Estima-se que 50% dos pacientes veterinários a nível mundial sejam geriátricos. Nem sempre é fácil, aos olhos do tutor, distinguir sinais típicos do envelhecimento de sintomas de patologias. Nesta fase da vida, os cuidados terapêuticos são mais exigentes, e podem envolver uma equipa multidisciplinar onde a enfermagem e a fisioterapia têm um papel relevante.
Na edição de janeiro da Veterinária Atual abordámos a geriatria em animais de estimação e se em Portugal esta área ainda não está muito desenvolvida, nos Estados Unidos que existe maior vocação para esta fase da vida dos animais.
“Em 2009, Amir Shanan fundou a International Association for Animal Hospice and Palliative Care que visa ajudar os animais que sofrem de doença prolongada, assim como os seus tutores. Tem ainda uma missão educativa para os profissionais de saúde, promovendo os avanços na investigação científica dos cuidados paliativos em animais”, refere Mafalda Pires Gonçalves, practice manager e médica veterinária do Serviço de Geriatria do Hospital Veterinário do Restelo (HVR).
Faria sentido criar centros específicos de geriatria em Portugal?
Seria o ideal, mas a médica veterinária tem noção que “existe uma enorme lacuna na rede de cuidados paliativos de Medicina Humana para a qual é necessário investimento e dinamização, logo creio que tardará em chegar aos nossos animais”.
A solução pode ser mais simples, na opinião de Raquel Vieira Fernandes, diretora Clínica do Grupo Veterinário Oliveiras. “As equipas médico veterinárias dos CAMV devem estar diferenciadas e especializadas por forma a garantir a prestação de cuidados médicos de excelência cumprindo com todas as exigências e respondendo de forma adequada aos desafios que estes pacientes representam”.

Tutores informados tornam-se em fortes aliados nos cuidados continuados na procura de melhor qualidade de vida dos pacientes
Na prática, estes animais devem ser avaliados duas vezes por ano, pelo menos, realizar os respetivos “check up” de forma a que seja efetuado um diagnóstico precoce e um tratamento adequado das patologias que surjam. A Medicina Preventiva permite aumentar a esperança média de vida, o que acompanha o maior diagnóstico de doenças crónicas e degenerativas. “Este será o maior desafio para a classe, criando uma oportunidade de maior articulação entre as especialidades veterinárias, de forma a promover o bem-estar e saúde destes doentes geriátricos”, refere Gonçalo Petrucci, médico veterinário do Hospital Veterinário do Porto (HVP).
A adequada formação dos médicos veterinários e dos profissionais do setor permitem aumentar a especialização em geriatria e em cuidados paliativos ou de fim de vida. “Existem linhas de orientação que englobam vários membros da equipa de um centro veterinário pois muitas vezes são decisões médicas, emocionais e éticas extremamente difíceis. Para alguns tutores, os eventos que envolvem a fase final da vida dos seus animais são tão importantes e significativos como todos os cuidados prestados pela equipa até aquele momento”, explica Gonçalo Petrucci.
O papel da enfermagem na geriatria
Os enfermeiros podem atuar muito antes das intervenções terapêuticas propriamente ditas. A abordagem da enfermagem ultrapassa as condições físicas e assume um nível mais abrangente envolvendo a família dos pacientes. Prevenção é mesmo a palavra de ordem e a sensibilização adequada pode ajudar a que os tutores entendam que já têm um paciente geriátrico em casa.
“Há que explicar efetivamente o que é a geriatria e o que se encontra nesta fase da vida dos nossos animais e quais são os primeiros sinais que podemos observar, sabendo assim que é a altura de os considerar ‘séniores’ e que isso significa maior controlo de alguns pormenores do quotidiano que são mais relevantes do que até então. Muitas vezes é na enfermagem que é encontrada uma relação mais próxima e uma maior abertura para algumas conversas entre a família e a equipa clínica”, explica o enfermeiro veterinário Adérito Ortelá. Tutores informados tornam-se em fortes aliados nos cuidados continuados na procura de melhor qualidade de vida dos pacientes.
Já numa fase posterior, em que há um diagnóstico propriamente dito, intensifica-se a necessidade de tratar do paciente e de educar a família no sentido de implementarem rotinas diferentes no que respeita aos cuidados que o animal vai ter de passar a ter. “Há situações que, por vezes, para os elementos da equipa clínica são óbvias de implementar ou realizar, mas para os tutores são um desafio pois recebem notícias de que não estavam à espera, prescrições de medicações que não assimilam convenientemente, mais recomendações de maneio, que nem sempre se ajustam às suas realidades, podendo levar ao incumprimento”, alerta o enfermeiro.
Também são estes profissionais que podem intervir na desmistificação da própria eutanásia e no acompanhamento emocional da família. “Todo este trabalho de sensibilização, (in)formação do tutor e acompanhamento da família é um trabalho contínuo que é realizado ao longo dos várias vindas do paciente e tutor no decurso das consulta de enfermagem e que integra momentos de administração de medicamentos ou implementação de tratamentos planeados e prescritos pelo médico veterinário, ou até momentos de controlos do desenvolvimento da patologia em questão, não esquecendo o todo que é o animal e a sua interação com o meio socioambiental em que está inserido”.