Quantcast
 

Ordem e APMVEAC acertam estratégias de luta

Ordem e APMVEAC acertam estratégias de luta

Bastonário da OMV, presidente da APMEAC e subdirector da DGV formaram coro de protesto contra o atraso na publicação da legislação respeitante à profissão. O bastonário lamentou ainda a falta de políticas que garantam o futuro dos médicos veterinários e defendeu que só com espírito de união se pode fazer face aos desafios futuros. 

O XVIII Congresso da Associação Portuguesa de Médicos Veterinários de Animais de Companhia (APMVEAC) ficou marcado pelo clima de concórdia entre os principais actores que trabalham em prol do sector veterinário em Portugal. Apesar de haver ainda diversas arestas por limar, nomeadamente a aprovação da revisão dos Estatutos e do Código Deontológico e o licenciamento dos Centros de Atendimento Médico Veterinário (CAMV), o ambiente de serenidade imperou entre os elementos que compuseram o painel que se ocupou de discursar na sessão de abertura do Congresso. Ordem dos Médicos Veterinários, APMVEAC e a própria Direcção-Geral de Veterinária (DGV) fizeram questão de fazer “pose” para a foto, qual “família feliz”, mostrando que estão lado a lado no combate pela dignificação da profissão; naquilo que pode ser interpretado como, grosso modo, uma tentativa de pôr uma pedra sobre as guerras que, em momentos recentes, ensombraram a profissão.   

Mais, como a Veterinária Actual pôde constatar, a APMVEAC e a Ordem mostraram estreita “cumplicidade”, nomeadamente no acertar das críticas num alvo chamado… poder político. Em declarações à nossa revista, Joaquim Vieira Lopes, que presidiu ao Congresso, não teve pejo em confessar genuína admiração pelo actual bastonário, admitindo mesmo que o líder da Ordem já terá dado mostras de verdadeira combatividade e querer no que toca à resolução dos problemas da classe.

 

«O senhor bastonário deu já provas da preocupação que tem em que as decisões que interessam às várias áreas sectoriais da classe espelhem a vontade e o entender dos colegas que a elas se dedicam. Por outro lado, demonstrou já uma enorme coragem pelas decisões que já tomou, no sentido de que as normas a implementar salvaguardem os superiores interesses da profissão, sendo ainda de salientar o esforço que o senhor bastonário tem feito no sentido de repor a normalidade e em defender a dignidade da nossa profissão».

Por seu turno, o bastonário da Ordem dos Médicos Veterinários (OMV), João Pedro Sameiro de Sousa, aproveitou para tecer rasgados elogios à acção dos veterinários de animais de companhia, lembrando a importância destes na actividade veterinária, uma vez que são já um dos grupos com maior peso no seio da classe – 60% do total dos 3780 médicos inscritos na OMV.

 

Futuro incerto 

Mas nem tudo são rosas. Seguidamente, o responsável apontou baterias para uma realidade menos pacífica, mas insofismável: «A multiplicação de estruturas que se tem verificado nos últimos anos não terá a mesma correspondência na procura de serviços, pese embora a evolução ainda crescente do número de animais de companhia». Considerando «a inegável expansão de novos centros de atendimento com maior dimensão estrutural, dotados de equipamentos cada vez mais sofisticados, que lhes permitem oferecer um serviço de melhor qualidade, indo ao encontro das necessidades dos seus utentes», poderíamos, assim, pensar que os médicos de animais de companhia poderiam ter um quadro de optimismo profissional. Todavia, a realidade actual «leva-nos a encarar o futuro com preocupação, pois é sabido que os rendimentos estão muito aquém do que seria de esperar, tanto mais limitativo quanto o número significativo de novos médicos que completam anualmente as suas licenciaturas e que não encontram colocação». Como fórmula de combate a este quadro de falta de oportunidades laborais, Sameiro de Sousa defendeu que urge «reforçar a colaboração» entre todos os que exercem actividade neste sector, no sentindo de «procurar soluções adequadas» ou pelo menos, «minimizando os problemas».

 

Noutro âmbito, o bastonário “prometeu” consolidar as acções de punição para todos aqueles que teimem em levar a cabo o exercício ilegal da profissão. «É dever de todos nós intervir positivamente, não tanto por actuações de cariz persecutório, mas desenvolvendo acções de consciencialização, actuando através dos dispositivos legais, sempre que necessário».

A aprovação e publicação do diploma legislativo sobre o licenciamento dos centros de atendimento é outro dos temas que preocupam o bastonário. Para Sameiro de Sousa, o ministério da Agricultura, que «tem ignorado as solicitações» da Ordem na definição do acto médico veterinário, já deveria ter dado luz verde para aprovação deste e outros diplomas que aguardam na gaveta, uma vez que irá conferir aos centros de atendimento já registados e classificados pela Ordem a capacidade de se manterem em funcionamento, «libertando-os de alguma da carga burocrática exigida, podendo mesmo revelar-se impeditiva para a continuidade laboral de alguns locais». Neste âmbito, o responsável quer plenos poderes para continuar na senda da identificação dos centros que não possuam qualquer registo na OMV – foram já identificados «mais de 100» nestas condições, revela.

 

Críticas num só sentido 

Vieira Lopes não podia estar mais de acordo com a generalidade das posições do bastonário, designadamente com a necessidade de acelerar a publicação do decreto-lei que vem regulamentar os centros de atendimento, que «já ultrapassou os limites razoáveis» de tempo de espera. «Talvez o desconhecimento de alguns, que levou à insistência numa versão complexa e excessiva do diploma, seja uma das causas maiores para a repetida indicação de correcção e simplificação do mesmo», declarou, aproveitando para elogiar «a abertura» da DGV na elaboração da proposta de lei, assim como a «insistência que tem mantido para que seja publicado».

Por outro lado, a APMVEAC congratulou-se ainda com a «coragem» da OMV em suspender o processo de acreditação e creditação de acções de formação e revalidação da carteira profissional, «com a garantia dada pela OMV de que o processo será reavaliado e implementado de forma transparente, esclarecida, igualitária e acessível».         
Referindo-se àqueles que exercem a profissão de forma ilegal, o presidente da mesma associação aplaudiu a intenção da Ordem em repor a legalidade, «erradicando todas as formas, descaradas ou encapotadas, de exercício ilegal da profissão».

O subdirector-geral da DGV, Fernando Bernardo, depois de lembrar o peso que os clínicos de animais de companhia têm na profissão, não se furtou a pôr as orelhas a arder aos responsáveis políticos que têm em mãos o dossier que irá regulamentar os centros de atendimento. «Oito anos para regulamentar os CAMV já é muito tempo… No momento em que estava para ser aprovado, alguém, demasiado rigoroso, notou que era mais difícil licenciar um CAMV do que um consultório… Houve motivações políticas a que foram alheias à nossa vontade”, admite.

«Balanço positivo»

Fazendo o balanço do Congresso, Vieira Lopes congratulou-se com a adesão de sócios ao evento e admite que, caso o ministro da Agricultura, Jaime Silva, se tivesse deslocado ao evento, teria ouvido algumas reclamações.

Qual o balanço deste congresso? Os médicos aderiram?
Fazemos um balanço positivo. Houve uma boa adesão por parte dos médicos veterinários que exercem clínica de animais de companhia, tendo a afluência ao Congresso sido idêntica à dos anos anteriores.
Quer destacar alguma prelecção em particular?
Qualquer dos temas abordados foi de grande interesse prático. Talvez destaque a dermatologia e os cuidados intensivos, não esquecendo a cirurgia.
Pela primeira vez, os Grupos de Interesse Especial participaram activamente neste congresso. Como interpreta esta participação?
Foi uma participação extremamente positiva, e fazemos um balanço muito favorável, considerando que estão criadas as condições para que os Grupos de Interesse Especial da APMVEAC consolidem a sua participação no congresso nacional, para além das suas actividades durante o ano.
O ministério da Agricultura não enviou qualquer representante ao evento. Que comentário lhe merece esta ausência?
Habitualmente procuramos ter nas nossas iniciativas as entidades oficiais que se relacionam connosco de uma forma mais directa, efectiva e regular, nomeadamente a Direcção-Geral de Veterinária e a Ordem dos Médicos Veterinários.
Caso o ministro estivesse estado presente, seria uma boa altura para lhe recordar os atrasos na publicação da legislação que diz respeito à classe?
Se fosse esse o enquadramento, certamente que sim.
Referiu na sessão de abertura que a APMVEAC «não tem fins comerciais, é independente e realiza os seus eventos sem submissão a outros». Quer explicar estas declarações?
A APMVEAC considera imprescindível a colaboração dos sponsors que durante todos estes anos nos têm apoiado, e congratula-se por essas relações sempre se terem pautado por princípios de independência e grande respeito, e sem atropelos para com o papel que cada uma das partes tem a desempenhar.
Esta acção ficou marcada pela apresentação do primeiro Banco de Sangue Animal de Portugal. Em que medida esta instituição poderá ajudar os veterinários lusos?
Para além do indiscutível apoio à comunidade que o Banco de Sangue da FMV-ULTL irá proporcionar, irá também desenvolver actividades de índole científica e garantirá aos médicos veterinários o acesso às suas facilidades, as quais proporcionarão indiscutível apoio à actividade dos clínicos de animais de companhia.

Emigrante de luxo

Já lá vai o tempo em que a profissão de médico veterinário era garante de um futuro sem grandes sobressaltos económicos. Como o bastonário lembrou, o futuro dos jovens médicos está minado pelas incertezas e rasteiras advindas da excessiva oferta, mas também da crise económica que tem prejudicado este – e a generalidade – dos sectores socioprofissionais.

À semelhança dos médicos dentistas, muitos veterinários estão já a tentar a sua sorte emigrando para países onde ainda seja possível desenvolver a profissão com os mínimos de expectativas de futuro, como os EUA ou Reino Unido.
O lisboeta Ricardo Matos, que regressou à sua terra natal na qualidade de orador convidado do Congresso, é considerado um caso de sucesso, de emigração de “luxo”.

Após concluir a licenciatura na Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa, em 2002, rumou à prestigiada Cornell University, nos EUA, para fazer o internato em medicina e cirurgia de animais exóticos. E por lá ficou até hoje. Actualmente, é um dos mais requisitados especialistas na área – é Lecturer na section of Wildlife and Exotic Animal Medicine, no Departamento de Ciências Clínicas de Cornell.

De Portugal, onde continua a ter as raízes familiares, só mesmo para rever «amigos e colegas» por altura da realização de eventos científicos como o da APMVEAC. Não é que já não se sinta «saudades» das brisas marítimas de Lisboa, dos pastéis de nata, da bonomia lusitana. «Sinto falta dos jantares de amigos, das relações humanas que tinha em Portugal. Nos EUA, não é possível fazer este tipo de amizades, mas há outras coisas que me prendem lá», atira, explicando que está totalmente concentrado em tirar o máximo partido das torrentes de conhecimento que brotam da “sua” Universidade de Cornell, uma das mais importantes do mundo.

Pese embora não «ser rico» com a actividade que desenvolve, «vivo folgadamente, mas sem grandes luxos», não se arrepende por um segundo que seja de ter tomado «a tão difícil decisão» de partir rumo a um país «tão diferente de Portugal». Contudo, não trocava «por nada» a experiência de trabalhar a par e passo com «os melhores do mundo» na área. Só assim pode haver verdadeira evolução, diz.

Um dia mais tarde, num futuro longínquo, quiçá, haja um regresso às origens. Para já, essa hipótese nem se põe, admite. «Nunca digo nunca, mas acho muito difícil regressar a Portugal nos próximos anos».

Este site oferece conteúdo especializado. É profissional de saúde animal?