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Animais de Companhia

APMVEAC cria grupos de interesse especial em Oncologia, Estomatologia e Dermatologia e Imunoalergologia

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Ao todo, são já 16 os grupos de interesse especial na APMVEAC. A VETERINÁRIA ATUAL falou com os coordenadores das três equipas mais recentemente criadas, que irão procurar dar resposta aos desafios nestas áreas da medicina veterinária que estão em visível crescimento na prática clínica.

O anúncio foi feito durante o VIII Congresso de Medicina Felina, organizado pela Associação Portuguesa de Médicos Veterinários Especialistas em Animais de Companhia (APMVEAC) nos dias 12 e 13 de outubro em Lisboa. A associação que representa os profissionais que se dedicam à medicina veterinária dos animais de companhia ia criar mais três grupos de interesse especial (GIE) para juntar aos já 13 existentes: o Grupo de Interesse Especial de Dermatologia e Imunoalergologia (GIDIA), o Grupo de Interesse Especial em Oncologia (GIEONC) e o Grupo de Interesse Especial em Estomatologia (GIEE).

No evento, Emir Chaher, presidente da APMVEAC, avançou à VETERINÁRIA ATUAL os nomes dos profissionais que iam ficar à frente das coordenações dos três novos grupos de trabalho e salientou a vasta experiência que cada um dos profissionais convidados tem nas respetivas áreas, o que os torna nomes incontornáveis na medicina veterinária nacional: Lisa Mestrinho, Felisbina Queiroga e Luís Martins,

E em declarações à VETERINÁRIA ATUAL posteriores ao encontro, os três coordenadores salientaram a importância da formação dos profissionais nestes ramos da medicina veterinária que têm vindo a registar um número crescente de casos clínicos nos centros de atendimento médico veterinário (CAMV).

Se os clínicos já forem associados da APMVEAC, para pertencerem a qualquer dos GIE da associação basta manifestarem o interesse em participar dos trabalhos que cada um organiza.

É “necessário um maior conhecimento científico sobre estes temas”

Lisa Mestrinho vai ser a coordenadora do GIEE. A profissional é licenciada em Medicina Veterinária pela Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa (FMV-UL), onde é professora auxiliar com agregação e pertence ao corpo clínico no hospital universitário, é ainda fellow da Academy of Veterinary Dentistry, diplomada pelo American Veterinary Dental College e está focada no principal objetivo dos grupos de interesse especial da APMVEAC: “O enriquecimento técnico-científico da associação e, por isso, dos seus associados, nas diferentes especialidades da clínica de animais de companhia.”

“As doenças orais possuem uma prevalência elevada nos nossos cães e gatos e, como tal, a criação de um GIE na especialidade de Estomatologia faz todo o sentido, uma vez que irá contribuir para um maior reconhecimento das doenças orais.” – Lisa Mestrinho, coordenadora do GIEE

Lisa Mestrinho

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Sobre a área da Estomatologia em particular, Lisa Mestrinho lembra que “as doenças orais possuem uma prevalência elevada nos nossos cães e gatos e, como tal, a criação de um GIE na especialidade de Estomatologia faz todo o sentido, uma vez que irá contribuir para um maior reconhecimento das doenças orais”, um conhecimento que, consequentemente, trará “uma melhor qualidade de prestação de serviços nesta especialidade”.

Afinal, a área da Estomatologia apresenta ainda alguns desafios aos profissionais de medicina veterinária na prática clínica, “para além de ser necessário um maior conhecimento científico sobre estes temas”. No topo dessa lista, aponta a coordenadora do GIEE, estão as dificuldades no acesso à radiografia dentária, um campo ainda por explorar em muitos CAMV. “Por outro lado, ainda existe alguma dificuldade em implementar medidas preventivas da doença periodontal a partir da primeira consulta”, admite a responsável, que assegura ir trabalhar no âmbito do GIEE “para criar uma rede de colaboração entre colegas de forma que se aumente o reconhecimento desta necessidade e para que se consiga passar [conhecimento] à comunidade”.

Ainda no âmbito dos objetivos do GIEE, a coordenadora avançou que a equipa “pretende organizar dois encontros semestrais de formação e treino de clínicos para os procedimentos de diagnóstico e tratamento mais comuns”. Em simultâneo, pretende-se criar, “uma comunidade de apoio para responder a dúvidas de colegas sobre casos clínicos mais desafiantes, ao mesmo tempo que divulgará iniciativas de investigação e de divulgação de inovação científica na área da Estomatologia”, conclui.

GIEONC: Para “melhoria da formação técnica e científica de toda a equipa médico-veterinária”

Felisbina Queiroga foi o nome escolhido para coordenar o GIEONC. A professora associada com agregação na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), onde leciona Medicina Interna e Oncologia, há muito que se dedica à temática da Oncologia, sendo membro do Comité Científico da WSAVA, onde participou na criação do recente Comité de Oncologia, do qual é membro, e na redação das Guidelines “The 2023 World Small Animal Veterinary Association (WSAVA): List of essential medicines for cats and dogs”, sendo ainda uma das fundadoras da rede Vet-Onconet.

“Nem sempre os animais apresentam sinais clínicos indicadores de que sofrem de uma neoplasia. Assim, para que o médico veterinário possa chegar a um diagnóstico, necessita de realizar vários exames complementares – análises clínicas ao sangue e urina, exames imagiológicos como RX, ecografia ou TAC, etc. – o que supõe custos e esse pode ser um problema em alguns casos.” – Felisbina Queiroga, coordenadora do GIEONC

Felisbina Queiroga

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Em declarações à VETERINÁRIA ATUAL, a coordenadora do GIEONC frisa que a criação de um grupo de interesse dedicado à Oncologia “vem permitir que se realize formação continuada nesta área específica do conhecimento, contribuindo para a melhoria da formação técnica e científica de toda a equipa médico veterinária, no âmbito da Oncologia Clínica”.

Até porque, esta é, reconhecidamente, uma área clínica cada vez com mais expressão no dia a dia dos CAMV. Os motivos para o crescimento do número de casos de doença oncológica entre os animais de companhia não serão diferentes dos que levam também ao aumento da incidência de casos de cancro entre os humanos. Afinal, sendo o cancro uma doença multifatorial que envolve fatores etiológicos de natureza genética e hereditária, a ciência tem-se debruçado nos últimos anos a estudar a influência do ambiente – o comportamento individual, a poluição, a alimentação – no aumento do risco de desenvolver cancro e muitos desses fatores são comuns a tutores e a animais de companhia. “Os nossos animais de companhia também sofrem de cancro e também são afetados pelas alterações no meio ambiente que nos rodeia. Por essa razão, muitos estudos debruçam-se sobre como os animais de companhia podem atuar como sentinelas para a correspondente doença nos humanos, mostrando assim a sua relevância no âmbito da medicina comparada e no âmbito do conceito de “Uma só Saúde”. Isto também é verdade para o cancro”, explica Felisbina Queiroga.

A crescente prevalência do número de casos de cancro nos animais de companhia também apresenta desafios à equipa médico-veterinária a que o GIEONC procurará dar resposta. À cabeça nessa lista de dificuldades reside a particularidade de “nem sempre os animais apresentarem sinais clínicos indicadores de que sofrem de uma neoplasia. Assim, para que o médico veterinário possa chegar a um diagnóstico, necessita de realizar vários exames complementares – análises clínicas ao sangue e urina, exames imagiológicos como RX, ecografia ou TAC, etc. – o que supõe custos e esse pode ser um problema em alguns casos”, admite a responsável.

Os custos são outra temática relevante no que toca às terapêuticas indicadas para o tratamento da doença neoplásica em animais de companhia. Segundo explica Felisbina Queiroga, numa primeira instância, “nem sempre o acesso às drogas citostáticas está facilitado, uma vez que continuamos a necessitar de aceder aos fármacos citostáticos de uso em medicina humana, pois existem pouquíssimos fármacos comercializados especificamente para medicina veterinária. Depois, a acessibilidade [económica] aos medicamentos é também um fator limitante no tratamento dos casos oncológicos”.

Sobre os objetivos do GIEONC, a equipa quer criar uma plataforma de colaboração entre todos os associados da APMVEAC, interessados em Oncologia Clínica. A formação contínua será um objetivo importante a implementar e haverá lugar a troca de conhecimentos em fóruns e será realizado um levantamento de necessidades com vista à elaboração dos planos de formação e será fomentada a partilha de protocolos clínicos, tanto de prevenção, como de diagnóstico e tratamento.

E apesar de a investigação não fazer parte dos desígnios do grupo de interesse, “não é possível dissociá-la” de uma área clínica que continua a carecer de evidência científica com aplicabilidade na prática clínica. Nesse sentido, admite a responsável, “se acontecer, será resultado necessidades apontadas pelo grupo”.

GIDIA continuará “a promover o desenvolvimento do conhecimento de base científica”

Luís Martins assumirá a coordenação do GIDIA. Licenciado pela FMV-UL, o clínico é atualmente professor de Medicina Veterinária na Universidade de Évora, onde também desenvolve a atividade de investigador em Imunoalergologia e avicultura.

Em declarações à VETERINÁRIA ATUAL, o coordenador considera que “um grupo de interesse especial abrangendo a Dermatologia e a Imunoalergologia, na APMVEAC, faz muito sentido, considerando que, em medicina veterinária de animais de companhia, a Dermatologia será a área com maior expressão clínica em Imunoalergologia canina e felina”. Além disso, “se, por um lado, a criação do GIDIA abre caminho, a nível nacional, para uma mais estreita abordagem do domínio da Imunodermatologia, por outro, permite igualmente promover diferentes domínios da Dermatologia, beneficiando da inter-relação com outros GIE, no seio da própria APMVEAC”.

“Um grupo de interesse especial abrangendo a Dermatologia e a Imunoalergologia, na APMVEAC, faz muito sentido, considerando que, em medicina veterinária de animais de companhia, a Dermatologia será a área com maior expressão clínica em Imunoalergologia canina e felina.” – Luís Martins, coordenador do GIDIA

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Sendo duas áreas intrinsecamente ligadas, a Dermatologia e a Imunoalergologia têm, de momento, estadios diferentes no âmbito da medicina veterinária. A Dermatologia é uma área na qual já “é possível a certificação como diplomado em Dermatologia veterinária, que é internacionalmente reconhecida para o exercício clínico” e já dispõe de “um estatuto amplamente reconhecido junto da classe veterinária”, nomeadamente com a existência de várias sociedades internacionais que se aglomeram na World Association for Veterinary Dermatology. Em Portugal é uma especialidade que também tem tido um crescente desenvolvimento, sendo representada pela Sociedade Portuguesa de Dermatologia Veterinária.

Já “a Imunoalergologia Veterinária constitui uma área de especialização em franco desenvolvimento, num domínio em que a Imunologia interliga diferentes áreas com expressão sintomatológica, como a Dermatologia, a Oftalmologia, a Pneumologia ou a Gastroenterologia”, sublinha Luís Martins, explicando que “de facto, dentro da ampla prevalência de condições de base alérgica atendidas na prática clínica de animais de companhia, não são raros os casos de dermatite, conjuntivite, asma ou mesmo gastroenterite de origem alérgica”.

Em Portugal, estas áreas do conhecimento médico veterinário têm crescido exponencialmente e a equipa que dá agora forma ao GIDIA tem trabalhado na divulgação destas temáticas desde 2021. Já realizaram webinares temáticos, em domínios como o diagnóstico de alergia e opções terapêuticas,  oito worshops que se realizaram por todo o país – do Minho o Algarve – sobre a abordagem diagnóstica em Imunoalergologia de animais de companhia e, no segundo semestre letivo de 2022/2023, organizaram a primeira formação avançada, com creditação académica, em Imunoalergologia veterinária, em Portugal. Esta formação contou com o patrocínio científico da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica, da European Academy of Allergy and Clinical Immunology, da Universidade de Évora, que organizou academicamente, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa e da Egas Moniz School of Health and Science.

Com a constituição oficial do GIDIA, o trabalho da equipa continuará “a promover o desenvolvimento do conhecimento de base científica nas áreas de Dermatologia e Imunoalergologia” através da padronização e divulgação de metodologias diagnóstico-terapêuticas, da promoção de ações de formação com interesse técnico-científico, da interação com outros GIE’s da APMVEAC e da revisão da abordagem clínica aos problemas dermatológicos que constituem diagnósticos diferenciais importantes de atopia, como ectoparasitoses, reações adversas ao alimento, dermatofitose, piodermite bacteriana, entre outros.

A equipa do GIDIA pretende igualmente estreitar ainda mais os laços dos profissionais nacionais e da APMVEAC com todas as organizações, nacionais e internacionais, representativas destas áreas clínicas.

O coordenador do GIDIA admite ainda a constituição de uma “Rede VetAlergo.pt, enquanto rede colaborativa de CAMV, representativos de várias regiões de Portugal” que irá funcionar como base para o desenvolvimento e prossecução dos objetivos pensados pela equipa.

Enquanto professor universitário, Luís Martins está convencido de que “as novas gerações de médicos veterinários incluem profissionais com uma capacidade de desenvolvimento técnico-científico como nunca tivemos no passado”. Contudo, não raras vezes, deparam-se no terreno com as dificuldades económicas dos tutores que impedem a “implementação das melhores e mais atuais possibilidades diagnósticas e terapêuticas, constantes das guidelines internacionais” que dizem respeito à melhor abordagem diagnóstica e terapêutica destas patologias. Afinal, reforça, “o caráter multimodal da abordagem terapêutica, hoje inequivocamente reconhecido como vantajoso, também acarreta alguns custos adicionais”.

Em todo o caso, o GIDIA pretende melhorar continuamente este cenário preparando os profissionais “através de formação contínua, que nos manterá mais atualizados, para procederem ao melhor diagnóstico possível, com as condições disponíveis em cada caso, e isso revelar-se-á através da melhor abordagem terapêutica, com as condições disponíveis em cada momento”, remata.

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