Perguntámos aos médicos veterinários qual o futuro desta doença. Entre visões mais otimistas e pessimistas, há consenso no que respeita ao impacto das alterações climáticas e à importância da profilaxia. Conheça as expectativas de cada um.
Andreia Figueiredo, médica veterinária do Grupo Veterinário maisVida
“De acordo com as alterações climáticas previstas para 2025, irá ocorrer um aumento do período favorável à atividade do flebótomo, o que conduzirá ao aumento do risco de transmissão da leishmaniose. Não só o cão, como todos os animais domésticos e aqueles em contacto com o homem, apresentam um papel importante na transmissão desta infeção, pois sabemos que o flebótomo tem vindo a desenvolver capacidades de adaptação em ambientes semiurbanos e urbanos, levando, assim, ao aparecimento de novos casos em locais onde antes não ocorriam. É importante perspetivar a curto prazo, a implementação de mais medidas de sensibilização e educação da população, para o risco de leishmaniose em animais de estimação e humanos. A venda e aconselhamento dos produtos preventivos e de tratamento de leishmaniose devem ser regulamentados para que seja realizada apenas por profissionais devidamente formados para o efeito.”
Cristina Lemos Costa, diretora clínica do Hospital Veterinário VetSet
“Com o aquecimento global e as alterações climáticas, os casos de leishmaniose tenderão provavelmente a aumentar, mas certamente a indústria farmacêutica continuará a lançar novos medicamentos para combater a doença.”
Mariana Santos Correia, responsável pelo internamento no VetOeiras – Hospital Veterinário
“A elevada adesão à prevenção de leishmaniose feita hoje em dia, desde cedo, na vida de um cachorro, deverá reduzir o número de efetivos diagnosticados com a doença num futuro a médio/longo prazo. Penso que vamos ter dois problemas maiores no futuro: o primeiro, obviamente a dificuldade diagnóstica de alguns casos e, tipicamente, nos animais vacinados, como já se verifica. Noutro sentido, falamos cada vez mais na resistência às drogas ditas leishmanistáticas e leishmanicidas, um pouco como se vê noutras classes de medicamentos, e que dificultam o controlo das reinfeções e recidivas. Curiosamente, parece que se fala cada vez mais de casos em felinos, desde conjuntivites a rinites, pelo que conto ouvirmos cada vez mais sobre diferenças no diagnóstico e terapêutica nesta espécie.”
Margarida Monteiro, médica veterinária do Hospital Veterinário do Atlântico
“Tendo em conta a informação existente, inclusivamente para os tutores, a prevenção da leishmaniose é cada vez mais respeitada e aceite pelos mesmos. Na questão preventiva, podemos estar a caminhar para uma diminuição significativa da doença. Contudo, as alterações climáticas poderão ser um fator predisponente ao aumento da prevalência.”
Miguel Matos, diretor clínico do Grupo Animar
“Uma curiosidade: no Brasil, há alguns anos, fruto do aumento de casos de leishmaniose em pessoas, optou-se pelo abate dos animais infetados. Esta medida revelou-se catastrófica. A ausência de cães ‘disponíveis’ para o mosquito se alimentar levou a que picassem pessoas, o que causou o aumento da incidência da doença em humanos. Não me parece que essa medida seja adotada em Portugal (até porque se revelou errada), mas, dadas as alterações climáticas, o aumento da mobilidade de tutores/animais e o aumento de áreas propícias ao desenvolvimento do mosquito, fruto das nossas atividades sócioeconómicas, prevejo que o aparecimento da doença se torne homogéneo em todo o território continental. Mas, espero que a aposta feita pelos tutores na prevenção […] cause uma diminuição do número de casos.”
Nuno Revez, médico veterinário na Clínica Veterinária de Faro
“Apesar das soluções que temos atualmente no que diz respeito à profilaxia e ao tratamento, dada a complexidade da doença (protozoário, transmissão por vetor, reservatórios na natureza, longo período de incubação), a leishmaniose irá manter-se ativa e continuarão a surgir alguns casos nos nossos animais de companhia.”
Raquel Pereira, médica veterinária do VetCenter – Centro Veterinário de
“Achamos, sinceramente, que haverá um decréscimo no número de casos, uma vez que as pessoas se preocupam com a doença e irão investir na profilaxia. Talvez seja uma visão otimista, mas esperamos estar certos.”
Ricardo Almeida, diretor clínico da Vet Póvoa
“Consideramos que a redução de casos vai continuar a ser uma realidade. No entanto, irá demorar décadas até podermos considerar a doença erradicada. A aparente resistência aos fármacos para animais doentes, bem como as alterações climáticas a que temos assistido nos últimos anos, obrigam-nos a atuar cada vez mais na prevenção.”
Rita von Bonhorst, médica veterinária do Hospital Veterinário Arco do Cego
“Provavelmente, assistiremos a uma maior incidência, muito associada às alterações climáticas que se têm vindo a verificar.”
Este artigo foi publicado na edição de junho de 2019 da VETERINÁRIA ATUAL, como parte do tema de capa sobre leishmaniose “Longe da cura, perto da prevenção”.