É médica veterinária diplomada em Neurologia. Porquê esta área?
Trabalhei durante cinco anos em clínica de pequenos animais em Lisboa e os casos clínicos onde me sentia com mais dificuldade eram na área da neurologia. Isso deixou-me assustada porque não me sentia preparada, achei que devia estudar mais. Fiz alguns estágios com colegas que faziam neurologia e pouco a pouco fui tendo cada vez mais interesse por esta área, que era um enigma. Fiquei fascinada.
Como surgiu a oportunidade de continuar os estudos no estrangeiro?
Uma das formas que encontrei para estudar neurologia foi através da inscrição em cursos no Colégio Europeu de Estudos Veterinários Avançados – European School for Advanced Veterinary Studies (ESAVS). Na altura tinham três cursos de neurologia e inscrevi-me. São quase sempre no mesmo país, com os mesmos diplomados, e acabamos por fazer contactos importantes. Foi a plataforma para conhecer pessoas e fazer contactos para residência, em Berna. Após os três anos ganhei um prémio que me possibilitou fazer um estágio de um mês na Universidade de Berna, o que me deu ainda mais oportunidades de conhecer melhor as pessoas. Estes estágios podem ser feitos por qualquer pessoa, basta enviar um email às faculdades ou centros veterinários e fazer um pedido de estágio às instituições. Foi o que me ajudou a conseguir residência, as pessoas conhecem-nos, há empatia e depois torna-se mais fácil.
Porque decidiu sair de Portugal?
Acabou por ser uma continuação da minha formação. Queria saber cada vez mais sobre neurologia e fazer clínica geral não me satisfazia completamente. Queria trabalhar apenas nesta área e decidi que queria fazer a residência. Saí de Portugal porque queria ser especialista.
Atualmente é doutoranda na Universidade de Berna. Como surgiu a oportunidade de entrar nesta instituição?
A especialidade teve a duração de três anos e depois fiz o exame de especialidade para o Colégio Europeu. Entretanto estava a trabalhar como neurologista em Berna e surgiu a oportunidade de entrar num programa de doutoramento a estudar o Paramixovirus, que é a causa de esgana nos carnívoros e sarampo nos humanos.
Quais as diferenças entre o ensino em Portugal e no estrangeiro?
Na Universidade de Berna tenho de trabalhar frequentemente com os estudantes. Acho que em Portugal temos uma muito boa preparação geral, mas os estudantes aqui começam a trabalhar muito cedo com especialistas e os hospitais estão completamente organizados em diferentes especialidades. O que permite aos alunos absorver o máximo sobre cada área e ter uma educação que engloba todas as diferentes especialidades veterinárias, o que no meu ver os enriquece bastante.
Teve dificuldades com a língua?
Fui um pouco ingénua porque quando comecei o ESAVS e o estágio a língua utilizada era o inglês e correu bem. No entanto, em Berna fala-se alemão e apesar da integração cultural ter sido fácil, viver num ambiente onde só se fala alemão é extremamente difícil. A língua é uma barreira porque temos de falar com os donos dos animais que estão à espera que se fale a língua local. Nunca tinha tido aulas de alemão, pelo que quando comecei a enviar candidaturas fiz um ano de alemão, mas é insuficiente pois sabia apenas o básico. Para vir para cá trabalhar ou já sabe alemão ou são necessários três anos no Instituto Alemão.
Como decorreu a adaptação?
Quando se faz a residência não se tem vida própria. O dia-a-dia é dentro do hospital, os amigos estão dentro do hospital, trabalhamos à noite e aos fins de semana. É muito difícil porque o trabalho na clinica é muito intenso, e quando se chega a casa tem-se sempre coisas para ler/preparar para o dia seguinte. São três anos de hibernação em que se vive apenas na especialidade que se escolheu. É necessário estar muito motivado ou então é fácil desistir.
Sente saudades de Portugal?
Sim, da família, dos amigos, da praia, do cheiro do mar, do café (risos). A Suíça só tem lagos e montanhas, é muito diferente.
Quais os seus planos para o futuro?
Como qualquer emigrante o sonho é voltar a Portugal, mas não sei como. Uma das razões que me levou a fazer doutoramento foi precisamente para me ajudar a voltar a Portugal. Achei que aumentando as áreas de ação poderia abrir mais algumas portas. Mas o sentimento é muitas vezes ambiguo porque adoro o meu pais e gostava de voltar amanha! Mas por outro lado para um especialista é muito aliciante e motivante trabalhar em estruturas hospitalares/universitarias que ja estam organizadas em especialidades e os clientes conhecem e procuram especialistas.
Se voltasse qual o projeto que gostaria de desenvolver?
Gosto bastante de investigação, mas adoro clínica e neurologia e o meu sonho seria desenvolver um projeto numa faculdade envolvendo investigação e clínica na área da neurologia, que é o que faço aqui.
Qual o conselho que dá aos recém-licenciados que estão a ter dificuldades em ingressar no mercado de trabalho?
Se quiserem ser médicos veterinários de clínica geral estão bem preparados, mas se perceberem que a área generalista não é suficiente aí vão ter de procurar mais formação. A chave está na motivação, ir aos locais, dar-se a conhecer e não ter medo porque estamos bem preparados. Enviar emails para universidades ou clínicas onde gostariam de trabalhar também pode ajudar. Usei o Erasmus para fazer o último ano de estágio em Barcelona, há Faculdades por toda a europa onde se pode fazer o último ano do curso e que pode facilitar o contacto com especialistas.