Fernando Boinas e Alfaro Cardoso, ambos professores da Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa (FMV-UTL), salientam desde logo que «há doenças de grande gravidade para os suínos que existiram no nosso país, mas que já foram erradicadas», caso da febre aftosa, peste suína clássica, doença vesiculosa e peste suína africana.
Os professores consideram que grande parte das doenças actuais tem etiologia multifactorial, «resultando da interacção de uma tríade (agentes etiológicos, ambiente e o hospedeiro) e apresentam-se como grandes síndromes com predomínio, nomeadamente de patologia de tipo respiratório, digestivo ou reprodutivo». Além disso ressalvam que há doenças com maior incidência em determinadas fases da produção e salientam algumas patologias de origem infecciosa ou parasitária.
No nosso país, algumas das doenças com maior prevalência de origem infecciosa são a gripe suína (vírus influenza), PRRS (arterivirus), circovirose (circovírus porcino PCV2), ileíte porcina (Lawsonia intracellularis), pneumonia enzoótica (Mycoplasma hyopneumoniae), rinite atrófica (Bordetella bronchiseptica e Pasteurella multocida) e mal rubro (Erisipelotrix rhusiopathiae). Já entre as de origem parasitária, encontram-se, nomeadamente, a coccidiose (Isospora suis) e as Sarnas (Sarcoptes scabiei var suis).
Por sua vez, o médico veterinário e responsável sanitário de explorações suinícolas, Manuel Joaquim, conta que, da sua experiência, as patologias com maior prevalência são a doença de Aujeszky, a síndrome respiratório e reprodutivo porcino (PRRS), o Mycoplasma hypneumoniae e a Escherichia coli.
Médica veterinária da Associação Nacional de Criadores de Suínos de Raça Bisara (ANCSUB), Márcia Canado salienta que a instituição que representa «presta apoio a vários criadores de suínos de raça bísara, distribuídos por vários pontos do país, ou seja, não somos um "criador"». Dado que estes suínos são criados em regime de semi-extensivo, as afecções costumam ser «muito diferentes daqueles que são produzidos em regime extensivo», explica a médica veterinária. Da extensa lista das mais frequentes entre os associados da ANCSUB constam mal rubro, parvovirose, rinite atrófica, pneumonia enzoótica, pleuropneumonia, síndrome MMA (metrite, mamite, agaláxia), colibacilose, doença dos edemas, salmonelose, clostridiose, enterite proliferativa ou ileítis, estreptococose, ascaridiose e cisticercose.
Prevenir factores de risco
Entre os factores de risco, Manuel Joaquim, membro da direcção da Sociedade Científica de Suinicultura, aponta «o bioclima, o desenho das instalações e o maneio praticado». Tendo em conta estes factores, o responsável sanitário de explorações suinícolas indica como medidas de prevenção a adoptar «a aplicação de vacinas e desparasitantes e pela metafilaxia» para o controlo do risco.
Também Márcia Canado considera que a melhor opção é apostar na prevenção. Tendo em conta esta máxima, a médica veterinária defende o aumento da imunidade e a diminuição dos factores de stress, que passam por, «nos leitões, fazer-se uma correcta ingestão de colostro e um plano de vacinação adequado. Nas porcas deve igualmente seguir-se um plano de vacinação adequado e adaptado à exploração». Já para reduzir o stress, a especialista recomenda «fazer um correcto maneio e ter especial atenção às movimentações de animais, alojamento, rações utilizadas, aporte de água, entre outros».
Para Márcia Canado há ainda que ter em consideração a «redução da quantidade de agentes patogénicos, evitando a sua entrada no animal (maneio, tratamentos preventivos) e na exploração (biossegurança)». Também neste campo aponta algumas medidas de prevenção a adoptar que passam por «reduzir os agentes patogénicos logo a partir das maternidades maximizando a higiene sempre que se realizar qualquer acção no leitão (administração de ferro, antibióticos, aplicação de brincos, tatuagem, corte de caudas); aplicar antibióticos de forma preventiva em momentos estratégicos como vacinação, desmame ou mesmo após o nascimento; desparasitar frequentemente; realizar vazios sanitários e correcta limpeza e desinfecção; a medicação deve sempre ser prescrita e utilizada de acordo com a indicação do médico veterinário de forma a evitar erros nas dosagens que possam resultar no aparecimento de resistências terapêuticas; e melhorar o ambiente e o maneio seguindo planos eficazes de higiene, limpeza e desinfecção». Além disso, afirma que «a desparasitação interna e externa deve ser sistemática e contínua. As avermectinas possuem um amplo espectro de acção contra a maioria dos parasitas internos e externos do porco».
Avanços significativos
Apesar do elevado número de patologias que podem afectar os suínos, o cenário actual tem vindo a sofrer melhorias significativas, «com a medicina veterinária a ser dotada de medicamentos cada vez mais eficazes», avalia Manuel Joaquim.
O médico veterinário revela mesmo que o plano de actuação «passa por avaliar o estado da população, já que é mais importante a população do que o indivíduo», pelo que, normalmente, nas explorações em que trabalha, a forma de actuação passa pelo recurso a «tratamentos com antimicrobianos, apoiados na identificação dos agentes patogénicos e antibiogramas», conta o especialista.
No controlo de dor, a representante da ANCSUB realça «o flunixim meglumine e o cetoprofeno, anti-inflamatórios não esteróides de elevada eficácia» e aponta como antibióticos mais utilizados «a enrofloxacina, penicilina, doxiciclina, trimetoprim sulfa e tilosina».
A médica veterinária salienta, porém que os associados da ANCSUB criam porcos em regime semi-extensivo, pelo que «haverá sempre uma maior dificuldade no controlo de factores extrínsecos ao animal».
Além de destacarem o sucesso dos programas de erradicação de algumas das doenças já referidos, Fernando Boinas e Alfaro Cardoso revelam que, actualmente, está em curso o programa oficial de erradicação da doença de Aujeszky «uma doença que persiste na população suinícola em Portugal». E explicam que o modo de actuação na certificação de explorações para a doença de Aujeszky é baseado em rastreios serológicos aos animais e na utilização de vacinas marcadas que permitem a diferenciação de anticorpos vacinais de anticorpos causados pela infecção natural. Foi salientado que existem também, no nosso país, planos oficiais de monitorização de triquinelose, brucelose suína, influenza suína e doença vesiculosa dos suínos.
Graves prejuízos
Como no caso de qualquer produção animal, além dos inerentes riscos para a saúde pública (caso das salmoneloses), há que ter em conta os danos na produtividade da exploração.
Márcia Canado aponta como factores que acarretam prejuízo para a produção de porco bísaro os «abortos, aumento do número de leitões mortos ao nascimento e que morrem posteriormente, menor taxa de desmame e menor peso ao desmame, ninhadas muito heterogéneas, em termos de tamanho, com muitos leitões mais pequenos, animais que nunca chegam a atingir a taxa de crescimento normal, menor peso ao abate, quer tratando-se de leitão quer de adultos e elevados custos veterinários quer na terapêutica quer na prevenção».
Contudo, da sua experiência, Manuel Joaquim afirma que «a maior parte da patologia que os animais de engorda apresentam é do foro respiratório, doenças que quando se manifestam traduzem-se em prejuízos económicos grandes, caracterizados por mortalidade, atrasos de crescimento e aumento dos índices de conversão».
Comparando com os parceiros europeus, o médico veterinário não considera que este seja um factor desequilibrador dos pratos da balança da competitividade. Em seu entender, «o que desequilibra são os preços de matérias-primas que, normalmente, são mais caros em Portugal e a ausência de uma política agrícola no nosso país, o que torna o sector primário uma espécie em vias de extinção», critica.