A Clínica Veterinária da Bicuda, na zona de Cascais, foi planeada cuidadosamente e nenhum detalhe foi deixado ao acaso. Se o seu tempo de construção foi de dois anos e meio, o período de planeamento foi bem maior.
O espaço foi buscar inspiração a hospitais veterinários americanos e a clínicas brasileiras, mas por detrás da sua concepção estão os ideais de Simone e Marcus Falcão que criaram nele o seu lar profissional. «Estamos num espaço moderno e inovador, construído e equipado com vista a disponibilizar a máxima especialização e profissionalismo. Fomos ao pormenor no sentido de possibilitar excelência, pois acreditamos que todos os pormenores fazem a diferença».
O casal, natural do Brasil, admite que abraçar o projecto da construção de uma clínica em Portugal foi «uma mudança de vida muito radical». Mas esta foi também a oportunidade de realizarem alguns dos seus sonhos a nível profissional. «A clínica foi construída com muito carinho e para nosso prazer pessoal, ou seja, gostamos de trabalhar aqui e queremos que a nossa equipa também tenha prazer em trabalhar neste espaço». Simone e Marcus Falcão querem, sobretudo, que a Bicuda lhes possibilite «fazer um trabalho de topo».
Neste espaço, existe um consultório de emergência que entre outras características, está equipado com todas as saídas de gases medicinais, visto que em algumas situações de emergência «pode não haver tempo para subir para a sala de tratamento e aqui podemos anestesiar e entubar o animal». Para além disso, na clínica, é o único consultório «que tem acesso directo ao nosso estacionamento de clientes e assim o proprietário nem necessita de passar pela recepção», salienta Simone Falcão.
Há uma área de internamento para cães e outra para gatos e tal como o consultório de emergências, «estão equipados com todas as saídas de gases medicinais, caso seja necessário fazer um procedimento não cirúrgico, mas que envolva alguma contenção anestésica», acrescenta a médica veterinária. A clínica possui ainda uma área de infecto-contagiosas cuja atmosfera é controlada por uma unidade de tratamento de ar que impede a contaminação da atmosfera das áreas adjacentes. Para além das áreas já referidas, a Bicuda tem ainda uma sala para ultrassonografias, um laboratório completo de análises clínicas, dois consultórios, uma sala de raio X digital, duas salas de cirurgia e uma sala de esterilização. Existe ainda uma lavandaria e um centro de estética, sendo que «vamos criar recepções independentes para quem procura apenas este tipo de serviço». A clínica conta ainda com um apartamento no piso superior que é utilizado pelo staff, tudo fruto de um investimento de 1,3 milhões de euros.
Contudo, «ainda temos espaço disponível que será adaptado consoante as necessidades da clínica» garante a médica veterinária. E, exemplo disso, é que numa das divisões que ainda não tem utilização «estamos a pensar colocar uma esteira aquática para fazer fisioterapia».
Perto do centro cirúrgico fica a sala de recobro que «queremos transformar numa unidade de cuidados intensivos». As razões são de cariz prático: «proximidade das salas de cirurgia, isolamento e as jaulas são mais espaçosas», revela.
Do Brasil para Portugal
Simone e Marcus Falcão estão em Portugal há mais de um ano, tendo chegado do Brasil, onde «já tínhamos uma vida estabelecida», conta o médico veterinário e também director clínico da Bicuda. Marcus era professor universitário na instituição onde Simone fazia a sua residência em cirurgia e «foi onde nos conhecemos e começámos a namorar», refere. Numas férias, «a Simone convidou-me para conhecer Portugal, a família que mora cá e o projecto, que ela já tinha posto em marcha». Quando chegou e viu a estrutura, que já estava em construção, «senti que era um desafio e eu sou muito movido por desafios, de tal modo que estudei numa faculdade, fiz residência noutra e fui dar aulas noutra ainda, tendo mesmo chegado a ser coordenador do curso de Medicina Veterinária».
O ex-professor universitário fazia aquilo de que mais gostava no Brasil, que era «dar aulas de cirurgia». Não obstante, Cascais e a sua qualidade de vida acabaram por convencê-lo. «Estou a dois minutos de casa, enquanto no Brasil demorava hora e meia de Copacabana a Vargem Pequena, um percurso de 30 quilómetros».
Porém, a decisão demorou um ano a ser tomada e não foi de ânimo leve. Do ponto de vista pessoal, a questão da segurança também pesou na balança. «Quando falamos em Rio de Janeiro, se não mencionarmos a questão da segurança estamos a ser hipócritas». Por outro lado, «queríamos ter um filho e quando a Simone ficou grávida foi o “click” que nos fez definitivamente largar tudo no Brasil e vir para cá».
Hospital ou Clínica?
Um dos impasses do casal foi decidir se a Bicuda haveria de nascer como clínica ou como hospital.
«Isto para nós é um hospital», garante Simone Falcão, «a única razão pela qual acabámos por optar pela designação de clínica foi o facto de que no início não tínhamos como assegurar alguém nas instalações 24 horas por dia». No entanto, «estamos a funcionar num regime nocturno que permite ao cliente solicitar atendimento de emergência através do contacto para um telefone de urgências a qualquer hora da noite». A equipa vai sendo constituída aos poucos, uma vez que «para crescer há sempre tempo», declara a médica veterinária.
Aliás, a equipa é um dos aspectos que merece maior destaque por parte do casal, já que «não queremos ser o médico veterinário que tenha de fazer de tudo um pouco: pequenos animais, exóticos, dermatologia, ortopedia, ou seja, preferimos trabalhar de acordo com as nossas áreas de interesse», salienta Simone Falcão, acrescentando que «eu adoro odontologia e cirurgia geral e o meu marido ortopedia, mas temos, por exemplo, um colega, o Dr. Rui Patrício que vem cá fazer as consultas de exóticos». A questão das “especialidades” é de tal forma relevante no seio da Bicuda que, «aqui referenciamos os casos uns para os outros», revela a médica veterinária. A equipa, para além do casal, conta com mais dois médicos veterinários fixos, Dr.ª Cláudia Palmeiro e Dr. Fausto Brandão.
Para Marcus Falcão, este projecto teria sido mais fácil de arrancar no Brasil, justificando que «tínhamos muitos relacionamentos dentro da classe» e, por exemplo, «teria sido fácil montar uma estrutura destas a funcionar 24 horas por dia, dado que conhecemos as pessoas indicadas para cada área de interesse». Em Portugal começam agora a conhecer e a estabelecer relações profissionais com os colegas portugueses. Por outro lado, «temos a certeza de que, apesar de aqui andarmos mais devagar, dentro de algum tempo os nossos passos serão muito mais sólidos e maiores do que se estivéssemos no Brasil», frisa.
Mente aberta
O centro cirúrgico, constituído por duas salas, foi projectado «segundo os mesmos moldes a que estávamos habituados a trabalhar no Brasil, ou seja, uma área central de esterilização com comunicação para cada sala de cirurgia, cujo objectivo é dar apoio às duas áreas ao mesmo tempo. Uma das salas é destinada a cirurgias de tecidos moles e procedimentos odontológicos e a outra a ortopedia, cirurgia torácica e neurocirurgia», explica Simone Falcão, informando que «queremos disponibilizar estes serviços a outras clínicas e já recebemos animais referenciados por outros colegas».
Contudo, a Bicuda está a funcionar apenas há cinco meses, por isso «ainda há um certo desconhecimento por parte dos colegas da nossa existência». Mas, por outro lado, «as nossas expectativas estão a ser superadas, visto que apesar de estarmos a exercer actividade há poucos meses, todos os dias temos clientes novos», revela a médica veterinária.
Simone Falcão refere que «a satisfação do cliente é a nossa prioridade e não mediremos esforços para resolver os problemas dos animais que são trazidos até nós. Actualmente não podemos ignorar que praticar medicina veterinária bem e rapidamente está associado a custos. É neste sentido que temos o nosso próprio laboratório de análises clínicas que permite a obtenção de resultados permanentemente e em questão de minutos».
Mas, ao mesmo tempo, «tentamos que os nossos serviços sejam acessíveis a todos, pois não queremos ser uma clínica elitista, daí que actualmente tenhamos clientes de várias nacionalidades e culturas».
A principal característica que atribuem a si próprios é a abertura de espírito. «Estamos abertos a tudo, e isto influencia a nossa postura perante os clientes e perante o próprio acto de consulta», salienta Simone Falcão.
Esta forma de ver as coisas reflecte-se também nas estratégias de resolução dos “becos sem saída” da prática clínica: «temos uma conduta de investigação clínica e não de tratamento sintomático», garante a médica veterinária. «Na abordagem de um paciente tentamos investigar e perceber as causas possíveis para a sintomatologia apresentada e, no decurso deste processo diagnóstico, valorizamos a discussão clínica e a troca de opiniões com outros colegas», explica Marcus Falcão.
Este “estado de alma” reflecte-se em tudo o resto que rodeia o casal, nomeadamente nos tipos de serviços que querem vir a oferecer, como aqueles relacionados com a medicina veterinária holística, em que ambos acreditam. «Na verdade já tivemos um paciente que recebeu tratamento de acupunctura», menciona a médica veterinária, que chegou a iniciar um curso no Brasil, todavia como estava envolvida noutros projectos, não teve oportunidade para o terminar. Porém, no futuro, pretendem apostar nesta área, pois acreditam nos seus benefícios. «Para avançar temos de acreditar e nós acreditamos», reitera Simone Falcão.