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CAMV

Viver o gato e contribuir para a sua felicidade

Foram muitas as mudanças do grupo Hospital do Gato no ano passado. Com mais investimentos, tanto ao nível de instalações e equipamentos, como na formação dos profissionais, uma das novidades foi a criação da Clínica do Gato das Colinas do Cruzeiro, em Odivelas, que fomenta um atendimento cuidado, personalizado e de proximidade.

Quando se entra nesta nova clínica, ingressa-se num ambiente acolhedor e familiar. Na receção, enquanto a médica veterinária Rita Vilela fala ao telefone com um tutor e esclarece todas as suas dúvidas, o dia começa de forma tranquila. Aliás, este é um dos objetivos da equipa: garantir conforto e comodidade aos pacientes. Os detalhes são evidentes enquanto se percorre o espaço. E os pormenores da decoração antecipam o acolhimento com que a equipa recebe os seus pacientes e desempenha os cuidados médicos felinos.

 

Esta clínica abriu a 13 de outubro de 2021 e acompanhou outros investimentos do grupo pois foi também no ano passado que o Consultório do Gato na Expo – Moscavide, passou a Clínica do Gato e que o Centro de Diagnóstico vocacionado para a área de imagiologia nasceu, no Restelo, muito próximo das instalações do Hospital do Gato que existe há uma década. Este último tem a particularidade de homenagear a médica veterinária Rita Delgado que faleceu em janeiro deste ano e que trabalhava no hospital desde o primeiro dia. Passa então a chamar-se de Centro de Diagnóstico Dr.ª Rita Delgado. “Vamos colocar uma placa em sua homenagem porque a imagiologia era a sua área de interesse”, explica Maria João Dinis da Fonseca, diretora clínica do Hospital do Gato. Foi a forma que os colegas encontraram de a recordar, ela que acompanhou o projeto de raiz e no qual iria trabalhar, não fosse a sua perda irreparável.

O nome do novo Centro de Diagnóstico Dr.ª Rita Delgado é uma homenagem à médica veterinária que faleceu em janeiro deste ano e que trabalhava no Hospital do Gato desde o primeiro dia

Da esquerda para a direita: Maria João Dinis da Fonseca, diretora clínica Hospital do Gato; Rubiana Braga, diretora clínica da Clínica do Gato das Colinas do Cruzeiro; Laura Cunha, enfermeira veterinária; Rita Vilela, médica veterinária; Sandra Mota, auxiliar de veterinária; e Ricardo Ribeiro, diretor de estratégia e planeamento

 

Têm sido dez anos de “crescimento sustentado” e em que se percebeu, após alguns inquéritos realizados a clientes, que uma das principais causas de os tutores deixarem de ir aos espaços do grupo é a mudança de casa. “A localização continua a ser um fator que pesa muito na escolha do CAMV, o que me parece um pouco estranho porque acho que não devia ser esse o fator preferencial”, acrescenta. Ricardo Ribeiro, diretor de estratégia e planeamento explica que a lógica de estar presente “na triangulação da grande Lisboa” permite abranger vários concelhos e todos os habitantes da cidade. “Estamos a falar de uma base de potenciais clientes muito grande.”

Do ponto de vista da mobilidade, os espaços distam entre si cerca de 15 minutos porque as clínicas tinham também a função de alimentar o próprio hospital sobretudo no que respeita aos gatos que necessitassem de internamento ou de uma intervenção e observação mais cuidadas e isso é mais fácil de conseguir no hospital. “Quando é necessário transferir os animais das clínicas para o hospital, temos uma ambulância para o efeito”, adianta Rubiana Braga, diretora clínica da Clínica do Gato das Colinas do Cruzeiro.

 

O grupo conta com um corpo clínico de cerca de 30 profissionais certificados dedicados exclusivamente à medicina felina e o Hospital do Gato é detentor de uma direção clínica que consta do quadro de membros da Academia Internacional de Medicina Felina. Para a médica veterinária que aceitou dirigir esta clínica, existem vários aspetos que diferenciam o atendimento médico-veterinário em todos os espaços que “funcionam nos mesmos moldes e de forma protocolada”. Na Colinas do Cruzeiro, além de Rubiana Braga, a equipa é composta pela médica veterinária Rita Vilela, a enfermeira Laura Cunha e a auxiliar de veterinária Sandra Mota contando ainda com mais um grupo de médicos veterinários – não fixos – que dão resposta a algumas especialidades sempre que se justifique.

É possível despender mais tempo nas consultas das clínicas do que no hospital e quando é necessário internamento noturno, o mesmo acontece em ambiente hospitalar. “Temos bastante cuidado e tentamos que uma primeira consulta dure, pelo menos, uma hora.” O momento é valorizado. “Muitas vezes, as pessoas até ficam em pé junto à marquesa e nós dizemos-lhes para se sentarem e conversarem connosco. A nossa abordagem típica passa por explicar aos tutores todas as questões relevantes, como por exemplo, as vacinas e as desparasitações, mas também como devem lidar com os gatos e que tipos de recursos devem ter em casa”, assinala.

 

Como fazer um gato feliz?

Na receção da clínica é possível acompanhar uma árvore de cinco pilares essenciais a uma vida feliz dos gatos em casa. São eles: recursos, pilar olfativo, comportamento predatório, segurança e interação positiva. “Isto é algo criado pela Sociedade Internacional de Medicina Felina e é muito interessante perceber que os tutores, por mais anos que tenham gatos, não têm algumas informações”, explica Maria João Fonseca. Como exemplo prático, a médica veterinária indica: “Se perguntarmos a um tutor o que é que ele acha que faz o seu gato feliz, tenho quase a certeza de que não se lembraria de abordar a questão do olfato e isto é importante de ser explicado de forma credível pela nossa equipa. Aquela esquina onde o gato se roça e que o tutor limpa com lixívia por pode ser o suficiente para perturbar imenso o gato no dia a dia.” Rubiana Braga acrescenta que “o gato está 24 sobre 24 horas dentro de casa e, muitas vezes, sentimos que faltam recursos para que possam estar rodeados de tudo o que lhes traga bem-estar ao nível de estímulos”.

As questões podem então ser variadas no sentido de promoção de uma boa relação com os gatos e aqui pesa o ambiente em casa. “As nossas consultas são mais demoradas do que a média porque há problemas de saúde que estão relacionados com estas questões e que tentamos corrigir. Muitas vezes, o problema não é o que o tutor relata, mas a envolvência”, salienta Rubiana Braga. Uma das ideias que o grupo pretende desmistificar em todos seus espaços é a de que os gatos são dependentes dos tutores para serem felizes. “Têm uma linguagem corporal muito própria. Eu não gosto da afirmação de que os gatos são independentes. Eles são autossuficientes, o que é diferente”, salienta Maria João.

A clínica Colinas do Cruzeiro tem quatro gabinetes, três para consultas médico-veterinários e um quarto para consultas de enfermagem. “Um aspeto que nos diferencia bastante é o facto de grande parte da equipa ser certificada ‘fear free’ que consiste em promover práticas de trabalho sem medo. Temos de ajudar os nossos tutores, não só quando estão na clínica, mas desde que saem de casa e isso passa por ensinar a colocar o gato na transportadora, o que tem de fazer durante o transporte e se existe algo que podemos acautelar para diminuir o stress na viagem”, salienta Rubiana. Estas práticas vão ser essenciais para melhorar o ambiente em consulta, possibilitar uma manipulação mais fácil e aumentar a compliance aos tratamentos.

Um dos gabinetes é dedicado a questões mais delicadas, como por exemplo, a eutanásia, e está estrategicamente localizado perto da casa de banho e da saída, por uma questão de comodidade e para que os tutores não tenham de passar pela receção. “Podem também usar a nossa sala de formação / reuniões para o caso de precisarem de tomar um chá ou um café”, explica Ricardo Ribeiro.

Existem ainda consultas ao domicílio sempre que se justifique e devidamente estudado com os tutores, uma vez que esse pode ser um fator de stress para o gato, consultas de comportamento à distância quando já se conhece muito bem o animal – e depois de descartadas todas as causas médicas – ou presencialmente “sem gato” quando a ideia é apenas a de passar algumas informações aos tutores para uma melhor gestão do dia a dia. Idealmente, as consultas são previamente agendadas ainda que a clínica receba situações urgentes. Uma das particularidades da clínica é o envio de SMS para os tutores que são simuladas como sendo enviadas pelos seus gatos. A personalização original permite conferir a familiaridade que o grupo defende desde o primeiro dia.

A presença nas redes sociais com a página @grupohospitaldogato no Facebook [com mais de 26 mil seguidores] e a página @hospitaldogatovivemosogato no Instagram [com mais de 5000 seguidores] a aposta tem sido no sentido de reforçar o conhecimento, elucidar os tutores para algumas questões e partilhar imagens e situações da prática clínica ou alertar para algumas curiosidades relacionadas com a medicina felina.

Manter a ligação aos tutores

Os casos clínicos são seguidos de perto. “Temos o cuidado de fazer o follow up com os clientes. Ligamos aos tutores para perceber se está a correr bem com o tratamento, se conseguem administrar determinada medicação e, caso não consigam, avançamos para outra solução que é decidida em conjunto”, explica Rubiana Braga. As estratégias são ajustadas consoante as necessidades e os tutores podem contactar a clínica sempre que tenham alguma dúvida. Maria João Fonseca defende que o desafio de manter o atendimento personalizado aumenta à medida que a estrutura cresce. “Sempre trabalhei em hospitais e ouvi queixas do facto de o atendimento hospitalar ser realizado por médicos diferentes.” Ainda que considere que é algo que dá o seu trabalho, acredita que é possível “fazer melhor nos hospitais tentando que a pessoa agende uma consulta sempre para o mesmo médico e que este demonstre interesse em seguir aquele caso”. E defende: “Conseguimos arranjar forma de contornar esta questão no hospital, mas é muito mais fácil no ambiente de clínica”.

“Ligamos aos tutores para perceber se está tudo a correr bem com o tratamento, se conseguem administrar determinada medicação e, caso não consigam, avançamos para outra solução que é decidida em conjunto” – Rubiana Braga, diretora clínica da Clínica do Gato das Colinas do Cruzeiro

Com a pandemia, além de ter aumentado o trabalho, tem surgido um número considerável de doenças associadas ao stress. “As pessoas passaram muito mais tempo em casa e a ter muito mais perceção do seu gato. As rotinas são muito importantes para o gato e alteraram-se completamente”, salienta Rubiana.

O grupo tem também muito cuidado ao tratar da questão das adoções. “Temos gatinhos com alguma regularidade para adotar e somos muito cuidadosos com as entrevistas. O processo é extremamente rigoroso, as condições muito criteriosas e mesmo depois de os animais serem adotados, continuamos a ligar e a querer saber como está tudo a correr”, acrescenta.

Que futuro para o setor?

Nos últimos dois anos e meio, os investimentos em formação da equipa, em média, “rondaram os cerca de 10 a 15 mil euros anuais”, explica Ricardo Ribeiro. Além do pagamento direto dos cursos, “em algumas situações, há um apoio ao nível da deslocação e de estadia, não há qualquer desconto em termos de dias de férias, e os cursos são adaptados às áreas de interesse de cada profissional”.

Nos últimos dois anos e meio, os investimentos em formação da equipa, em média, “rondaram os cerca de 10 a 15 mil euros anuais”, explica Ricardo Ribeiro, diretor de estratégia e planeamento

Maria João denota que há um paradigma na profissão neste momento porque o perfil sociológico das pessoas está a mudar. “A veterinária tem uma curva de aprendizagem que começa quando acaba o curso e tem de haver um investimento muito grande na formação. Não havendo essa vontade individual, a tendência é para estagnar”. Comparativamente com o que se passava há alguns anos, colocam-se atualmente novos desafios ao recrutamento e ao nível de recursos humanos.

“A veterinária tem uma curva de aprendizagem que começa quando acaba o curso e tem de haver um investimento muito grande na formação. Não havendo essa vontade individual, a tendência é para estagnar” – Maria João Fonseca, diretora clínica Hospital do Gato

No que respeita ao futuro, a diretora clínica considera que passará por haver “meia dúzia de grupos” e receia que a vertente de proximidade no atendimento, que tanto valoriza, tenha tendência a perder-se. Confessa ter “alguma curiosidade em perceber o que vai acontecer ao mercado”.

Durante e a partir do mês de fevereiro, além de ações presenciais dedicadas aos tutores, há o objetivo de dar formação a profissionais do setor. “Passámos a ser uma entidade certificada pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERS), o que nos confere outra notoriedade. Temos como objetivo formar pessoas e contamos com três espaços onde os profissionais poderão fazer um estágio, que é uma parte integrante desta formação”, revela Ricardo Ribeiro.

*Artigo publicado originalmente na edição n.º 157 da revista VETERINÁRIA ATUAL, de fevereiro de 2022.

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