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Jennifer Devey: Equipar uma emergência é um processo infindável

Jennifer Devey é uma das autoridades mundiais em trauma e medicina de emergência. É licenciada pela Universidade de Ontário, autora de mais de 50 artigos e capítulos de livros e ainda directora de diversos centros de Emergência e Cuidados Intensivos no Canadá e Estados Unidos. Convidada para integrar o painel de oradores do VI Congresso do Hospital Veterinário Montenegro, brindou os presentes com cinco apresentações muito concorridas. Admite que o trauma é o seu fascínio e confessa que equipar uma emergência é um processo infindável.

Veterinária Actual – O que mais a fascina nas emergências veterinárias?
Jennifer Devey –
Admito que o trauma. Porque é um processo que pode ser resolvido e onde eu tenho a capacidade para efectivamente ajudar o animal. É verdade que outras situações não têm tanta cura, ao contrário do trauma que muitas vezes posso “controlar”. A sensação é muito gratificante porque estamos realmente a ajudar aquele animal.

VA – Tal como disse na sua palestra, há ainda muito a fazer nas emergências veterinárias. Os médicos ainda não estão suficientemente preparados, os hospitais ainda carecem de equipamento…
JD –
Sim, isso é brutal e nunca chega a ter fim! Porque de cada vez que pensamos ter o último “brinquedo” a medicina evolui. Ainda a semana passada estive num congresso onde aprendi que há uma série de testes que podem ser realizados e nos quais podemos detectar antecipadamente cancro em cães. É um processo infindável…

 

VA – Acha que os profissionais, em Portugal, estão já cientes das necessidades de uma sala de emergências?
JD –
Não estou certa de saber a resposta a essa pergunta. A sensação que tenho é que as pessoas estão já sintonizadas para essas necessidades. E querem mais, querem tornar os seus hospitais melhores, com melhor equipamento, com profissionais melhor preparados. São muito entusiastas no sentido de quererem mais e melhor. Penso que isso é o primeiro sinal de uma boa veterinária. Não podemos nunca parar de aprender.

VA – A forma como os animais de estimação, nomeadamente o cão e o gato, são hoje encarados pela família foi alterada, sendo que muitas vezes o animal é mais um membro da família. A medicina veterinária teve de “acompanhar” essa mudança?
JD –
Moro no Canadá, onde a maior parte das pessoas têm um cão ou um gato. Aliás, hoje em dia, sobretudo nos casais mais novos, não há filhos mas há um animal de estimação. Também por isso, actualmente, o animal tem um papel um pouco diferente nas vidas das pessoas. E o que está a acontecer, pelo menos no Canadá, é que os animais deixam de ser de trabalho ou de quinta para fazerem parte da família. E é óbvio que esperam da medicina veterinária uma abordagem diferente. Até porque eles tratam o animal como se fosse um membro da família de pleno direito.

 

VA – Para além dos casais novos, nos mais velhos também se tem verificado um aumento dos animais de companhia?
JD –
Sim, houve um enorme impacto, mesmo sociológico, nos mais idosos que, na perda do companheiro/companheira, vêem no animal uma companhia, vivem mais anos e de forma mais saudável. Os resultados vão aparecendo à medida que levamos animais para os lares de idosos, e temos mais cães e gatos registados para serem encaminhados para infantários, trabalhar com crianças deficientes, hospitais, etc. Precisamente pelo impacto positivo que um animal pode ter no ser humano. Pode mesmo fazer a diferença na vida de uma pessoa, e basta ver os sorrisos nas suas caras. Estes animais, porque são uma parte importante na vida das pessoas, estão a ser melhor cuidados. No Canadá já temos uma percentagem simpática de donos que fazem seguro para os seus cães. E também isso vai permitir que tratem melhor deles, porque a realidade é que o que fazemos custa dinheiro. E para a maioria das pessoas um animal de estimação é um luxo. Ou seja, se houver orçamento disponível podemos dar-lhe o melhor tratamento. Mas, para muita gente, esse orçamento é muito reduzido. E isso torna-se num problema quando chegamos a uma situação de emergência e podem estar em risco de gastar centenas de dólares num espaço de 12 horas. Para a maioria das pessoas isso é muito dinheiro.

VA – A nova geração tem já um entendimento diferente da forma como deve cuidar do seu animal, do papel que este tem dentro da família?
JD –
Eu acredito que sim e que essa educação deve vir desde a escola primária. Eles devem ser educados a chegar a casa e dizer à mãe e ao pai como um cão e gato devem ser tratados. Com medicina preventiva, vacinados… E nós, enquanto veterinários, temos uma enorme responsabilidade dentro da comunidade. Penso que há ainda um longo caminho a percorrer. Gostamos de tratar dos animais que vêm ter connosco mas fazer ver o quão importante isto é… penso que ainda está a demorar a acontecer. Admito que, hoje em dia, isto está a alterar-se pelo facto de algumas doenças poderem ser transmitidas, sobretudo a crianças. Mas, na generalidade, acredito que estamos a fazer um bom trabalho.

 
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