O diretor clínico da VetSantiago, uma das quatro clínicas que partilha a escala de urgência na zona de Bragança, conta: “Temos relações próximas e uma tradição de encontros regulares entre colegas” e considera que “o peso da interioridade dá-nos mais humildade e leva-nos a procurar soluções conjuntas”. Não conhecem caso idêntico em Portugal.
“As coisas funcionam bastante bem, somos um case study, não conhecemos outro idêntico”, defende Raquel Pereira, da VetCenter. O projeto foi lançado há seis anos, em fevereiro de 2012, “inicialmente para dar resposta às dificuldades de recursos nas épocas festivas e feriados”, explica-nos Luís Asseiro de Sá, da Clínica Veterinária de Vale D’Álvaro, “dois anos depois avançámos também para os fins-de-semana e em 2015 começámos com a escala semanal”.
Luís Afonso, da Novavet salienta que “tem sido muito positivo” e Raquel Pereira sublinha: “Os clientes têm reagido muito bem”.
Duarte Diz Lopes, da VetSantiago, diz à VETERINÁRIA ATUAL que “optámos por esta solução na ausência de uma estrutura hospitalar na região” e refere que, desde o início, “o espírito de colaboração vai além das urgências” porque “temos relações próximas e uma tradição de encontros regulares entre colegas”, defendendo que “o peso da interioridade dá-nos mais humildade e leva-nos a procurar soluções conjuntas”.
O diretor clínico da CV de Vale D’Álvaro frisa que “com esta escala asseguramos que está sempre alguém disponível para atender os animais de companhia a qualquer hora”. Além disso “as pessoas ficam melhor servidas no global porque também prestamos serviços uns aos outros, nas áreas de interesse de cada um, como a ortopedia, por exemplo” e Raquel Pereira exemplifica: “nós temos laboratório de análises que disponibilizo aos colegas que não têm e na ecografia também funcionamos assim”.
Clientes têm reagido muito bem
A diretora clínica da VetCenter salienta que “as pessoas têm percebido perfeitamente”, adiantando que “por vezes o caso continua a ser seguido pela clínica que atendeu a urgência ou conversamos e o veterinário assistente trata o seu paciente” e Luís de Sá acrescenta: “Não sentimos que perdemos o cliente”. O diretor clínico da Novavet afirma que “desta forma as pessoas têm a assistência veterinária de que necessitam a todo o momento e têm reagido muito bem”.
Duarte Lopes assegura que a escala não é ‘obrigatória’ porque “não é um sistema tipo farmácia onde a pessoa tenha de ir à clínica que está de urgência” e explica: “o cliente pode sempre contactar o veterinário assistente e relatar o problema, sendo que o médico pode decidir atender o seu paciente se puder ou então indicar qual a clínica a que este se pode dirigir para ser atendido”. O diretor da VetSantiago sublinha que “assim conseguimos também melhorar o bem-estar dos médicos veterinários, porque a nossa profissão exige muito esforço em termos de horários, penalizando muito as nossas famílias” é, por isso, “um sistema complementar às nossas estruturas”. Também Raquel Pereira refere que “muitos dos clientes ligam-nos primeiro e às vezes só até para saberem quem está de urgência”.
Esterilizações e ações em escolas
O diretor clínico da VetSantiago, ex-médico veterinário municipal de Vinhais, adianta que “já nos anos 90 muitos de nós trabalhavam também com animais de produção – e alguns ainda continuam, como Luís de Sá e Luís Afonso, por exemplo – e já nessa altura a delegação regional do Sindicato dos Médicos Veterinários organizava reuniões e lançou um folheto informativo com os contactos de urgência de todos os colegas, que foi distribuído aos produtores pecuários, para terem sempre a quem recorrer”. E esse espírito de colaboração foi perdurando.
Duarte Lopes lembra que “o elo de ligação entre nós os quatro foi a Associação Amica – Amicus Canis, com quem todos colaboramos pro bono nas campanhas de esterilização para adoção de animais”. O médico veterinário diz-nos ainda que esta associação tem um protocolo com a Câmara Municipal de Bragança para a esterilização de, pelo menos, 50 animais abandonados e errantes, destinados a adoção: “No ano passado até acho que foram mais de 100 esterilizações”.
Também Raquel Pereira refere a colaboração com a Amica e com a Escola Agrária do Instituto Politécnico de Bragança, neste caso nas ações de sensibilização nas escolas da região. São iniciativas onde além de um membro da associação está também presente um médico veterinário para ensinar às crianças que cuidados básicos devem ter com os animais de companhia, abordando também as temáticas da prevenção do abandono e da importância da adoção e da esterilização de animais.
Encontros de laboratórios e tertúlias
O diretor da VetSantiago indica ainda que “também colaboramos com o canil municipal fora do período de expediente, quando aparecem animais feridos na via pública, sendo por vezes a nossa clínica de urgência que dá resposta a esse casos, porque a Câmara Municipal não tem estrutura de urgência” e acrescenta que o mesmo se passa no âmbito do Plano Municipal de Recolha e Eliminação de Cadáveres. A clínica que está de escala de urgência por vezes acaba por ser chamada para recolher e guardar os cadáveres de animais que aparecem, entregando-os depois aos serviços municipais.
A par destas ações, Duarte Lopes refere que o espírito de colaboração ajuda também a organizar na região formações e workshops patrocinados por laboratórios “quando há um medicamento, uma vacina ou um desparasitante novo, por exemplo. Porque temos uma lista de todos os colegas da zona que rapidamente contactamos e assim o laboratório já sabe que reunimos 20 pessoas sem dificuldade, pelo que é mais fácil conseguirmos que cá venham”.
Mais recentemente, tanto o diretor da VetSantiago como Raquel Pereira contam que começaram a ser organizadas tertúlias semanais entre os médicos veterinários da região. “É sempre ao almoço de terça-feira, no mesmo local, e aparece quem pode para discutir questões da profissão e não só”, explica Duarte Lopes, adiantando que “esta semana, por exemplo, éramos seis e falámos dos casos de Triquinose que foram detetados em javalis aqui na zona. Como é uma zoonose estivemos a discutir formas de sensibilizar as populações e os caçadores”.
Luís Afonso, da Novavet – que à parte da clínica veterinária é umas das três maiores empresas nacionais de distribuição de medicamentos veterinários – salienta que “toda a colaboração é fundamental numa região desertificada, que todos os dias perde população fruto de décadas de políticas centralizadoras. Na clínica veterinária também se sente mas é notório principalmente na produção animal” e exemplifica: “há dez anos o distrito de Bragança tinha 6.500 bovinos, principalmente de leite, e hoje tem 2.600, nos pequenos ruminantes o número também desceu mas de forma menos abrupta”.