Quantcast
 

Diagnosticar com recurso à tecnologia

Diagnosticar com recurso à tecnologia

O médico veterinário tem cada vez mais meios auxiliares de diagnóstico à sua disposição. Contudo, a decisão de qual ou quais adquirir para o seu centro de atendimento médico-veterinário (CAMV) nem sempre é fácil. No momento de decidir, quando os recursos são escassos, há que pensar, por exemplo, em dicotomias como preço/benefício ou se está em questão uma clínica de “bairro” ou um hospital.

Há ainda outra questão que não deve ser descurada, não negando as mais-valias dos avanços tecnológicos: não se estará a sobrevalorizar a sua utilização em determinadas situações? Perante estes cenário, há que encontrar a solução que melhor se adequada a cada caso.

«À semelhança do que acontece na medicina humana, o desenvolvimento tecnológico dos meios de diagnóstico na medicina veterinária é uma mais-valia, pois cada vez mais o animal de companhia é considerado pelo seu proprietário como um elemento da família, que tem os mesmos direitos em termos de saúde e bem-estar que têm os outros elementos do lar, pelo que as exigências por parte dos seus proprietários são cada vez maiores», refere Carlos Melo Cabral, da B. Braun Portugal. E, por outro lado, «o veterinário, como médico e cientista que é, necessita de respostas e de meios de diagnóstico que lhe permitam desenvolver e exercera sua actividade da melhor forma possível», acrescenta.

 

Carlos Melo Cabral refere alguns dos equipamentos disponíveis no mercado: microscópio, aparelho de análises clínicas, raios X, aparelho de anestesia volátil; monitores de sinais vitais (multiparamétricos, capnógrafos, pulsioxímetros), concentradores de oxigénio, aquecedores de soro e sangue, bombas infusoras, bombas perfusoras, motores cirúrgicos (eléctricos e pneumáticos), bisturi eléctrico, unidades de cuidados intensivos para oxigenoterapia, doppler, electrocardiografo, oftalmoscópio, autoclave, destartarizador, tonómetro, tomografia axial computorizada (TAC), ressonância magnética, etc.

Para este responsável, a tecnologia necessária poderá depender se se está perante hospitais, clínicas ou consultórios. Por exemplo, nestes últimos «são exercidos actos médico-veterinários que dispensam grandes meios de diagnóstico, sendo que normalmente apenas são necessários meios simples para que seja realizado o exame do estado geral do animal, nomeadamente, balança, termómetro, estetoscópio, oftalmoscópio, otoscópio e microscópio».

 

Quanto ao futuro, salienta que a «ressonância magnética existe há dois meses na Grande Lisboa e os raios X digitais são a tendência de futuro, pois os líquidos de revelação vão ser retirados do mercado».

A Fujifilm «dedica-se à melhoria contínua dos produtos actuais», assim como «planeia lançar novos produtos que, por se encontrarem em fase final de desenvolvimento, serão brevemente divulgados», revela o Business Unit Manager Medical Systems da Fujifilm Portugal.

 

Para Pedro Mesquita, os avanços em termos tecnológicos dos meios de diagnóstico «têm como objectivo final dotar o médico veterinário de maior segurança, comodidade e rapidez na obtenção de um diagnóstico, sem prejuízo ao meio ambiente, e ainda com a consequente melhoria dos cuidados prestados a nível de eficiência, qualidade e prestígio».

Na verdade, o responsável garante que na Fujifilm «acreditamos que a obtenção de um diagnóstico completo e imediato é fundamental na fidelização de clientes, o que pode ser conseguido através da preciosa ajuda de não apenas um, mas de diversos equipamentos, nomeadamente sistemas digitais para a radiologia, bioquímica, hematologia».

 

O aparelho eleito

No hospital Inemvet, em Olhão, «temos investido muito em tecnologia». Mário Mansinho espera que «estas inovações tecnológicas permitam diagnósticos correctos, de forma mais rápida e sobretudo menos invasiva para o animal».

Quando questionado acerca de qual o equipamento indispensável no CAMV, o médico veterinário é peremptório em responder que, «sem dúvida alguma, o aparelho de radiologia», a justificação reside na «rapidez em obter imagem e pela quantidade de informação que uma película raios X comporta». Não obstante, alerta que «não há meios de diagnóstico completos».

Para Joana Brito, da Bola de Pêlo, em Varge Mondar, «um bom microscópio óptico é fundamental». A médica veterinária acrescenta que «tendo bons conhecimentos de citologia, fornece à partida uma série de informações que nos permitem avançar com certas decisões, enquanto esperamos pelos resultados de análises ou exames imagiológicos». Por outro lado, a responsável salienta ainda que, «muitas vezes, permite-nos fazer um diagnóstico imediato». Mas há ainda a questão económica, deste ponto de vista «é um equipamento muito barato tendo em conta a ajuda que nos pode proporcionar». A seguir, Joana Brito elegeria «o aparelho de raios X». O tipo de equipamentos acaba por, de algum modo, variar com as “especialidades”. A directora da clínica Bola de Pêlo exemplifica com alguns casos. «Um médico veterinário cuja especialidade seja a gastrenterologia achará essencial ter um aparelho de raios X, um ecógrafo e um endoscópio, enquanto para um neurologista bastará um aparelho de raios X e sonhará um dia em ter um aparelho de TAC».

A relação preço/benefício

Isabel Serra, da VETandom, considera que é responsável por uma pequena clínica "de bairro". «Cada vez mais, na nossa clínica, temos o desejo de nos modernizar e nos tornar auto-suficientes no que diz respeito a meios complementares, pois temos noção de que a sua ausência por vezes nos limita em determinados diagnósticos, tornando-se desgastante para donos e animais o facto de terem de se deslocar a outros locais para a realização de exames». Não obstante, a médica veterinária assegura que «temos noção de que os elevados valores dos equipamentos têm de ter retorno e, actualmente, com o número de clínicas veterinárias que existem na nossa área (Lisboa), há dispersão de clientela». Dada esta realidade, «optámos por não investir a curto prazo em material que nos iria obrigar a incrementar o valor dos nossos serviços, colaborando, por isso, com hospitais, para onde dirigimos os nossos clientes sempre que necessário».

Fazendo um balanço da situação, Isabel Serra afiança que «o procedimento tem decorrido de forma muito satisfatória pois permite-nos assegurar um bom serviço e, simultaneamente, partilhar com colegas pontos de vista, diagnósticos, terapêuticas, etc., e, frequentemente, trabalhar conjuntamente no sentido de auxiliar o animal».
Mas, no que toca ao futuro, «e de forma gradual, temos ideia de ir investindo em vários métodos complementares ou inclusive ter como colaboradores colegas que, especializando-se numa ou noutra área de diagnóstico, fazem os exames de forma itinerante trabalhando com várias clínicas ao longo do dia».

Joana Brito também refere esta questão das “especialidades”. «O problema de ter este tipo de equipamento prende-se com algumas questões: a primeira é que nós, médicos veterinários, somos generalistas; como em Portugal não há especialidades na medicina veterinária, fazemos de tudo um pouco». Como tal, para além de clínicos gerais, «somos radiologistas, técnicos de ecografia, anestesistas, cirurgiões, etc. Assim, se quisermos trabalhar dessa forma, temos que ter: ecógrafo, raios X, aparelho de anestesia, endoscópio, um sem fim de meios de diagnóstico que, além de caros, também exigem da nossa parte uma formação adicional para os utilizar correctamente (formação essa que é paga e exige tempo)».

Por outro lado, continua, «alguns destes equipamentos são usados tão poucas vezes, que o preço que cobramos pelo serviço prestado nunca chega a pagar o aparelho».

Tal como Isabel Serra, Joana Brito relembra que «recorrendo a colegas ou laboratórios externos que realizem um determinado exame com grande frequência, conseguimos que o preço final desse exame seja mais baixo para nós e, consequentemente, para o cliente final». Daí que, «embora se recorra com frequência a alguma desta tecnologia, um possível investimento na mesma tem de ser muito bem ponderado, pois corremos o risco de nunca virmos a ter o retorno do mesmo», conclui a médica veterinária da Bola de Pêlo.

Excesso de tecnologia, um mito?

Para Mário Mansinho, o médico veterinário actual «procura obter resultados rápidos, fidedignos e através de técnicas não invasivas», por isso considera que «muita de toda essa tecnologia dita “extra” vem facilitar a vida ao profissional veterinário e não trazer novas possibilidades». O clínico alerta ainda para «a questão do marketing».
Isabel Serra é da opinião que, «nós clínicos, hoje em dia, somos um pouco vítimas da tecnologia, para o bom e para o mau», ou seja «no nosso dia-a-dia, muitas vezes somos "empurrados" pelo próprio cliente à realização de exames complementares, pois a informação está cada vez está mais difundida, por exemplo através da Internet». Neste sentido, «acabamos por ter clientes informados, o que é extremamente positivo, mas por vezes com a mente "poluída" por tanta informação que não conseguem entender na perfeição». A responsável da VETandom dá um exemplo prático: «uma fêmea gestante, cujos médicos veterinários mais antigos tinham de avaliar por palpação, evolução mamária, alterações comportamentais e eventualmente radiografia, em casos muito pontuais, agora, é, por norma, sujeita a ecografia tal como acontece na mulher. Claro que a realização do exame nos dá maior tranquilidade, no que diz respeito à viabilidade dos fetos, estádio da gestação. No entanto, mesmo quando parece que está tudo a evoluir bem, os donos, algo ansiosos, quase desde o primeiro dia nos questionam acerca de quantas ecografias deverão fazer». Ora, isto pode originar, no fundo, uma situação algo caricata, dado que «se, não falamos no assunto no imediato e tentamos que estejam atentos a manifestações da gestante, notamos que há logo uma dúvida quanto à nossa actualização enquanto clínicos».

Isabel Serra defende que, «felizmente que esses métodos existem e a eles podemos recorrer, de forma cada vez mais rotineira. Contudo, a minha experiência diz-me que há sempre a outra face da moeda: tendemos a ficar algo dependentes das máquinas e quando, por motivos monetários ou outros, um cliente se recusa a submeter o animal a algum exame complementar, ficamos algo "perdidos". Parece que faltam peças no puzzle, e informações de que normalmente dispomos parecem-nos, nessa altura, essenciais».

«Penso que o recurso à tecnologia deve ser feito sempre que necessário, mas como apoio a um bom exame clínico e uma boa recolha da história do paciente», defende Joana Brito, para quem ao dar-se «a máxima atenção a estes dois pontos», consegue-se «quase sempre pôr de parte uma série de doenças e, consequentemente, excluir à partida uma série de exames complementares desnecessários que só iriam encarecer o serviço bem como torná-lo mais moroso».

Este site oferece conteúdo especializado. É profissional de saúde animal?