Surgiu da necessidade de criar um elo de ligação entre o ser humano e os animais de companhia. A Pet’s Dream Vet diferencia-se pelo conceito que criou e que tem ajudado a fomentar a proximidade com os donos. Apesar da pandemia, o crescimento deste consultório situado a norte do País tem sido sustentado ao longo do tempo. A novidade mais recente é a aposta no serviço de fisioterapia e reabilitação.
Uma simples conversa de café viria a tornar-se no projeto de vida do gestor comercial Miguel Gaspar e da médica veterinária de pets, Filipa Araújo. Tudo aconteceu durante o segundo ano do mestrado integrado em medicina veterinária, mas foi preciso aguardar que a atual diretora clínica solicitasse a acreditação para direção clínica de um CAMV. “O consultório teve de aguardar três anos após fundarmos a empresa pois não fazia qualquer sentido ter outro diretor clínico que não fosse um de nós”, explica Miguel Gaspar.
Filipa sempre sonhou ser veterinária desenvolvendo empatia com todos os animais que se cruzavam no seu caminho. Licenciou-se em biologia pela Universidade do Porto, em 2008. Nesse mesmo ano, devido à doença e posterior falecimento do seu animal de companhia, decidiu ir atrás do seu ímpeto por “querer fazer a diferença na vida de todos os animais”. Enquanto estagiava como bióloga, voltou a estudar para os exames nacionais, realizou as provas e entrou em Medicina Veterinária, no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto (ICBAS), em 2010. Já Miguel Gaspar, licenciou-se em cardiopneumologia, tendo exercido a profissão até 2011. “Em 2005, ingressei no exército português como sargento do serviço de saúde de onde saí em 2011.
Devido à nossa idade e à noção de que o mercado de trabalho é exigente e competitivo, falámos em criar um projeto que íamos desenvolvendo como part-time, mas que, em menos de dois anos, passou a full-time para mim. Mal a Filipa acabou o mestrado, iniciámos a empresa e, três anos depois, o CAMV”, explica.
A Pet’s Dream Vet, localizada em Moreira da Maia, no Porto, assume-se como “um conceito diferente de veterinária”, ao que os fundadores chamaram de “Pet’s Dream” e não se dedica exclusivamente à medicina veterinária de animais de companhia, mas também à venda de material e à prestação de serviços nesta área, como banhos, tosquias, entre outros. “A partir do momento em que abrimos o consultório, o nosso crescimento tem sido exponencial, mesmo perante a situação pandémica atual”, afirma a médica veterinária Filipa Araújo. O crescimento anual continuado chegou ao ponto de, em 2020, a empresa ter “dobrado o volume de faturação de serviços veterinários”, sublinha Miguel Gaspar.
Atualmente, são cinco as pessoas que fazem parte da equipa e do quadro da empresa, às quais se juntam vários elementos que trabalham em regime de prestação de serviços. Além de Miguel e Filipa, a administrativa Sara Duarte, a enfermeira Sofia Ferreira e a handler Ana Marinho dão resposta às necessidades dos clientes.
Defendem que não são os serviços diferenciados que os caracterizam, mas, sim, um acompanhamento diferente aos clientes. “Queremos ter parcerias com outros CAMV´s que nos ajudem a fazer o acompanhamento do animal de companhia em caso de doença e sermos nós a equipa em que podem confiar para todas as situações desde o nascimento até ao último dia do dreamer, não apenas para disponibilizar serviços de veterinária”, refere Miguel. A aposta no acompanhamento personalizado e individualizado de cada animal ultrapassa o serviço de medicina veterinária propriamente dito pois este constitui apenas uma parte do conjunto de serviços prestados. “Cada animal é acompanhado tendo em conta as suas particularidades e necessidades”, explica a médica veterinária.
Dividido em três áreas, o espaço interior conta com uma área total de 950 m2, em que o consultório integra uma zona destinada ao consultório veterinário e uma outra destinada a serviços para animais de companhia. Existe ainda uma sala de apoio ao pessoal com zona de refeições e descanso e vestiários. A zona destinada ao funcionamento do consultório veterinário tem uma área útil de 50 m², subdividida nos seguintes espaços: zona de receção; zona de espera; uma sala de consultório com 10 m²; uma sala de reabilitação com 15 m²; uma instalação sanitária e uma zona de distribuição. A aposta da direção clínica não passou tanto pelo espaço físico. “A nossa maior preocupação sempre foi, desde o primeiro dia, que o animal pudesse associar o médico veterinário, o enfermeiro veterinário e a restante equipa a uma experiência agradável que, caso necessário, faça parte do seu dia-a-dia. Por exemplo, é-me possível realizar alguns procedimentos mais invasivos, tais como, colheitas de sangue ou introdução de cateteres, sem qualquer tipo de contenção no animal”, refere Filipa Araújo.
Investir na relação com os animais
Este tipo de proximidade só é possível devido à ligação emocional e de confiança que é criada com o paciente e pelo facto de se tratar de um consultório onde é fomentada a proximidade e é dada a possibilidade de ter tempo para interagir de forma positiva e criar uma relação de confiança com os animais, o que torna o momento menos stressante para os pacientes. “Provavelmente, o ponto mais importante de toda a empresa é que queremos ensinar os animais [este CAMV está mais vocacionado para cães] a confiar na equipa de veterinária e que, em 90% das vezes que contactam com a enfermeira Sofia ou a médica Filipa, podem fazê-lo num ambiente relaxado, quer em consultório, quer em treino”, explica Miguel Gaspar assumindo ainda que, sempre que necessário, é preferível fazer domicílios do que realizar a consulta no CAMV, se isso permitir minimizar o stresse para os animais.
Ao contrário do que poderia ser expetável, a pandemia veio acelerar o investimento na área de veterinária. Os serviços habituais mantiveram-se em funcionamento desde o início do estado de emergência, em conformidade com o que era permitido e com os devidos planos de contingência. “No entanto, tivemos que nos adaptar como empresa, pois a parte dos serviços para animais de companhia – não considerados essenciais – teve de abrandar forçosamente”, conta Filipa Araújo. “Em pleno início da pandemia estávamos a otimizar áreas e recursos, bem como a descobrir qual seria a melhor área para crescermos de uma forma equilibrada para além da medicina veterinária de prevenção”, acrescenta Miguel Gaspar. Aproveitando a diminuição da procura habitual de serviços, foi feita uma aposta na área de reabilitação e de fisioterapia. Em particular, este investimento concretizou-se, na prática, na aquisição de aparelhos específicos para obter maior sucesso na fisioterapia, na reabilitação ortopédica e neurológica, como por exemplo, circuitos de reabilitação, eletroestimulador, passadeira aquática e, em breve, estará disponível um laser terapêutico.
“Em pleno início da pandemia estávamos a otimizar áreas e recursos, bem como a descobrir qual seria a melhor área para crescermos de uma forma equilibrada para além da medicina veterinária de prevenção” – Miguel Gaspar, gestor comercial
A aposta neste serviço começou a ser pensada em 2018 quando o Zeus, o anterior cão de Miguel Gaspar necessitou de fazer hidroterapia devido à idade. “Com o crescimento da empresa, não tínhamos como ir levá-lo e buscá-lo a algum colega e acabámos por comprar uma piscina”, conta. Foi nesse momento que se começou a equacionar a hipótese de a médica veterinária Filipa Araújo se especializar na área de fisioterapia e reabilitação até porque começavam a chegar cada vez mais famílias de cães idosos que já confiavam no seu trabalho. “A casuística mais comum surge no âmbito da medicina preventiva e também na patologia médica com ênfase nas áreas da dermatologia, ortopedia e patologias músculo-esqueléticas, gastroenterologia e doenças infeciosas”, salienta.
Uma vez que não têm atendimento permanente e outras valências, é comum referenciarem alguns casos para consultas de especialidade e atendimento hospitalar começando também eles a serem referenciados para a área de medicina física e reabilitação animal. “Temos sentido um aumento de procura nesta área, mas recebemos mais casos referenciados no que respeita a problemas de manipulação em consulta, bem como, para treino e sociabilização”, explica Miguel Gaspar.
Desde os tempos em que eram alunos de medicina veterinária que Miguel e Filipa passaram a perder muitos animais, a assistir ao seu envelhecimento e ao aparecimento de patologias que causavam um impacto negativo na qualidade de vida dos seus animais. “Percebemos que o tratamento farmacológico, muitas vezes, não era suficiente, pelo que, a área da fisioterapia/reabilitação e maneio da dor seria a área naturalmente a seguir. Quando já estava a realizar a minha especialidade de Fisioterapia e Reabilitação (Certified Canine Rehabilitation Practitioner – CCRP), acabei por sofrer uma mordida na mão direita e eu própria necessitei do apoio de fisiatras e fisioterapeutas para recuperar a função. Devo a estes profissionais o facto de hoje conseguir trabalhar sem grandes limitações físicas, o que veio reforçar ainda mais a minha vontade em me especializar nesta área, pois tive mais a certeza que era o caminho certo para fazer a diferença na qualidade de vida dos meus pacientes”, explica Filipa Araújo.
Aposta na proximidade
Muitos dos clientes do CAMV já tiveram ou têm serviços complementares, como o treino, a sociabilização, o dog walking ou a venda de ração. “Esta proximidade anterior é reforçada por caminhadas com as famílias e os respetivos dreamers, festas de aniversário e festas de Natal, embora tudo isto seja uma miragem no atual ambiente de pandemia. Porém, conseguimos manter o sentimento com vídeochamadas de grupo entre os clientes e o pessoal da empresa, com um grupo de WhatsApp e de Facebook”, refere Miguel Gaspar.
As redes sociais da Pet’s Dream Vet integram três páginas, uma dedicada à prevenção, outra focada na reabilitação veterinária e, uma terceira, mais geral. As duas primeiras são adequadas para marcações de serviços e para partilhar o evoluir da fisioterapia dos dreamers. “A mais antiga, que antecede mesmo a existência da empresa e da área clínica é a Pet’s Dream em que tentamos dar algumas dicas de sociabilização ou alertas para algumas situações, como a leishmaniose, mas, mais do que isso, é uma ferramenta para mostrar que os cães são animais sociais, mesmo que tenham problemas de comportamento e que devem poder passar tempo em grupo”, afirma Miguel. As redes sociais desempenham um duplo papel: passar informações relevantes para o bem-estar animal e dar a conhecer a forma como a equipa trabalha. “Como a nossa empresa tem várias valências optámos por representá-las nas redes sociais, em separado, de forma que a informação seja mais facilmente obtida de acordo com as necessidades de cada cliente”, sublinha Filipa.
No que respeita ao agendamento de consultas que é gerido pela administrativa, todas as marcações são realizadas por e-mail. Cabe à enfermeira Sofia, a missão de contactar os titulares no dia anterior a lembrar da marcação e da documentação necessária para a consulta e é ainda feita a sincronização com o e-mail do cliente através do envio de um lembrete eletrónico no dia anterior. “Felizmente, a nossa taxa de falha às consultas é praticamente nula”, explica a médica veterinária.
“Felizmente, a nossa taxa de falha às consultas é praticamente nula”, sublinha a diretora clínica Filipa Araújo
No que respeita à área de responsabilidade social, toda a equipa acaba por envolver-se em ações de voluntariado, mas a título pessoal e particular. Miguel Gaspar explica: “Em nove anos de conceito Pet’s Dream, já angariámos mais de dez toneladas de ração, já esterilizámos e castrámos dezenas de animais sem custos para os adotantes, já oferecemos cerca de 25000 horas de serviços de treino e sociabilização, mas tentamos sempre distanciar a empresa do conceito”.
Como mensagem final, Filipa Araújo gostava que a própria classe fosse mais unida. “A nossa valorização como profissionais tem de partir, em primeiro lugar, de nós próprios. Ninguém nos prepara para o desgaste emocional desta profissão e, portanto, é importante que haja uma rede de apoio entre colegas.” No que respeita precisamente aos colegas de profissão, sugere que “continuem a apostar na especialização e no trabalho em equipa pela constante melhoria e dos serviços veterinários prestados aos nossos animais”. Já Miguel Gaspar sugere aos que ainda estão a começar e que queiram fazer algo diferente que não deixem de apostar nisso.
“A nossa valorização como profissionais tem de partir, em primeiro lugar, de nós próprios. Ninguém nos prepara para o desgaste emocional desta profissão e, portanto, é importante que haja uma rede de apoio entre colegas” – Filipa Araújo, médica veterinária
São vários os projetos que têm em carteira para o próximo ano e até dezembro de 2022, mas, dada a atual situação pandémica, Filipa e Miguel optam por não divulgar antecipadamente. No entanto, o gestor comercial anuncia a criação de mais um polo com o mesmo conceito para o qual já estão à procura de médico veterinário e respetiva equipa.
Barreiras no acesso não são só económicas
A questão económica ainda continua a ser uma barreira para muitos titulares, especialmente após a pandemia, destaca Filipa Araújo. No entanto, adianta, as principais dificuldades a que assiste prendem-se com o excesso de informação e, muitas vezes, desinformação veiculada pelas redes sociais. “Sinto que a profissão de veterinária não é muito respeitada ou valorizada pela sociedade. Quando toca a tirar dúvidas sobre os seus animais, infelizmente, as pessoas ainda preferem ouvir a opinião do conhecido, do vizinho ou fazer pesquisas na internet, em vez de optarem pelo conhecimento do médico veterinário”, refere.
Miguel Gaspar acrescenta que o CAMV trabalha basicamente com as mesmas famílias que acompanharam o crescimento do conceito para empresa e para as atuais valências e que, por sua vez, foram trazendo amigos, familiares e conhecidos. “São aquilo a que chamamos de ‘família Pet’s Dream’ e, se por um lado temos famílias para as quais não há limites económicos no que está relacionado com o bem-estar do seu animal de companhia, outras têm de gerir melhor a sua resposta económica, sobretudo nesta altura de pandemia”, afirma o gestor comercial. “O facto de o nosso percurso ter iniciado ainda quando eramos estudantes de veterinária permitiu estabelecer uma relação de confiança e até de amizade com muitos clientes. Eles viram-nos crescer e acompanharam-nos na nossa evolução enquanto profissionais”, reforça Filipa Araújo. Sempre que recebem novos clientes, a equipa faz questão de os receber com empatia e tentar construir uma relação ao longo do tempo.
“(…) Se por um lado temos famílias para as quais não há limites económicos no que está relacionado com o bem-estar do seu animal de companhia, outras têm de gerir melhor a sua resposta económica, sobretudo nesta altura de pandemia” – Miguel Gaspar, gestor comercial
Outro desafio que a dupla de profissionais enfrenta passa por fazer os clientes perceberem o conceito que estão a implementar e que “facilita imenso a componente clínica no desenvolvimento de atividades no dia-a-dia”, conclui a médica veterinária.
*Artigo publicado originalmente na edição n.º 152 da revista VETERINÁRIA ATUAL, de setembro de 2021.