sensibilização de crianças nas temáticas de saúde e bem-estar animal. Em comemoração do Dia do Animal, a 4 de outubro do ano passado, a clínica participou no Open Day promovido pela Ordem dos Médicos Veterinários (OMV) e recebeu mais de cem crianças de escolas locais nas suas instalações. Duarte Diz-Lopes marcou também presença na Escola Secundária Afonso III, em Vinhais, numa palestra para os alunos do 5.º e 6.º anos, em colaboração com a biblioteca escolar. Estas iniciativas são uma forma de celebrar os animais e de valorizar a profissão do médico veterinário.

“Além da leishmaniose, tendo nós diagnosticado várias centenas de casos nos últimos 30 anos [com uma média de 10 a 15 novos casos anuais], temos tido um número crescente de episódios de telaziose desde que diagnosticámos esta doença, em 2011”, partilha o diretor clínico da VetSantiago

Além do site institucional (www.vetsantiago.com), a aposta regular na página do Facebook tem como objetivo publicar informação técnica e realizar campanhas periódicas para a sensibilização de temas que a equipa considere oportunos, tendo em consideração também os problemas sazonais que afetam os animais de companhia. É um formato que tem trazido resultados. “Temos habitualmente muitas interações dos tutores e um número crescente de seguidores da nossa página.” O contacto com os tutores passa ainda por instituir planos de saúde ajustados aos pacientes, existindo a preocupação de sensibilizar para as vantagens dos rastreios regulares na ótica de aposta na medicina preventiva.

A clínica não está a preparar nenhum projeto a médio prazo, mas continuará empenhada em manter “uma motivação elevada para prestar bons serviços médico-veterinários e promover o envolvimento social da clínica com a comunidade brigantina”.

A par da direção clínica da VetSantiago, Duarte Diz-Lopes é um dos sócios-fundadores da Codivet (Cooperativa de Distribuição e Comercialização de Produtos Veterinários) e alerta para o papel interventivo que a classe médico-veterinária deve ter neste capítulo, exigindo “maior transparência e maior rigor em toda a sua fileira” já que continua a verificar-se “o acesso a medicamentos veterinários sem receita médica e sem acompanhamento médico-veterinário, colocando em risco a saúde dos animais e a saúde pública”.

Como passos importantes para o setor no decorrer de 2019, o médico veterinário destaca a entrada em vigor dos novos boletins sanitários como “uma boa medida promovida pela Ordem dos Médicos Veterinários” e também “a integração das duas bases de dados dos microchips SIRA e SICAFE, no novo SIAC, uma medida que teve um empenho determinante do Sindicato Nacional dos Médicos Veterinários”.

A equipa tem realizado diversos trabalhos sobre doenças parasitárias, como por exemplo, a leishmaniose, a babesiose e a telaziose. Em simultâneo, preparou um conjunto de fichas informativas, disponibilizadas no site da clínica e presencialmente, com informações úteis sobre várias doenças e conselhos sobre higiene oral e o enriquecimento ambiental para gatos.

Com tantos anos de experiência e de atividade no setor, Duarte Diz-Lopes traça um panorama positivo. “Não tenho dúvidas de que temos hoje, em Portugal, profissionais e estruturas de atendimento ao nível do melhor que existe na Europa”, conclui.

Principais desafios

O nordeste transmontano caracteriza-se por algumas doenças endémicas que requerem uma maior atenção da parte dos médicos veterinários. “Além da leishmaniose, tendo nós diagnosticado várias centenas de casos nos últimos 30 anos [com uma média de 10 a 15 novos casos anuais], temos tido um número crescente de episódios de telaziose desde que diagnosticámos esta doença, em 2011. Além disso, agora no período de outono e inverno, a babesiose é outra das doenças endémicas que requer mais cuidado na prevenção”, diz Duarte Diz-Lopes.

Um dos desafios que o diretor clínico enfrenta é o recrutamento de profissionais para a equipa, não considerando que tal é exclusivo de Bragança, porque esta dificuldade é sentida pelos outros CAMV. “Consideramos que, neste momento, o excesso de oferta de emprego que existe no litoral deixa pouca margem para novos colegas procurarem trabalho no interior”.

*Artigo publicado originalmente na edição 132 da revista VETERINÁRIA ATUAL
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