A ponte é uma passagem para a outra margem. Assim afirmavam melodiosamente os extintos Jafumega, na década de 80 do século passado. E “outra margem” é também uma das usuais designações atribuídas pelo centralismo lisboeta à margem sul do rio Tejo. No entanto, e lembrando polémicas recentes, o “deserto” não está tão despovoado quanto isso. O Seixal comprova isso mesmo, ou não fosse elucidativa a promoção de vila a cidade ocorrida em 1993. Um ano depois era plantada a semente daquilo que viria a ser um hospital. Foi nesse ano que surgiu a Clínica Veterinária do Seixal, e tudo começou com um «investimento modesto e equipamento em segunda mão», como revelou Ana Perdigão à Veterinária Actual, médica veterinária, directora clínica e proprietária do hospital.
A aposta traduziu-se então num horário alargado de 50 horas por semana, com hospitalização e atendimento de urgências. Entretanto, o negócio começou a evoluir, como seria desejável que acontecesse com todos os projectos que trazem algo de útil e proveitoso para o meio onde se inserem. Em 2001 foi adquirida outra loja no mesmo prédio onde funcionava o centro, tendo assim sido feita uma ampliação às instalações. E com maiores instalações, mais profissionais são necessários, pelo que nesse início de milénio o centro contava com três médicos veterinários e três auxiliares.
Promoção em 2006
Em 2006 dá-se o ano da grande mudança, com a transferência para novas instalações e consequente promoção do espaço à denominação de Hospital Veterinário do Seixal. Entre os seus quadros está agora uma equipa permanente de quatro médicos veterinários, três técnicos auxiliares e uma recepcionista. Além disto, colaboram também três médicos veterinários em consultas de especialidades. Nas palavras de Ana Perdigão, a grande missão do hospital é «prestar os cuidados de saúde tecnicamente mais avançados a animais de companhia, com compaixão e dedicação, prestando o melhor apoio, formação e informação aos seus donos».
Situado junto ao quartel dos bombeiros do Seixal, o hospital está implantado numa área de 600 m2, com parque de estacionamento e área exterior para animais. Dos espaços cobertos propriamente ditos, com uma superfície de 300 m2, destacam-se os três consultórios, o bloco operatório, a sala de preparação e exames, o laboratório, a área de farmácia, e sala de radiologia, e uma área de recepção onde se inclui um espaço infantil. O hospital dispõe também de 25 boxes de internamento, divididas da seguinte forma: cinco na área de recobro pós cirúrgico; 13 na sala de internamento geral; três na sala de internamento para doenças infecto-contagiosas; e, por fim, quatro boxes ao ar livre.
Com um serviço de urgência de 24 sobre 24 horas através de atendimento telefónico, as instalações estão abertas também em horários alargados. Nos dias úteis funciona das 9h às 21h, enquanto que ao sábado está aberto das 9h às 18h, e no domingo das 10h às 13h. Conta sempre com a presença permanente de dois médicos veterinários, que ocupam dois dos consultórios. O terceiro consultório disponível é utilizado para tratamentos e pensos, que normalmente são realizados por uma técnica auxiliar. Este espaço é também o local a utilizar para a entrada de situações de emergência. Isto tudo para atenderem clientes que podem atingir os 40 por dia, e nunca menos de 20.
Tudo culpa dos utentes
Em declarações à Veterinária Actual, Ana Perdigão afirma que «tivemos uma evolução grande nestes 15 anos». E isso deveu-se «ao nosso trabalho e à fidelidade e apoio os nossos utentes». Só assim se conseguiu passar de «pequena clínica a hospital». E o desejo é o de «continuar a evoluir no sentido de uma prestação de cuidados de saúde cada vez melhores e, à medida que a equipa cresce, conseguir manter o bom ambiente e espírito de união que tem sido sempre a principal mais-valia do nosso centro».
A presença mais frequente neste hospital é assegurada pelos cães. De resto, é melhor falar em grande maioria, uma vez que representam cerca de 70% dos animais atendidos. Já os gatos “limitam-se” a preencher uma percentagem de 25%, enquanto que os restantes 5% são animais exóticos. E é este grupo que leva a que por vezes se realizem alguns procedimentos menos habituais como a destartarização de furões, a ovariohisterectomia de coelhas, e limpeza cirúrgica de abcessos em répteis, intervenção que ocorre com relativa frequência em iguanas e tartarugas.
Não fugindo à regra que é (felizmente) cada vez mais frequente, o hospital dá uma grande importância às adopções de animais. Segundo a directora, «algumas pessoas contactavam-nos porque tinham animais para dar para adopção, enquanto outras pessoas nos procuravam porque pretendiam adoptar um animal de companhia, assim surgiu a ideia de colocar este espaço no site». Trata-se de uma zona apelidada de “Centro de Adopção”, onde qualquer pessoa pode colocar um anúncio, enviando texto e foto para o endereço de e-mail adopcao@hospitalveterinariodoseixal.com. O hospital serve assim de mero intermediário, papel de não menos importância.
Dinheiro em falta
Mas nem tudo são rosas, e o hospital depara-se com algumas dificuldades. Ou melhor, com as dificuldades dos outros. Ana Perdigão afirma que o principal problema se «prende com as restrições económicas dos nossos utentes». E uma vez que, ao contrário do que acontece noutros países, ainda não estão generalizados em Portugal os seguros de saúde para animais, «por vezes os donos tem dificuldade em fazer face a custos inesperados, comprometendo a realização de exames diagnósticos ou procedimentos terapêuticos mais complexos e dispendiosos».
Apesar de existirem casos de maior desapego aos animais, ou de impossibilidade financeira para realizar os procedimentos necessários, também existem, felizmente, situações contrárias. Encontra-se em tratamento no hospital um cachorro que foi adoptado com uma deformidade num membro anterior, nomeadamente a ausência do rádio. Isto, como afirmou a responsável pelo hospital, «terá correcção com a secção do cúbito e colocação de um aparelho que afasta os dois topos ósseos que permita aumentar o comprimento do osso». E este é um processo demorado, complicado e dispendioso. No entanto, os proprietários do animal vão optar por fazer o tratamento porque, por coincidência, «um dos donos nasceu com um problema congénito semelhante e foi submetido ao mesmo tipo de tratamento». E isto diz tudo sobre a paixão que os animais merecem.