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Atropelamentos no topo das urgências

Atropelamentos no topo das urgências

Atropelamentos, acidentes e mordeduras. Estes são os principais responsáveis pelas idas às urgências dos animais domésticos, nomeadamente cães e gatos. A estes factores, juntam-se também as patologias que acabam por se complicar quando o animal está em casa. E hoje, ao contrário de há 15 anos, Portugal está já munido de serviços de urgência veterinários capazes de responder às necessidades dos animais de companhia.

Se é verdade que a evolução da medicina veterinária levou ao surgimento dos mais avançados cuidados de saúde animal, reflectindo-se significativamente na melhoria da qualidade de vida dos pacientes, também não deixa de ser verdade que há ainda um longo caminho a percorrer na área da medicina de urgência e cuidados intensivos. E basta ter em conta que, desde logo, é preciso que as instalações dos hospitais e clínicas estejam preparadas para acolher devidamente um serviço de urgência. Isto claramente acompanhado por um staff altamente especializado, para além de uma sempre bem-vinda dose de paixão e adrenalina q.b. Porque nas urgências, tudo “rola” demasiado depressa. E a volatilidade dos pacientes é uma dura realidade.

“Fluxo directo” nas urgências é essencial

 

E foi precisamente tendo em conta todos estes parâmetros que o Hospital Veterinário do Porto (HVP) delineou, desenhou e implementou o seu serviço de urgência e cuidados intensivos. Com uma estratégia que começa logo no acesso a esta unidade. Um acesso fácil e directo. O animal mal chega ao Hospital entra directamente por uma porta para a mesa de emergências onde é feito o diagnóstico inicial. Daqui, e depois de estabilizado, é encaminhado ou para os cuidados intermédios ou intensivos, caso se justifique. Uma forma de actuar que Lénio Ribeiro, director das urgências e cuidados intensivos do Hospital Veterinário do Porto, apelidou de fluxo directo: «O paciente não se “perde” de sala em sala. Entra directamente para o local onde vai ser examinado. Não há qualquer perda de tempo».
Este serviço é o que habitualmente mais recursos – humanos, principalmente – consome nas clínicas e hospitais que abraçam esta área. E esta unidade no Porto é um claro exemplo disso. Ao todo, são cinco os profissionais alocados a este serviço que funciona 24 horas por dia e onde, por mês, são assistidos cerca de 250 animais.

Instalações, monitorização e staff
 
Para Lénio Ribeiro, há três valências que obrigatoriamente têm de estar contempladas num serviço de urgência. A já referida adaptabilidade das instalações, bem como a capacidade de monitorização e o staff. «Sem estes três aspectos devidamente acautelados não é possível fazer um bom trabalho. Não é, por exemplo, exequível ter uma unidade de cuidados intensivos sem profissionais especializados e que estejam permanentemente com o paciente. Para que, quando haja qualquer variação na sua condição, tudo esteja preparado para actuar no mais curto espaço de tempo possível».

 

Comunicar é essencial

Estabelecer um bom canal de comunicação com o dono do animal doente é também condição fundamental para que um episódio de urgência tenha o melhor desfecho. Aliás, para Lénio Ribeiro, todos os problemas que possam existir com os donos dos animais são efectivamente fruto de uma má estratégia de comunicação. E para que tudo se processe com equilíbrio há que transmitir, de forma o mais transparente possível, todos os eventuais cenários com os quais o animal se possa vir a deparar: «temos de perceber qual a condição do paciente e para onde é que caminha. Temos de explorar todos os possíveis cenários e temos de os comunicar de forma o mais transparente possível. A verdade é que na nossa prática diária é muito raro não sabermos o desfecho que determinado caso vai ter. Por isso temos o dever de esclarecer os donos».

 

Em Portugal, e apesar da formação de profissionais especializados em urgência e cuidados intensivos veterinários estar ainda muito embrionária, há uma elevada percentagem de médicos veterinários, nomeadamente recém-licenciados, interessados em seguir esta valência da medicina. E Lénio Ribeiro considera que o nível praticado no nosso país é bastante elevado quando comparado com os restantes países europeus.

HVP inaugura sala de cuidados intensivos

 

O Hospital Veterinário do Porto tem um «carinho» muito especial pelo seu serviço de urgência. E, a par de outras áreas, esta tem sido alvo de um investimento contínuo. Recentemente, foi inaugurada a sala de cuidados intensivos, neste momento com a capacidade para duas camas. Uma sala com um conceito que nasceu dentro do Hospital Veterinário do Porto e que pretende ser um caso exemplar no nosso país. Tudo foi pensado ao pormenor e tendo em conta o bem-estar dos animais. Oxigénio, ar medicinal, luz individual, temperatura e humidade ideais fazem parte do conceito que este Hospital insistiu em aplicar à sua unidade de cuidados intensivos. Isto para além desta sala estar munida com toda a parafernália de instrumentos, drogas de emergências, material de entubação com tudo preparado, cateteres, drenos, etc.

A sala é “recolhida”, pelo que apenas os profissionais alocados a este serviço gravitam naquele universo. Uma medida que Lénio Ribeiro admite ser essencial para os pacientes: «todos os pormenores foram cuidados, desde a luz individual para que o paciente da cama ao lado não seja incomodado. Isto é muito importante nos cuidados intensivos, já que os animais estão sempre a ser manipulados. Isto para além de que esta sala está protegida, pois admito que o ambiente tem de ser tranquilo e agradável também para que os profissionais possam estar concentrados. Não podem haver grandes distracções», afirmou o anestesista.

Neste momento esta unidade consegue garantir uma ventilação ao paciente entre 6 a 12 horas. O grande objectivo desta unidade é conseguir ter um animal ventilado e com todos os cuidados necessários mais de 24 horas. «Até porque, como referi, aqueles três pontos essenciais – a instalação, a monitorização e o staff – têm de melhorar. Toda a estrutura tem de crescer. É verdade que nos próximos anos gostaria de ter os animais ventilados durante bastante mais tempo».

Os casos mais comuns nos cuidados intensivos são as peritonites. Porque são pacientes instáveis e porque o peritoneu absorve tudo, causando depois a nível sistémico complicações que têm de ser monitorizadas.
Hoje, o HVP tem apenas como pacientes cães e gatos, apesar de não descurar para mais tarde o alargamento a outros animais. «Actualmente, não temos conhecimentos suficientes para garantir com a mesma qualidade este serviço a outras espécies. Simplesmente não é a nossa área. No futuro, quem sabe, podemos vir a ter até por via do crescimento natural do Hospital. Mas, para já, centramo-nos nos animais que efectivamente conhecemos tão bem».
Ao falarmos em duas camas numa unidade de cuidados intensivos até pode parecer pouca coisa. Mas a verdade é que os centros de referência na Europa, como o da prestigiada Universidade de Utrecht, na Holanda, têm capacidade para apenas oito animais. «Duas camas não são pouco. Quando estamos a falar de cuidados intensivos estamos a falar em medir pressão arterial, pressão venosa central, ECG, saturação de oxigénio… Estamos a medir tudo. Duas camas ocupam um ou dois profissionais a tempo inteiro. São pacientes que denominamos de dinâmicos e cuja condição pode facilmente oscilar de um lado para o outro. Há por isso que estar constantemente atento a toda a sua evolução para podermos reagir da melhor forma e o mais rapidamente possível”.

Hospital é uma referência para as urgências

As pessoas ainda têm o hospital como referência para as urgências. Aliás, este é um conceito que Lénio Ribeiro gostaria de ver ainda mais difundido. Ou seja, um paciente pode entrar no HVP porque efectivamente tem uma urgência ou a necessidade de cuidados intensivos, mas mal saia daquela sala pode voltar para o seu veterinário habitual. «Pode ir para a sua clínica, para o seu médico. Passada a urgência, o animal pode voltar para o seu veterinário com um relatório do que foi aqui feito».

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