Abriu portas no mês passado com o objetivo de dar resposta a uma procura crescente. A CascaisVet alia a medicina convencional a tratamentos integrativos e tem um novo centro veterinário, no mesmo concelho, mas noutra freguesia. A VETERINÁRIA ATUAL foi conhecer o espaço.
Foi inaugurado a 6 de abril e representa uma evolução do projeto que arrancou em plena pandemia, em 2020. A CascaisVet, com clínica no Bairro do Rosário, em Cascais, abriu um centro veterinário que é agora o polo de São Domingos de Rana. Sónia Monteiro Diniz é a fundadora e gerente do projeto e tem envolvido uma equipa jovem que se divide agora entre ambos os espaços. Muitos dos elementos estão desde o arranque. “Fomos adicionando sempre novas pessoas à equipa. No começo, éramos duas veterinárias a tempo inteiro, além da nossa fundadora, que dava resposta a cirurgias e a ecografias”, explica Vanessa Pais, diretora clínica do polo de São Domingos de Rana. Também a enfermeira Catarina Pinto integrou a equipa no início e ainda permanece.
A CascaisVet assume como slogan “O meu veterinário para sempre”. A explicação é simples. “O facto de termos um espaço pequeno acaba por permitir isso”, acrescenta. Mas, se por um lado, essa é uma essência que querem manter, por outro, a procura começou a ser grande para os metros quadrados disponíveis. “Começámos a precisar de dar uma maior resposta aos clientes, podíamos eventualmente alargar a clínica de Cascais, mas se o fizéssemos e pensássemos no perfil de hospital, iríamos perder tudo aquilo que defendemos desde a nossa génese e que passa por promover um atendimento mais personalizado”, acrescenta.
A ideia passa por tentar que o mesmo médico atenda determinado tutor e que essa ligação não se perca. “Conhecemos os pacientes desde o começo e queremos manter o ambiente familiar que nos caracteriza.” Crescer, sim, mas com passos sustentados. “O ideal seria então abrir outro polo e por percebermos que a maioria dos clientes portugueses ia à clínica do Bairro do Rosário, vindos de outras freguesias, como a de São Domingos de Rana, escolhemos a nova localização.” Vanessa Pais brinca com a vivência do polo do Bairro do Rosário e afirma que fala mais inglês do que português. “Atendemos maioritariamente tutores estrangeiros, parece que estamos em Inglaterra.”
O facto de a clínica ter a valência de medicina integrativa leva a que muitos clientes – sobretudo portugueses – procurem os seus serviços, como os tratamentos de ozonoterapia, implantes de ouro, medicina tradicional chinesa, fitoterapia, entre outros. Trata-se de um nicho de clientes próprio que procura ajustar a medicina convencional à medicina integrativa, algo que é praticado e defendido na CascaisVet. “Tentamos trabalhar os dois tipos de tratamentos em complemento sempre com o objetivo de alcançar o bem-estar dos pacientes. E a verdade é que temos resultados verificados na prática.”
O serviço mais inovador dentro da medicina integrativa surgiu no ano passado. “Começámos a utilizar implantes de ouro e temos muitos bons resultados. Colocamos implantes de ouro em pontos de acupuntura específicos, alguns podem ser localizados na lesão – como no caso de lesões articulares – ou podem ser colocados à distância. É feito um estudo de medicina integrativa, o animal tem de ser sedado e este tratamento atua como uma espécie de acupuntura permanente.” Vanessa Pais começou a interessar-se pela medicina integrativa quando ainda estava a realizar a sua tese de licenciatura e iniciou um curso de acupuntura, em Lisboa. Seguiram-se outras formações na área de medicina integrativa à distância num instituto brasileiro, em São Paulo, que dispõe de cursos online (Instituto Bioethicus).
Eutanásia em casa
No centro de São Domingos de Rana, o horário de segunda a sexta-feira é das 10h00 às 20h00 e, numa fase inicial aos sábados, das 10h00 às 18h00. Para já, o horário de trabalho é contínuo e o CAMV está aberto à hora de almoço para permitir que as pessoas consigam conciliar a ida ao veterinário com o seu horário laboral. Por outro lado, explica a diretora clínica, permite agilizar as consultas e evitar o stresse dos animais na sala de espera.
  “Tentamos trabalhar os dois tipos de tratamentos [convencionais e integrativos] em complemento sempre com o objetivo de alcançar o bem-estar dos pacientes. E a verdade é que temos resultados verificados na prática” – Vanessa Pais, diretora clínica
Com dois consultórios, um de cão e outro de gato, uma sala de internamento, uma sala de cirurgia e uma sala de SPA, existe um espaço contíguo que está livre e para o qual ainda não se decidiu o futuro. “Poderá vir a ser dedicado à fisioterapia, mas ainda não sabemos.”
As médicas veterinárias séniores dividem-se entre as duas clínicas e, em ambos os polos, estão médicos veterinários fixos, tanto de um lado, como do outro, que só vão pontualmente a uma das clínicas onde não estão habitualmente, caso se justifique. No que respeita a exames complementares de diagnóstico, o polo do Bairro do Rosário conta com sala de Raio-X e existe o objetivo de passar a ter um ecógrafo portátil para oferecer esse serviço no novo centro.
Uma das formas de dar resposta a algumas valências que existem num polo – e não noutro – é através da disponibilização de uma carrinha que é usada para os domicílios. “Começámos a fazê-lo no final do verão do ano passado e acabamos por realizar também tosquias e banhos em casa dos tutores. Temos de perceber o que conseguimos fazer no terreno e adaptar à realidade de cada tutor e animal.”
É possível realizar sessões de acupuntura em casa até por uma questão de melhor gestão do stresse dos animais ou nos casos em que os tutores tenham dificuldade em colocar os gatos a transportadora e para aqueles que têm muitos animais e nas quais se torna mais difícil a logística. Por outro lado, também pode ser um desafio porque “os gatos conseguem esconder-se bem em sua casa e na clínica é possível gerir melhor pois temos mais formas de contenção”, explica Vanessa Pais.
Também já aconteceu a realização de eutanásia em casa dos tutores, se for esse o seu desejo. “Tenho notado que o animal parte em paz. Infelizmente, tive de praticar a eutanásia a uma das minhas gatas e achei que ela partiu muito mais sossegada”, sublinha a diretora clínica. Apesar de ser difícil lidar com esta decisão, seja na casa dos tutores, seja num CAMV, a experiência pessoal tem demonstrado algumas mais-valias no espaço a que o animal está habituado e no seu ambiente familiar.
Os tutores têm um papel primordial na realização dos vários tratamentos. Afinal, são eles que podem perceber como é que o animal se comporta em casa, que sinais demonstra depois de realizar acupuntura, por exemplo. “Inicialmente, temos de fazer um mínimo de cinco a dez sessões, mas vamos ajustando consoante o que os tutores nos dizem sobre como acharam o animal em casa ao fim de algum tempo sem terapia”, refere a médica veterinária. Isto, nos casos em que os animais tenham dor crónica e em que as sessões exijam alguma manutenção. Em animais internados por situações agudas, a terapia pode ser uma opção sempre que se justifique.
Cada sessão de acupuntura demora cerca de 20 minutos e pode ainda ser um recurso para outros fins, como estimular o apetite e melhorar o acordar depois de uma cirurgia. E, se no início, os pacientes não são muito recetivos, acabam por aderir mais facilmente quando “notam melhoria da dor. Chegam a relaxar e a adormecer”. “Temos ainda a ozonoterapia que consiste na colocação de gás e de ozono. Chegamos com umas seringas transparentes e colocamos em pontos específicos de acupuntura e é um tratamento antioxidativo e anti-inflamatório.” A CascaisVet disponibiliza ainda a magnetoterapia, uma terapia que pode ser usada para tratar doenças musculoesqueléticas, como osteoartrite, lesões articulares, tendinite e dor nas costas, bem como condições neurológicas e outras condições médicas. A magnetoterapia funciona aplicando um campo magnético estático ou pulsado no corpo do animal. Ambos os polos deste CAMV disponibilizam VISCUM álbum, particularmente nos doentes oncológicos, realizado também em pontos específicos. “Recorremos também ao CBD e à hemoterapia.”
O difícil equilíbrio da comunicação com os tutores
Mais importante do que a variedade de tratamentos, é a informação partilhada com os tutores, para que as escolhas possam ser as mais indicadas. “Quando os clientes entendem que estamos aqui para os ajudar, tudo se torna mais fácil. Mas temos de perceber com que tipo de cliente estamos a falar e como devemos comunicar com cada pessoa.” Não é um equilíbrio fácil, garante Vanessa. E, defende: “Todos os veterinários deveriam apostar em formações em comunicação e em psicologia porque é algo que pode falhar no contacto com os tutores.” A diretora clínica salienta ainda o facto de “o veterinário ser uma espécie de psicólogo porque as pessoas gostam de conversar durante a consulta, sobretudo as que estão mais sozinhas”.
“Quando os clientes entendem que estamos aqui para os ajudar, tudo se torna mais fácil. Mas temos de perceber com que tipo de cliente estamos a falar e como devemos comunicar com cada pessoa”, defende Vanessa Pais
Para uma melhor gestão da clínica, tem sido essencial agendar as consultas e tratamentos atempadamente. “Tentamos que as marcações de consultas aconteçam por telefone e evitamos que sejam feitas por WhatsApp ou redes sociais. Mas isto passa também por um processo de educação dos tutores sobretudo os estrageiros que estão muito habituados a estes canais.” Quando chega o momento de ir a determinada consulta ou profilaxia, os tutores são relembrados através de um software que existe para o efeito sobretudo para as consultas de desparasitação e a vacinação.
Numa fase inicial, a página das redes sociais é global e abrange ambos os polos, sendo especificamente identificados nas publicações que vão sendo partilhadas. “
Com a inflação e o consequente aumento do custo de vida, a equipa tem notado alguma diferença quando são apresentados determinados orçamentos. “As pessoas têm de fazer escolhas. Também nós sentimos que as atualizações dos preços dos produtos e dos nossos fornecedores acontecem mensalmente e antes desta crise, era algo que só acontecia anualmente.” Por isso, também o CAMV tem de aumentar os seus preços. É uma inevitabilidade. Este é um tema sensível, avança Vanessa Pais. “Tentamos perceber a situação e colocarmo-nos do lado do tutor, sem julgamentos, mas percebemos que há tutores que têm alguma vergonha em expor a sua situação.” Também aqui é preciso ter tempo para explicar tudo o que envolve determinado tratamento. E todas as alternativas são apresentadas, das mais baratas às mais caras.
Como habitualmente acontece, também a CascaisVet tem uma mascote. Chama-se Pudim, é um gato e tem uma história curiosa. “Ajudamos muitos animais de rua, sobretudo gatos e promovemos a adoção.” O Pudim era de uma cliente que tinha muitos gatos e algumas dificuldades financeiras. “Como tinha uma obstrução urinária muito complicada, já tinha sido internado e já tínhamos realizado as manobras necessárias para tentar resolver o problema, mas tal não seria possível sem se recorrer a cirurgia.” Era provável que fosse necessário recorrer a eutanásia. Foi então que a equipa decidiu assumir o gato, foi feita a transferência de titularidade e avançou-se com o tratamento. “O gato foi submetido a uma cirurgia de remoção do pénis e tivemos de fazer algumas cirurgias reconstrutivas para corrigir infeções que iam surgindo depois. Foi um processo muito complicado e extenso com cerca de cinco a seis intervenções”, refere a diretora clínica.
Depois de o salvarem, foi colocado para adoção, o que se revelou uma missão impossível porque “este gato ficou com algumas sequelas, como a incontinência fecal e uma maior probabilidade de recorrência de infeções urinárias”. Isto leva a que a alimentação tenha de ser mais cuidada e que o gato necessite de cuidados muito regulares, o que pode constituir um entrave à adoção.
Vanessa Pais está satisfeita com o voto de confiança que lhe foi dado para diretora clínica do polo de São Domingos de Rana. E refere, ao longo da entrevista, que é preciso acautelar o bem-estar pessoal e o equilíbrio emocional pois a própria profissão tem vários temas que podem conduzir a um burnout, como “a eutanásia, lidar com alguns tutores e com alguns animais agressivos”. E, se algum caso ultrapassa as suas competências, faz questão de referenciar para colegas com mais experiência em determinada área. “É algo natural”, conclui.
*Artigo publicado na edição 182, de maio, da VETERINÁRIA ATUAL.