Quantcast
 

Uma porta amiga

Uma porta amiga

Erradamente, quando pensamos em pequenas localidades, avaliamos que estas não serão tão “preocupadas” com os seus animais de companhia. Na Clínica Veterinária da Lourinhã tivemos a oportunidade de desmistificar esta ideia, ao mesmo tempo que percebemos o importante papel que o médico veterinário pode assumir na comunidade.

Com 25 mil habitantes, a localidade da Lourinhã vê a sua população duplicar ao fim-de-semana e em períodos de férias, dado que é escolhida por muitos para construção da sua segunda habitação. Zona rural, por aqui os animais abundam, sobrevivendo em realidades tão distintas como em ambiente de “mordomia” ou abandonados à beira da estrada.

Neste cenário, em 1998, nasceu a Clínica Veterinária da Lourinhã, que foi recentemente alvo de remodelação e ampliação para responder às necessidades dos seus utilizadores, bem como à evolução tecnológica e científica que varreu a última década.

 

Contando com sala de esterilização, sala de raio X, sala de internamento e de infecto-contagiosos, além de uma sala de cirurgia e de uma sala de espera só para gatos «para diminuir o stress dos animais», conforme conta Jorge Barros, médico veterinário municipal e proprietário da clínica. O espaço dispõe ainda de laboratório de análises clínicas, bioquímicas e de dermatologia e ecógrafo.

Da equipa fazem também parte o médico veterinário Jorge Canoa e duas auxiliares, contando ainda com uma equipa de reforço para alturas de maior afluência à clínica.

 

Relação de proximidade

Aberta todos os dias, os proprietários dos animais sabem que podem contar com o médico veterinário 24 horas, bastando ligar para o seu telemóvel. A relação é tão próxima que, mesmo durante a entrevista, Jorge Barros recebeu a visita de clientes que passam apenas para o cumprimentar.

 

É que, em alguns casos, os animais foram adoptados após a intervenção do médico veterinário municipal (ver caixa) e cria-se assim uma relação de grande proximidade entre o clínico e os proprietários.

Outro factor a ter em conta é o facto de, além da população animal habitual, «cerca de 60% cães e 40% gatos», surgem por vezes alguns animais exóticos. O médico veterinário diz que é necessário estar preparado para tudo, é que desde águias a milhafres, passando por iguanas e aves marinhas, Jorge Barros também já teve de tratar muitos animais «mais estranhos, dado que esta é uma zona de muitos pescadores que os trazem de Marrocos», revela.

 

Apesar de ser (re)conhecido como médico veterinário municipal que tem salvo muitos animais abandonados, Jorge Barros confessa que não lhe aparecem casos destes à porta da clínica, mas apenas no canil. Embora lamente que, com o agravar da crise económica, o número tenha aumentado e «não haja dia em que não encontre um animal amarrado ao portão», o médico veterinário acredita que as consciências mudaram.

Ultrapassar preconceitos

Avaliando os anos de experiência, Jorge Barros diz que «os donos são muito mais atentos à saúde dos seus animais, que poderá ser também fruto da maior oferta de clínicas». O médico veterinário é mesmo taxativo ao afirmar que «a ideia de que na província os donos não cuidam dos seus animais é completamente errada. Podia verificar-se alguma negligência há 20 anos, mas nessa altura as pessoas também não tinham dinheiro».

Em altura de crise económica, Jorge Barros avalia que «muitas vezes há mais pobreza ao redor de muitas grandes cidades do que na província, em que as pessoas têm as suas terras para cultivar e subsistem assim» e os animais não deixam de ser prioridade, «pois entendem que a vacinação é uma boa forma de prevenção».

Entre as patologias mais comuns, o médico conta que costumam aparecer fêmeas com piometras ou tumores mamários, bem como fracturas, febres da carraça – Erlichia canis e babesiose -, doenças alérgicas e sarna demodécica.

Mas também podem surgir casos como o da Castanha que, «após ter sido operada a uma torção de estômago», necessitou agora de uma intervenção mais ligeira, que resultou em algumas suturas, após luta com a outra cadela companheira de casa. Já o Ricky “queixava-se” de problemas nas glândulas anais e os dois pequenos gatinhos que, embora parecendo, não são irmãos, visitaram o consultório para receber «heroicamente» a sua primeira vacinação.

Perceber necessidades dos donos

E se muitos médicos veterinários reclamam da relação com os donos dos animais, que muitas vezes «são mais difíceis de lidar do que com os animais», Jorge Barros confessa que, no seu caso, tem a noção exacta do seu papel: «os veterinários estão lá para tratar e os donos estão para mimar». Depois, tem ainda a vantagem de grande parte dos seus clientes ser seu amigo, porque como frisa «nos meios pequenos, é inevitável que assim seja», daí que não tenha qualquer problema em deixar os donos assistir ao tratamento do animal, podendo até ajudar a acalmá-lo, como no caso da Castanha, e até já pensou em colocar uma câmara na sala de cirurgia para os proprietários assistirem na sala de espera, «porque não tem nada a esconder e se cria uma relação de maior transparência com o cliente».

Esta relação de proximidade facilita também o seu trabalho na hora de explicar as diferentes soluções terapêuticas para cada caso, bem como de perceber as dificuldades que as pessoas possam ter em suportar financeiramente determinado tratamento. Contudo, ressalva: «se há uma solução mais barata, mas que não considero viável para aquele caso, não faço a intervenção, porque tenho de pensar no bem-estar do animal».

E como conta, muitos dos internamentos que realiza são apenas para prevenção, pois «os animais estão bem, mas os donos ficam mais descansados se estes pernoitarem na clínica após intervenção cirúrgica».

Sim às especializações

O médico veterinário que nunca se imaginou a ter outra profissão, formou-se na Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa e tem vindo a aprofundar os seus conhecimentos com formação complementar.

Com conhecimentos generalistas e fazendo um pouco de tudo, Jorge Barros não se considera um especialista em nenhuma área, mas confessa ser a favor da especialização, «porque a medicina veterinária tem de caminhar para a excelência e o futuro passa por aí». Porém, deixa o alerta: «é preciso definir o que é um especialista. Um especialista não é um médico que faça uma coisa durante dez anos, mas mal. É aquele que tem formação especializada e académica em determinada área». 

Avesso a falar em questões políticas, Jorge Barros defende uma maior união entre a classe, que poderia contribuir para que fossem ouvidos pelas entidades governamentais em algumas questões que preferiu não especificar. É que, entre a entrevista e o atendimento aos seus clientes, era chegada a hora de esterilizar mais um animal ao abrigo do acordo de cooperação que tem com a autarquia e a JAVA.

Este site oferece conteúdo especializado. É profissional de saúde animal?