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Médicos Veterinários

“Poderíamos desenvolver um melhor trabalho ao tornar a progressão salarial mais clara”

A falta de regulação laboral da veterinária torna mais expostas algumas das fragilidades da profissão. Falamos dos desafios da contratação, da retenção de colaboradores, mas também de progressão salarial. Em declarações à VETERINÁRIA ATUAL, o diretor clínico da Zoosaúde – Serviços Veterinários, Paulo Sousa, faz um ponto de situação sobre estas questões e destaca o foco na melhoria das condições da sua equipa.

Desde a inauguração da Zoosaúde – Serviços Veterinários, em 2 de junho de 2008, a equipa e o diretor clínico, Paulo Sousa sentem orgulho no percurso desenvolvido, num caminho que tem sido sustentado pela melhoria da oferta. “Tornámo-nos num dos principais centros de serviços veterinários, na região Centro de Portugal, através do nível elevado de prestação de cuidados a todos os nossos clientes”, explica. Composta por uma clínica e seis consultórios, dispõe também de outros meios que permitem uma atuação no terreno.

 

“Existem muitos veterinários em clínicas por todo o País que estão a ter dificuldades em lidar com os níveis de procura e não possuem uma rede sólida de clínicas que lhes possam fornecer apoio”, defende Paulo Sousa, diretor clínico da Zoosaúde

 

Com o tempo, a carga administrativa e comercial foi intensificando e passou a consumir mais tempo e recursos, o que levou a iniciar algumas conversações com o OneVet Group. “Percebemos que o OneVet Group estava bem posicionado através da respetiva prestação de serviços de apoio às empresas de gestão central”, afirma o médico veterinário. Tornou-se igualmente evidente, acrescenta, que o grupo “poderia fornecer uma vasta gama de outros serviços importantes, por exemplo, recursos de desenvolvimento e de formação para a nossa equipa, investimento na nossa clínica, em tecnologia e, também, em planos de saúde que tornam a prestação de cuidados mais acessível para os detentores de animais”.

O facto de a Zoosaúde – Serviços Veterinários se juntar ao OneVet em julho de 2021 deu a oportunidade à equipa de se focar na prática clínica e de os assuntos do dia-a-dia, como a gestão de contas, a negociação de fornecedores, os salários, entre outros, ficarem a cargo do grupo.

 

Paulo Sousa explica à VETERINÁRIA ATUAL que a contratação de profissionais pode ser um desafio exigente, o que acaba por refletir “problemas mais amplos do setor veterinário em Portugal, tais como, a carência generalizada de veterinários no País e a ‘fuga’ de profissionais para outros países da Europa.” Esta é uma realidade transversal a todas as clínicas veterinárias em Portugal, defende. “A retenção é um problema menor para nós, mas continua a ser um desafio. Algumas pessoas da minha equipa estão connosco há muitos anos, o que é fantástico, pois vivenciaram grandes mudanças na profissão ao longo do tempo e os seus conhecimentos são inestimáveis.”

A natureza do trabalho veterinário pode requerer “um compromisso permanente”, o que para muitos profissionais pode ser exigente. “Quando se tenta equilibrar a carreira com outras prioridades, a adaptação pode ser mais difícil. É importante empenharmo-nos arduamente, enquanto setor, e pensar na forma de melhorar o equilíbrio entre a gestão profissional e familiar, uma vez que esta é a chave para gerar maiores taxas de retenção de profissionais.”

 

Os salários são pagos de forma equitativa a todos os membros da equipa, garante o diretor clínico. “Revemos anualmente as condições salariais, mas esta progressão é desafiante para todo o setor. Ao contrário de Espanha, Portugal não tem diretrizes ou faixas salariais, o que faz com que muitos veterinários, assim como empregadores, careçam de clareza em relação a este tema.” Este é um problema a resolver para que seja possível “tornar o percurso da carreira veterinária nacional muito mais atrativo e competitivo face a outros países.”

Muitos veterinários procuram oportunidades fora de Portugal e exercer a profissão em países, como Inglaterra, França ou Irlanda. “Em certos casos, faz todo o sentido, especialmente para quem pretende exercer a profissão enquanto diplomado europeu, uma vez que a procura por esses tipos de serviços é agora mais elevada nesses países. No entanto, em termos gerais, penso que a perceção de que as condições são melhores lá fora é, frequentemente, desajustada.” Paulo Sousa recorre a um exemplo que foi enunciado há pouco tempo num artigo publicado na VETERINÁRIA ATUAL, em que vários colegas veterinários partilhavam da mesma opinião. “Embora, na prática, os níveis salariais possam ser mais elevados no Reino Unido ou na Irlanda, também se constata um custo de vida muito mais alto nesses países em comparação com Portugal, que é mais baixo.”

Os desafios da especialização, contratação e progressão salarial

No que se refere ao título de especialista / diplomado europeu, Paulo Sousa considera que “oferece um nível incrível de conhecimento e de especialização”. Pouco a pouco, constata-se que os clientes da Zoosaúde procuram cada vez mais este tipo de prestação de cuidados. Por outro lado, a realidade atual é a da concentração destes profissionais “em grandes centros veterinários, especialmente os localizados em cidades e àqueles que os podem pagar”.

O diretor clínico considera que, apesar de estar a evoluir, “o setor dos seguros para animais de companhia tem sido lento a adaptar-se a estes avanços na prestação de cuidados, ao passo que outros países assumiram a liderança no desenvolvimento deste elemento da área”. Consequentemente, “a disponibilidade de diplomados europeus em Portugal que oferecem estes serviços é igualmente limitada”.  Presumindo que o setor dos seguros poderá vir a ter uma maior procura no futuro, Paulo Sousa espera “uma maior procura de conhecimento especializado ao longo do tempo, o que será positivo já que conduzirá a padrões mais elevados por parte de toda a classe profissional”.

No que respeita ao ensino universitário, não tem dúvidas de que as universidades nacionais “são excelentes no ensino aos alunos dos conhecimentos teóricos e clínicos de que necessitam para exercer a profissão, motivo pelo qual Portugal forma alguns dos mais talentosos veterinários na Europa”. Mas, da sua experiência, há margem para melhorar sobretudo na fase inicial da formação veterinária. “Expor os nossos veterinários à realidade do trabalho prático diário na sua formação poderá ajudá-los a compreender melhor as realidades da vida enquanto veterinários.” Também permitirá que se ambientem às horas e aos padrões de trabalho, o que pode ser especialmente difícil para se ajustarem sobretudo se vierem a trabalhar em urgências ou com turnos fora de horas”.

“Ao contrário de Espanha, Portugal não tem diretrizes ou faixas salariais, o que faz com que muitos veterinários, assim como empregadores, careçam de clareza em relação a este tema” – Paulo Sousa, Zoosaúde

É essencial que os futuros profissionais tomem consciência dos desafios emocionais da profissão, “quer seja ao lidar com um caso muito difícil e triste ou com um cuidador em sofrimento”, defende Paulo Sousa. Um maior nível de experiência de trabalho logo no início da formação “ajudará os jovens veterinários a desenvolverem essas competências sociais que são tão importantes no percurso clínico”, defende.

As maiores preocupações que o diretor clínico enfrenta no dia a dia profissional relacionam-se com a contratação e os salários, temas que considera “indissociáveis”. “Com razão ou sem ela, constatamos que muitos veterinários saem de Portugal porque acreditam que os salários são melhores noutros países. Como já mencionei, embora me questione sobre a precisão deste assunto, penso que poderíamos desenvolver um melhor trabalho ao tornar a progressão salarial mais clara”. Ao fazê-lo, seria uma forma de tornar a profissão em Portugal mais atrativa para os jovens veterinários.

Paulo Sousa confessa que gostaria de assistir a mudanças e melhorias no futuro, como o desenvolvimento de uma rede de especialistas veterinários. “Se realizada convenientemente poderia ajudar a diminuir a carga de trabalho de veterinários de primeira opinião e a melhorar os padrões gerais de prestação de cuidados em todo o setor.”

Assumindo que o setor veterinário deveria estar mais bem conectado em Portugal, o diretor clínico considera que “existem muitos veterinários em clínicas por todo o País que estão a ter dificuldades em lidar com os níveis de procura e não possuem uma rede sólida de clínicas que lhes possam fornecer apoio”. Uma melhor comunicação e um reforço de sinergias entre clínicas, mesmo que fora dos grupos veterinários estabelecidos “poderia conduzir a uma maior partilha de recursos e à melhoria da qualidade da prestação de cuidados aos nossos animais”.

Promover o bem-estar emocional da equipa

Cada vez mais se aborda o tema da saúde mental no setor veterinário. O burnout é um problema real e para o qual se deve estar mais atento. “Embora a carreira veterinária seja extremamente gratificante também pode ser incrivelmente exigente. Fazer parte do OneVet ajuda neste sentido uma vez que o grupo tem um forte compromisso em cuidar dos veterinários através da oferta de oportunidades de desenvolvimento e de aprendizagem de ponta, bem como, um salário acima da média do setor”, refere Paulo Sousa.

Existe ainda à disposição de toda a equipa do grupo “um pacote de bem-estar” e todos os profissionais podem usufruir. “O princípio é o de que, ao recompensar os veterinários adequadamente, seja em termos de salário ou de formação profissional, possamos ajudar a mitigar o burnout”, explica.

Como exemplo prático, a Zoosaúde tem procurado formas de ajudar a equipa, como aconteceu com a decisão de não ter urgências e de reduzir o horário de atendimento, o que permite proporcionar um maior equilíbrio entre a vida profissional e familiar.

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