O número de casos de tuberculose humana (TB) devido à transmissão animal, em oposição à transmissão entre humanos, pode ser muito superior ao estimado.
De acordo com um estudo realizado por uma equipa internacional de investigadores, a deteção de Mycobacterium bovis pode não ser um indicador adequado da infeção por tuberculose zoonótica nos seres humanos. Os investigadores apontam que a definição desta zoonose deve ser alargada a outras subespécies capazes de causar doenças humanas.
Os resultados deste estudo poderão ter implicações nos estudos epidemiológicos e nas intervenções de saúde pública.
“A tuberculose mata 1,4 milhões de pessoas todos os anos, o que faz dela a doença mais mortal decorrente de um único agente infecioso”, afirma Vivek Kapur, professor de microbiologia e doenças infeciosas na Universidade Estadual da Pensilvânia, nos EUA, citado pela Animal’s Health.
“A Índia tem o maior número de casos tuberculose humana do mundo, com mais de 2,6 milhões de casos e 400 000 mortes registadas até 2019. Além disso, a população bovina na Índia ultrapassa os 300 milhões e estima-se que quase 22 milhões foram infetados com TB, de acordo com dados de 2017”, afirma.
Kapur apontou ainda que a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) e a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) definem a tuberculose zoonótica como uma infeção humana com Mycobacterium bovis, membro do complexo de Mycobacterium tuberculosis (MTBC).
Para verificar o papel da M. bovis na tuberculose zoonótica e investigar o papel de outras subespécies de MTBC, os investigadores analisaram 940 amostras de bactérias, pulmonares e extrapulmonares, recolhidas de doentes de um hospital de referência para a tuberculose situado no sul da Índia.
Para identificar os organismos do complexo M. tuberculosis, os investigadores realizaram testes PCR e, posteriormente, sequenciaram as amostras não M. tuberculosis. No passo seguinte, compararam as sequências com outras 715 sequências de bovinos e humanos que tinham sido anteriormente recolhidas no Sul da Ásia.
“Surpreendentemente, não encontramos provas de M. bovis em nenhuma das amostras”, explicou Sreenidhi Srinivasan, um estudante de pós-doutoramento na Universidade Estadual da Pensilvânia.
“Em vez disso, descobrimos que sete das amostras de doentes continham M. orygis. Seis deles vieram de pacientes com tuberculose extrapulmonar”, acrescenta.
A maioria das demais sequências de pacientes eram M. tuberculosis, bactéria da tuberculose que se pensa ser transmitida apenas entre humanos.
“Os nossos resultados sugerem que a M. bovis pode ser rara na Índia e que a sua deteção pode não ser um indicador adequado de infeção por tuberculose zoonótica nos seres humanos”, diz Srinivasan. “Estes dados indicam que os membros do complexo da tuberculose que não são M. bovis poderiam ser mais frequentes no gado na Índia”, explica.
Kapur concluiu assim que a definição de TB zoonótica deveria ser alargada, por forma a incluir outras subespécies de MTBC capazes de causar doenças humanas.
“A crescente evidência que apoia a endemicidade do M. orygis no Sul da Ásia e a identificação do M. tuberculosis no gado realçam a importância de utilizar uma abordagem One Health, envolvendo a colaboração multissectorial nos setores veterinário e clínico, para cumprir o objetivo da OMS [reduzir a tuberculose em 90%] na Índia”, explica Kapur.