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Animais de produção: Proteger a saúde e o negócio

Animais de produção: Proteger a saúde e o negócio

No caso de animais de produção, como os ruminantes, os suínos e as aves, a vacinação está directamente relacionada com a necessidade de assegurar a sua produtividade, reduzindo os impactos económicos decorrentes de doenças. Os desenvolvimentos são contínuos, relacionados com o potencial da biotecnologia, e os desafios crescentes, para dar resposta a um negócio cuja gestão se faz à escala global.

A vacinação é uma ferramenta vital para evitar que as populações animais contraiam doenças que reduzem a sua produtividade e que, por vezes, impedem o acesso aos mercados de animais vivos e de produtos de origem animal. Por isso, a vacinação é usada intensamente em todos os sistemas de produção animal. Vacinar representa menos de 5% do investimento total que um criador tem de fazer para prevenir a ocorrência de doenças, refere Virgílio Almeida, professor de Patologia e Clínica de Doenças Infecciosas e de Epidemiologia na Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa (FMV-UTL). Outras medidas relacionadas com a biossegurança das explorações como as desinfecções ou as desinsectizações representam despesas muito mais onerosas.

Claro está que é, e será sempre, impossível imunizar um animal contra todas as doenças, até porque muitos agentes etiológicos têm um enorme potencial de desenvolver diversidade antigénica como os vírus influenza. É indiscutível a enorme e crescente capacidade dos laboratórios em produzir vacinas inócuas e eficazes, mas continuam a existir inúmeras doenças para as quais não existem vacinas, como a peste suína africana ou que não conseguem bons resultados “no campo” como as mastites, ou que conferem taxas de imunização sofríveis como a leptospirose.

 

Existem ainda vacinas que não evitam que os hospedeiros se infectem mas que são administradas porque reduzem a duração dos episódios clínicos e a severidade dos sintomas, o que conduz a menores perdas de produção e a menor contaminação ambiental, com a consequente menor incidência dessas doenças nas populações. É o caso dos herpesvírus que afectam os suínos (doença de Aujesky), os equinos (EHV1 e EHV4) e os bovinos (IBR) ou dos paramixovírus que infectam as aves (doença de Newcastle).

As vacinas “ideais”, isto é, aquelas que induzem elevadas taxas de imunidade, impedindo a circulação dos agentes etiológicos nas populações animais, existem para doenças com impactos económicos devastadores como a febre aftosa, que afecta os biungulados domésticos e selvagens, e a peste suína clássica que afecta o porco doméstico e suídeos selvagens como o javali. Dois bons exemplos «de doenças que no mundo global ninguém pode ter, sob pena de sofrer embargos internacionais à exportação de animais e produtos», refere Virgílio Almeida.

 

Mudança de paradigma

A febre aftosa assolou a Europa até à década de 80 e, já no século XXI, levou ao sacrifício de três milhões de ovinos, 600 mil bovinos e 138 mil porcos em Inglaterra, num surto epidémico que durou seis meses. Os animais em causa não estavam vacinados e portanto encontravam-se susceptíveis. O vírus “entrou e arrasou”.

 

Na União Europeia (UE), a vacinação contra a febre aftosa é proibida desde 1991. Exemplos de outras doenças infecciosas cuja vacinação é proibida são a tuberculose, a leucose enzoótica dos bovinos e a brucelose bovina. Em cenários epidemiológicos excepcionais, as autoridades veterinárias competentes dos países podem apelar à Comissão Europeia autorização para a aplicação de vacinas. É o que se passa nas ilhas de São Miguel, Terceira e São Jorge, da Região Autónoma dos Açores, em que os bovinos são vacinados com a vacina RB51 contra a brucelose bovina (Decisão da Comissão 2002/598/CE de 15 de Julho).

Durante o surto de febre aftosa de 2001, a Inglaterra e a União Europeia optaram pela estratégia de morticínio dos animais. Se a escolha tivesse recaído sobre a vacinação, a magnitude do morticínio teria sido menor pois a dispersão da doença teria sido contida mas a Inglaterra ficaria impedida de exportar animais e produtos animais, durante pelo menos 18 meses (Artigo 8.5.8., Terrestrial Animal Health Code, OIE– Organisation Mondiale de la Santé Animale).

 

A gestão britânica e da UE desta epidemia que culminou no abate de quase quatro milhões de biungulados, fragilizou a estratégia política da UE que assenta no primado da biossegurança com a proibição do uso de vacinas para poder certificar os países como “oficialmente livres” de doenças. «Claramente a UE modificou a sua forma de pensar, porque não é aceitável para o consumidor que se matem tantos animais que nem doentes estavam», considera Miguel Lopes Jorge, director de Marketing e Serviços Técnicos Ruminantes e Suínos da Merial Portuguesa.
Outros factores têm vindo a contribuir para o repensar da estratégia de certificação de explorações, zonas geográfica e países livres de doenças infecciosas que a União Europeia tem vindo a edificar desde o início dos anos 80. O impacto da actual crise económica sobre a União Europeia num mundo cada vez mais globalizado é um dos mais poderosos.

UE lidera biossegurança

A lógica do comércio internacional que regula a movimentação dos animais, da sua carne e produtos derivados, entre diferentes blocos económicos conduz a que cada bloco tenha interesse em erradicar o maior número possível de doenças. Os animais provenientes de “zonas livres” podem ser certificados, ganhando maior valor nos mercados. É o caso dos reprodutores, por exemplo.

Nesta perspectiva comercial é condição obrigatória erradicar as doenças que afectam espécies animais produzidas para exportação. Por exemplo, a preocupação de erradicação da língua azul, doença que afecta os ruminantes, é «irrelevante» para os norte-americanos, pois não são exportadores de ovinos, mas à Europa interessa erradicá-la, porque existe trânsito intra-europeu de ovinos, explica Miguel Lopes Jorge.

Apesar do interesse comum na erradicação de doenças, as estratégias de biossegurança variam consoante os países. A UE tem em curso, há cerca de duas décadas, uma política sanitária que desencoraja a administração massiva de vacinas, que foi a regra no século XX. Hoje, a abordagem é sobretudo preventiva, com a aposta no manejo excelente dos animais, no cumprimento escrupuloso das práticas de higiene, desinfecção, desinsectização e desratização, na boa construção dos pavilhões, com condições de ventilação e humidade adequadas, na qualificação do pessoal e, sobretudo, no controlo eficaz das fontes de aquisição de animais.

A imagem de qualidade pela qual a UE pretende diferenciar-se, nomeadamente dos EUA, exige que a UE seja o bloco económico «mais rigoroso nos padrões de execução e diversidade das medidas de biossegurança, e de vigilância epidemiológica das doenças. As metas da UE para o controlo da salmonelose nas aves e nos suínos são um excelente exemplo dessa imagem», assegura Virgílio Almeida. «E não podia ser de outra forma porque quando se prescinde de imunizar os animais através da vacinação, só assegurando elevadíssimos níveis de biossegurança, é que é possível evitar a entrada e a disseminação de doenças nas populações animais».

Este rigor e exigência foi acelerado, a partir da abolição das fronteiras entre os países-membros da UE em 1992, que intensificou a circulação intracomunitária de animais vivos e de produtos de origem animal, como forma de garantir a não propagação de doenças. Começou nas suiniculturas e nas aviculturas, e progressivamente foi estendido aos ruminantes, pisciculturas e apiários.

Todas estas medidas, a par da redução da administração de vacinas, fazem parte da estratégia política da UE em certificar países e explorações como oficialmente livres de doenças, o que espelha essa imagem de qualidade, reconhecida e exigida pelo consumidor europeu.

Vacinação ou prevenção?

Na perspectiva europeia, a administração regular de vacinas aos animais de produção mascara a inexistência dos standards de biossegurança pretendidos. «A partir do momento em que numa exploração se administra uma vacina, o produtor tende a assumir que os seus animais não vão contrair essa doença, e relaxa na aplicação das outras medidas de biossegurança, ou seja, do ponto de vista psicológico, a vacinação pode ter um efeito perverso», explica Virgílio Almeida. «Pelo contrário, se for encorajada a melhoria contínua da aplicação das medidas de profilaxia sanitária, o produtor evolui, a exploração funciona melhor e está mais blindada contra a entrada de todos os agentes patogénicos, e não daqueles contra os quais se aplicou uma vacina. Agora também não deixa de ser um facto que a médio e a longo prazo esta estratégia contribuirá para seleccionar os melhores produtores».

A curto prazo, e num cenário de recessão económica, as vantagens não são tão evidentes. Países como o Brasil, a Argentina e o Uruguai, onde a administração de vacinas polivalentes, isto é, contra várias doenças em simultâneo, é feita de forma rotineira, conseguem colocar os seus produtos no mercado global a preços mais baixos que os europeus, manietados por custos de produção mais elevados.

O consumidor, sobretudo o europeu, valoriza e está disposto a pagar mais pela genuinidade do produto e pelo bem-estar dos animais mas, ainda assim, os produtos com Denominação de Origem Protegida e biológicos representam um nicho de mercado com uma quota inferior a 5%.

Sobretudo em épocas de crise, o preço fala mais alto e assim se explica como o Brasil conseguiu, em poucos anos, estar entre os maiores produtores de carne de bovino, suíno e aves. «Isto preocupa os produtores europeus que suportam custos de erradicação de doenças que tornam os seus produtos mais caros num mundo globalizado onde os consumidores, sobretudo das economias emergentes, não se preocupam com as condições de produção (bem-estar animal) ou se foram ou não, usadas vacinas massivamente», refere o professor da FMV.

Recuperar a imagem da vacina

A elevada taxa anual de abandono da agricultura, em Portugal como na Europa, afecta não apenas os produtores menos eficientes ou mais idosos, mas também os mais qualificados, cujos custos fixos são muito elevados.
Neste cenário, Virgílio Almeida considera que Bruxelas devia fazer um compasso de espera e analisar se a estratégia encetada está a beneficiar os produtores europeus ou, se pelo contrário, «não atingimos um patamar em que é necessário aumentar a frequência de utilização de vacinas. Sobretudo analisando a tendência de regresso aos sistemas extensivos de produção como o porco preto, o frango do campo ou o ovo de capoeira tradicional. Se tolerarmos “viver” com níveis baixos de doenças como por exemplo a salmonelose, atenuando o seu impacto pela administração de vacinas, podemos poupar dinheiro, sobretudo em mão-de-obra e na manutenção das instalações e equipamentos, e tornar-nos-emos mais competitivos com os brasileiros e os argentinos, e dentro de pouco tempo com os indianos e os chineses».

Esta discussão está em curso na União Europeia, embora ainda seja recente, e opõe os países mais competitivos, como a Dinamarca, Holanda, Alemanha e França, que são favoráveis à manutenção da actual estratégia política, aos países do Sul da Europa, mais prontos a dela abdicarem.

Ainda é cedo para perceber para que lado a UE vai tender, mas é convicção de Virgílio Almeida que as decisões relativas à biossegurança, onde se inclui a opção quanto à vacinação, contam com um novo actor, para além dos criadores, dos veterinários ou dos políticos da saúde pública. Trata-se do consumidor e das associações que o representam, que hoje têm «uma força tremenda». Também por isto, é «muito importante recuperar a imagem da vacina e da estratégia da vacinação, de forma que ela não colida com a percepção do consumidor do que é mais adequado». Por outras palavras, que as vacinas não sejam associadas a formas de estar que descuram as boas práticas, o bem-estar animal, impacto ambiental negativo ou que envolvam riscos para a saúde pública associados ao consumo de produtos de origem animal.

A par, seria importante encontrar formas de valorizar o trabalho adicional dos criadores europeus, pois os benefícios decorrentes da maior produtividade, pelo facto de terem menos doenças, podem não ser suficientes. Seria útil a criação de incentivos, quer por parte do mercado, quer do próprio Estado. «Na Dinamarca, um dos maiores exportadores de carne do porco do mundo, os produtores de suínos com prevalência mais baixa de salmonelose recebem um bónus atribuído pela Associação de Carne da Dinamarca», refere o professor. «Em Portugal é importante encorajar os produtores e as suas associações que se mostrem capazes de delinear, executar e encontrar parceiros para financiar programas voluntários de erradicação e de certificação de ausência de doenças, como o programa Bovicontrol lançado este ano pela AGROS, Segalab, Lacticoop, ABLN, Ucadesa, Merial e Pfizer para a rinotraqueíte infecciosa dos bovinos (IBR) e a diarreia viral bovina (BVD). Interessantemente, ambos os planos recorrem à administração de vacinas na fase inicial do programa nas vacarias com prevalências elevadas de IBR e/ou de BVD, ou que estejam na vizinhança de explorações infectadas, ou que, apesar das baixas prevalências de IBR e de BVD, os seus proprietários não reúnam condições económicas para avançar para a fase de abate selectivo dos animais infectados».  

Evolução DIVA

A evolução da biotecnologia e da biologia molecular tem favorecido o desenvolvimento de vacinas cada vez mais eficazes e seguras. Desde o século XVIII até meados do século XX, os veterinários apenas tinham à sua disposição vacinas vivas atenuadas (garante-se a incapacidade do vírus vacinal em causar doença mas este continua a multiplicar-se nos tecidos dos animais inoculados, e desta forma, estimula o sistema imunitário), ou vacinas inactivadas ou mortas (também se garante a incapacidade do vírus vacinal em causar doença mas retira-se-lhe a capacidade de se multiplicar nos tecidos, ao mesmo tempo que se adiciona um adjuvante que ajuda a estimular o sistema imunitário do animal).

Ambos estes tipos de vacinas apresentam problemas de segurança e/ou de eficácia. Por exemplo, as vacinas vivas atenuadas, são regra geral menos seguras, motivo porque normalmente não podem ser administradas a fêmeas gestantes ou em fases de grande desgaste físico nos animais de trabalho/desporto, e pode ocorrer reversão da virulência ou recombinações com vírus selvagens. As vacinas inactivadas são seguras mas estimulam pior o sistema imunitário. Por isso têm que se lhes adicionar adjuvantes para potencializar a sua taxa de imunização, o que as torna quase sempre mais caras.

As vacinas DIVA (Differentiating Infected from Vaccinated Animals), desenvolvidas a partir de meados dos anos 80 do século XX, representam uma evolução significativa. A deleção de determinadas proteínas dos vírus trouxe vantagens claras em termos de diagnóstico, pois as vacinas DIVA permitem diferenciar laboratorialmente os animais que estão infectados dos animais que apenas foram vacinados: exemplo IBR nos bovinos e doença de Aujesky nos suínos.

Auxiliar a erradicação

No surto de febre aftosa de 2001, em Inglaterra, a OIE ainda não reconhecia a aplicação do método DIVA para a febre aftosa. A sua utilização, à época, teria permitido diferenciar os animais infectados daqueles que não o estavam, evitando o sacrifício de animais sãos. No surto que ocorreu em 2007, «hegou a ser considerada a hipótese de vacinar com uma vacina DIVA mas como ocorreram poucos focos e todos circunscritos, a decisão foi pelo morticínio e a Inglaterra foi considerada livre de febre aftosa três meses após o abate do último animal positivo, mais evidência de ausência de circulação viral», explica Miguel Lopes Jorge.

As vacinas DIVA apresentam-se, assim, como preciosos auxiliares para o controlo e a erradicação das doenças pois reduzem o número de animais abatidos e salvaguardam o bem-estar animal, ao reduzir o abate de animais sãos, o que tem conduzido a um «esforço cada vez maior para o seu desenvolvimento, nomeadamente orientado para as doenças passíveis de erradicação e que condicionam o trânsito animal entre países», segundo o responsável da Merial.

Este especialista explica que a UE estimula a vacinação nas chamadas “doenças de produção”, que têm impactos em termos de mortalidade e produtividade dos animais, como é o caso da salmonela, doença em que existe uma política europeia no sentido de estimular a vacinação, de forma a evitar a sua transmissão ao ser humano.

Por norma, é dada preferência às vacinas DIVA, sempre que existam para a doença em causa e sejam reconhecidas pela OIE. Nalguns casos são mesmo obrigatórias em processos de erradicação de doenças, como a doença de Aujesky.

Actualmente já estão disponíveis vacinas DIVA para doenças como a febre aftosa nos biungulados, a doença de Aujesky nos suínos, a IBR nos bovinos, e a gripe aviária. Está em desenvolvimento uma vacina DIVA para a língua azul.

O futuro na vacinação

Há uma grande expectativa de um aumento considerável da oferta de vacinas de terceira geração, vacinas de subunidades e vacinas (recombinantes) de ADN, que poderão revolucionar o futuro da saúde animal.

Nas vacinas de subunidades apenas estão presentes proteínas purificadas de um vírus e não o vírus completo. Estas proteínas são depois acopladas a outros vírus, bactérias ou leveduras, normalmente de outra espécie animal, para estimular melhor o sistema imunitário do hospedeiro. Exemplos são as vacinas da raiva, da gripe equina e da circovirose suína que usam o vírus da varíola dos canários como vector.

Nas vacinas de ADN são inoculados vectores de ADN que codificam antigénios de determinados agentes etiológicos de doenças. As células do hospedeiro vacinado incorporam este ADN e expressam o antigénio pretendido que é assim apresentado ao sistema imunitário. Exemplos são vacinas recentes contra o vírus West Nile em equinos ou contra a necrose hematopoiética infecciosa do salmão.

São vacinas extremamente seguras, em que é possível vacinar animais muito jovens, fêmeas gestantes, etc., pois «permitem ao animal gerar uma resposta imunitária de grande qualidade», afirma Miguel Lopes Jorge, estimulando ambos os compartimentos do sistema imunitário (celular e humoral). Por outro lado, permitem resolver problemas específicos como a interferência dos anti-corpos maternais na primovacinação de animais muito jovens. Torna-se, assim, possível antecipar a data da administração da primeira dose das vacinas, um dos aspectos que hoje limita a eficácia da vacinação. Recorde-se que se numa exploração de bovinos de carne das nossas raças autóctones, os reprodutores podem viver mais de dez anos, existindo múltiplas oportunidades de vacinação, nas aviculturas intensivas produz-se um frango de carne em 35-45 dias, o que torna exíguo o tempo disponível para conceber um calendário vacinal e requer que a vacinação seja feita o mais cedo possível, por vezes in ovo.

Têm também sido conseguidos desenvolvimentos na forma de aplicação das vacinas. É importante que a aplicação seja fácil, dado o grande número de animais a vacinar. Existem sistemas de administração de vacinas através da água (no caso de aves e suínos) e mesmo por nebulização, disponível para as aves. Quando a vacinação é feita individualmente por via parenteral pode recorrer-se à administração subcutânea, intramuscular, intranasal ou deposição de gota na conjuntiva.

Alterações climáticas requerem novas vacinas

Um problema novo na temática da vacinação das populações animais é as doenças emergentes que advêm do aquecimento global. Um exemplo é a língua azul, doença endémica na África Subsariana transmitida por insectos vectores que afecta espécies ruminantes. Chegou à Península Ibérica no final da década de 90 e actualmente já foram confirmados casos na Noruega.
Esta epidemia apanhou a Europa desprevenida, sem vacinas eficazes para a combater, pois as poucas existentes, produzidas na África do Sul, eram vacinas vivas atenuadas que levantavam problemas ao trânsito intra-comunitário dos animais.
Num processo mais rápido que o habitual – os requisitos de segurança impostos pela legislação europeia leva a um desfasamento de 8-10 anos desde o aparecimento de uma nova doença até à disponibilização comercial da respectiva vacina no mercado – em três anos foi desenvolvida uma vacina inactivada eficaz contra a língua azul, e após outros dois anos, Bruxelas concedeu uma autorização especial à sua utilização. «Foram encurtados alguns passos para fazer face a uma doença que tem um impacto económico relevante», explica Miguel Lopes Jorge.
«Cada vez vai haver mais epidemias de doenças que tenham insectos vectores envolvidos no seu ciclo epidemiológico», alerta Virgílio Almeida. «É um desafio muito complexo, ao qual a comunidade científica europeia e mundial tem que saber dar resposta para desenvolver vacinas eficazes contra estas doenças».

Especificidades portuguesas

Enquanto membro da UE, Portugal rege-se pelas regras comunitárias no que respeita à vacinação. Com algumas excepções. A primeira refere-se à grande diversidade de raças de ruminantes como a barrosã, a alentejana, a mirandesa ou a mertolenga, associadas a produtos comercializados com denominação de origem protegida. A segunda especificidade, neste caso da Península Ibérica, diz respeito ao porco preto.
Em ambos os casos, o modelo de produção é extensivo, o que aumenta a exposição dos animais a agentes etiológicos que possam ser veiculados por insectos vectores, aves migratórias, roedores e outros hospedeiros reservatórios selvagens, fontes de água (water borne diseases), etc., e implica ajustamentos específicos nos calendários de vacinação. Nomeadamente, o conhecimento actualizado das doenças mais frequentes nestes ecossistemas, disponibilidade de vacinas e análises custo/benefício da sua administração.

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