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Opinião: Quanto vale a minha vaca?

Opinião: Quanto vale a minha vaca?

Mais uma vez espero que se encontrem bem e que se mantenham lúcidos após este confinamento (na medida do possível)!

Nestes últimos tempos continuamos a ser inundados com pedidos de avaliação de CAMVs e felizmente têm-se realizado algumas transações de compra e venda, em vez da fundação de novas estruturas (tendência esta que, como sabem, recomendo vivamente).

 

No entanto, temos detetado uma discrepância enorme entre os preços de venda propostos e a avaliação real das empresas, algumas vezes no sentido da sobrevalorização e noutras da subvalorização.

Por outro lado, continuamos a notar uma certa dificuldade sempre que necessitamos de utilizar métodos de análise aceites por qualquer gestor, o que torna os negócios com investidores externos ao mundo da medicina veterinária bastante complicados!

 

Posto isto, o artigo de hoje, tenta explicar quanto vale afinal uma empresa, seja ela em que área de negócio for!

Então vamos olhar para a organização como se fosse uma vaca leiteira que um comprador, enquanto produtor de natas, pretende adquirir. Leram bem, enquanto produtor de natas, ou seja, não se interessa pelo leite em geral, mas sim por um dos seus constituintes (a sua gordura).

 

1 – Uma vaca leiteira pode ser lindíssima, pelo lustroso, gordinha, formosa, olhar penetrante, mas na verdade tem de dar leite! Sem leite não há natas! O leite que a vaca dá é a faturação da empresa.

2 – Se a vaca for muito novinha, pode ainda não dar leite! Nesse caso, podermos avaliar a vaca pelo seu potencial, no entanto a análise terá de ser mais cuidadosa! Em situações muito pontuais podemos adquirir negócios com baixa faturação, se virmos neles um elevado potencial de valorização futura.

 

3 – Vacas velhas que não dão leite, dificilmente o farão. Se adquirirmos uma destas empresas temos de estar preparados para fazer algum tipo de milagre, para que venha a dar resultados no futuro. Os milagres acontecem de vez em quando, mas, definitivamente, não são muito comuns.

4 – O atual proprietário pode ter amamentado a vaca com uma tetina e desenvolvido sentimentos por ela, no entanto não os pode “cobrar” no momento da venda! O comprador só quer a nata. Do mesmo modo que o sangue, suor e lágrimas que deixamos num negócio, só será vantajoso se der resultados tangíveis.

5 – A diferença entre o que a vaca come e o leite que dá é uma das medidas de rentabilidade da vaca. De nada interessa termos uma empresa com elevados volumes de vendas se, para isso, tivermos e gastar inúmeros recursos. Na verdade, dados como a faturação (muito utilizados para medir a dimensão das empresas) de pouco importam se não houver rentabilidade (exceto em casos muito específicos e muito raros nos nossos CAMVs).

6 – Mas não esquecer que há vacas mais fáceis de ordenhar do que outras! Assim sendo, é essencial avaliar também o esforço despendido no processo! Não é assim tão raro depararmo-nos com empresas aparentemente rentáveis, com as equipas totalmente esgotadas. A facilidade de ordenhar a vaca é outra medida de rentabilidade.

7 – Podemos comprar uma vaca que venha acompanhada por uma ordenha mecânica (ou até com um robô de ordenha), ou podemos ordenhá-la manualmente. O comprador pode contratar alguém para a ordenhar, ou fazer ele próprio esse trabalho, sem nunca esquecer que o tempo em que está a ordenhar a vaca, não está no mercado a vender as natas. Nos CAMVs deparamo-nos com sócios a trabalhar o dobro do tempo e a ganhar metade do que um colaborador externo à estrutura societária. Ao valorizar uma empresa, o tempo dos sócios tem de ser obrigatoriamente contabilizado.

8 – Podemos comprar um estábulo de madeira, ou de ouro e diamantes! Desde que a vaca esteja confortável, segura e dê bom leite, tudo o que for a mais do necessário é desperdício ou ostentação! A estrutura em que a vaca se encontra para dar o leite é outra das medidas de rentabilidade! Nas empresas devemos investir no que nos dá retorno, seja ele a curto, médio ou longo prazo, mas atenção que o retorno nem sempre tem de ser monetário (como tenho escrito em vários artigos).

9 – Ter 20 litros de leite com 2,5% de gordura, dá a mesma nata que 10 litros com 5% de gordura (em boa verdade, a segunda opção é manifestamente melhor porque dá muito menos trabalho a processar). De nada interessam estruturas com elevada faturação se não dão boa rentabilidade. Podemos dizer que a nata é uma medida de rentabilidade líquida, uma vez que nos diz o resultado entre o que recebemos e o que gastamos. A “nata” mais comumente avaliada nas empresas é o EBITDA (resultado antes de juros, impostos, depreciações e amortizações).

10 – A vaca pode não dar nata porque alguém já a comeu… ou bebeu o leite. Se o dono for guloso é mesmo o mais provável! Também nas empresas existem vários tipos de enviesamentos, sendo comum estratégias contabilistas de redução propositada de resultados, não querendo dizer que não sejam empresas muito valiosas.

11 – Se a vaca não der leite pode ser vendida para refugo, mas, obviamente, que valerá sempre muito menos! Podemos contabilizar o estábulo, o método de ordenha, os contratos com os colaboradores e até a comida guardada para a vaca. Existem empresas que valem apenas, e só, pela soma dos seus ativos (muitas vezes depreciados), mas os verdadeiros investidores valorizam mesmo é a nata do leite!

*DVM, MBA, diretor clínico Vet Póvoa, consultor Stratvet

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