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Evidensia Guimarães Hospital Veterinário: “O hospital pretende ser complementar às clínicas da região e não concorrencial”

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De portas abertas desde maio, o Evidensia Guimarães Hospital Veterinário é o primeiro em Portugal feito de raiz pelo grupo IVC Evidensia. À frente do projeto estão João Araújo e Fernando Silva, mentores de outra unidade na cidade vizinha de Braga, para quem é clara a direção que querem dar ao hospital veterinário: serem a referência nos cuidados diferenciados para os centros de atendimento médico veterinário da região.

Se os textos tivessem cheiro, este teria, certamente, cheiro a novo. Afinal, quando a VETERINÁRIA ATUAL falou com a equipa do Evidensia Guimarães Hospital Veterinário a unidade tinha aberto as portas há exatamente uma semana, a 12 de maio, e estava a preparar os últimos detalhes para fazer a inauguração oficial, que ia decorrer na semana seguinte, no dia 30.

 

O novo hospital veterinário minhoto é o primeiro que o grupo IVC Evidensia, presente em mais de 20 países, faz nascer em Portugal. Até agora, o modelo de negócio do grupo de cuidados médicos veterinários internacional passava por adquirir centros de atendimento médico veterinário (CAMV) já existentes nos vários países onde se tem implantado, mas a visão de João Araújo e de Fernando Silva ajudou a alterar a política seguida pelo grupo em Portugal. Isto porque os dois médicos veterinários – que são os mentores responsáveis pelo Hospital Veterinário Bom Jesus, inaugurado em 2018 em Braga e que também integra o grupo – notavam há algum tempo no trabalho quotidiano da unidade bracarense “que havia bastantes colegas e clínicas veterinárias desta zona de Guimarães que referenciavam casos clínicos para o Hospital Veterinário Bom Jesus pois, na altura, não havia nenhum hospital a trabalhar 24 horas em Guimarães”, recorda João Araújo. E tantos eram os casos recebidos em Braga que, para os dois amigos, começou a fazer todo o sentido criar uma resposta hospitalar mais próxima dos colegas referenciadores e, obviamente, dos tutores e dos seus animais de companhia para que estes não se vissem obrigados a maiores deslocações em caso de necessidade. Decidiram, então, apresentar ao grupo IVC Evidensia a ideia de conceber um novo hospital na cidade vimaranense e este “mostrou, desde logo,  interesse pelo projeto e decidiu avançar com a criação de uma unidade feita de raiz”, acrescenta o codiretor clínico e responsável pelo serviço de urgência e pela unidade de cuidados intensivos em Guimarães. Curiosamente, na Península Ibérica só há outra unidade também construída pelo grupo, situa-se em Sevilha, e até abriu as portas mais ou menos ao mesmo tempo da unidade de Guimarães.

“Temos profissionais com valências muito específicas e queremos oferecer esses serviços aos colegas da região” – João Araújo, codiretor clínico do Evidensia Guimarães Hospital Veterinário

 

Uma aposta clara na diferenciação de cuidados

Para o novo hospital de Guimarães, João Araújo e Fernando Silva levaram muita da aprendizagem na unidade bracarense, nomeadamente aquilo que correu bem: a aposta nos cuidados diferenciados dentro da medicina veterinária. “O hospital [de Guimarães] pretende ser verdadeiramente complementar às clínicas da região e não ser concorrencial. Como tal, decidimos não fazer vacinas, nem fazer profilaxia, ou seja, aquela consulta mais rotineira não é o nosso foco. Isto é para tentar demonstrar aos colegas que pretendemos ser uma extensão dos seus próprios centros e sermos colaborativos, porque temos profissionais com valências muito específicas e queremos oferecer esses serviços aos colegas da região”, explica João Araújo.

 

E esse princípio servirá para os casos urgentes que necessitam de uma porta aberta 24 horas por dia, para os casos mais delicados que precisam receber cuidados intensivos e para os casos clínicos que carecem de um conhecimento mais especializado. E para isso, na equipa médicos veterinários contam-se profissionais com certificação pelos colégios europeus de especialidade, nomeadamente Brigite Pedro e João Neves, ambos diplomados em Cardiologia pelo Colégio Europeu de Medicina Veterinária Interna – Animais de Companhia, e outros que, não tendo feito formação certificada pelos colégios de especialidade, têm formação pós-graduada avançada em várias áreas do saber médico veterinário.

Ao todo, são 18 os elementos que fazem parte da unidade vimaranense –  11 médicos veterinários, dois enfermeiros veterinários, dois auxiliares veterinários e três funcionários administrativos – sendo que João Araújo, Fernando Silva, Brigite Pedro e João Neves dividem o tempo entre Braga e Guimarães e os restantes estão a tempo inteiro no novo hospital.

 

Depois, existe a equipa do Hospital Veterinário Bom Jesus que, assegura João Araújo, “vai colaborar com o Evidensia Guimarães Hospital Veterinário porque somos todos parte da mesma família. Em Braga temos colegas que fazem Dermatologia,  Neurologia ou Cirurgia, que não são diplomados, mas têm uma vasta experiência e formação nestas áreas e nos quais depositamos toda a confiança para fazerem consultas de uma determinada área específica”, acrescenta o responsável.

Esta vertente da especialização dentro da medicina veterinária é um caminho em crescendo, muito associado também ao regresso a Portugal dos diplomados pelos colégios europeus, depois de terminada a formação no estrangeiro. Fernando Silva,  codiretor clínico e responsável pelo serviço de Cirurgia, vê esse regresso “como um total privilégio para nós, enquanto mercado. Poder ter esta diferenciação, poder ter este grau de conhecimento, este afunilamento na patologia, é um absoluto privilégio” para os tutores e seus animais de companhia e também para os médicos veterinários generalistas, cuja importância na medicina preventiva e acompanhamento de proximidade se mantêm e é reforçado com o conhecimento diferenciado destes profissionais.

Daí a importância de alimentar a relação entre cuidados generalistas e cuidados diferenciados hospitalares para benefício de ambas as partes. Nesse sentido, e com a aprendizagem dos anos de trabalho em Braga, na equipa de Guimarães há uma pessoa, no caso uma enfermeira veterinária, com a função de referral manager que, explica João Araújo, “é uma pessoa dedicada e cujo trabalho é fazer a ponte entre os hospitais e os médicos referenciadores. No fundo, zela para que haja uma boa comunicação entre a clínica que referenciou e o hospital que recebeu o caso”. Desta forma, consolida-se uma relação que se quer de confiança, sem os tradicionais receios de perda de clientes por parte dos CAMV mais pequenos, pois o intuito do hospital é mesmo receber o caso, diagnosticar ou tratar conforme as necessidades, e fazer o animal regressar ao profissional que o acompanha desde sempre. “Acho que esta postura de transparência na comunicação e no feedback ao colega consolida bastante a relação de confiança que existe. Deixa de haver espaço para o antigo medo da perda do cliente, porque o hospital ia ficar com ele”, acrescenta Fernando Silva.

Para além de terem delineado este modo de atuação, foi feito um trabalho muito próximo com os CAMV das redondezas. João Araújo falou pessoalmente com os colegas que ainda não conheciam e não trabalhavam com a unidade de Braga para explicar como desejavam colaborar e prestar os serviços de cuidados diferenciados de forma transparente e complementar à medicina veterinária mais generalista.

“Acho que esta postura de transparência na comunicação e no feedback ao colega consolida bastante a relação de confiança que existe. Deixa de haver espaço para o medo que havia da perda do cliente porque o hospital ia ficar com o cliente” – Fernando Silva, codiretor clínico do Evidensia Guimarães Hospital Veterinário

Cardiologia: um exemplo prático da referenciação

Brigite Pedro é a voz dos exemplos práticos de como funciona a referenciação neste projeto de cuidados médicos veterinários. A especialista europeia já recebia em Braga alguns casos referenciados de Guimarães para diagnóstico e tratamento de condições cardíacas e agora desloca-se alguns dias por semana à cidade vimaranense para prestar o mesmo tipo de acompanhamento “e tem funcionado muito bem”, assegura à VETERINÁRIA ATUAL. A médica veterinária explica que, depois de receber o animal referenciado com as indicações do médico referenciador, é sempre feito um relatório explicativo de tudo o que foi realizado no hospital para o tutor entregar no CAMV onde é seguido. “Se o caso for mais complexo, obviamente, há conversas telefónicas [entre o médico veterinário do hospital e o médico veterinário do CAMV] durante o seguimento, que muitas vezes já é feito nas clínicas. Ou seja, o animal não tem obrigatoriamente de continuar a fazer todas as consultas de seguimento aqui. Pode ser feito o seguimento na clínica e nós vamos falando com os colegas para irmos discutindo os resultados e irmos dando o feedback ao longo do tempo”.

Em caso de necessidade, alteração ou degradação do quadro clínico, o animal pode voltar ao hospital, mas a ideia é que se mantenha em seguimento no médico referenciador. “Diria que, na grande maioria dos casos, é muito mais fácil o caso ser gerido na clínica”, assegura a especialista europeia, onde o tutor está mais próximo de casa e da zona de conforto do animal, sendo que os profissionais do hospital estão sempre disponíveis para tirar dúvidas aos colegas e discutir qualquer mudança na abordagem clínica. E o facto, é que, relata Brigite Pedro, “não temos tido problemas, porque o que queremos é que as duas equipas [a do hospital e a que referenciou] estejam a trabalhar para o mesmo objetivo [a saúde do animal]”.

João Araújo e Fernando Silva também contam que algumas clínicas começaram a referenciar situações pontuais, por exemplo para a realização de exames complementares de diagnóstico. Como viram que correu bem e houve “uma consolidação da relação de confiança com os serviços do hospital”, diz Fernando Silva, começam a referenciar casos clínicos mais complexos aprofundando a esta complementaridade de cuidados aos animais de companhia.

Este caminho é, na perspetiva de Brigite Pedro, imparável na medicina veterinária. “Tal como na medicina humana, o médico generalista tem um leque muito grande de conhecimento, mas em determinadas áreas, aquelas em que nos especializamos, ele acaba por não ir tão ao fundo da questão. Os especialistas europeus fazem um treino muito profundo, muito específico e avançado em determinada área”, explica, lembrando que, com o regresso dos médicos veterinários que se especializam no estrangeiro, “os hospitais nacionais vão ficando cada vez com mais valências e vamos começando a ter cada vez mais especialidades para oferecer”, tanto a tutores como a médicos veterinários generalistas.

Nessa visão que aproxima cada vez mais a prestação de cuidados médicos veterinários com a organização da medicina humana, o grupo também quis apostar na formação especializada. A oportunidade surgiu com a abertura na Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa do primeiro programa de residência em Medicina Interna de Animais de Companhia em Portugal, orientado pelo especialista europeu Rodolfo Leal, que abriu as portas para a realização de formação certificada pelos colégios europeus em território nacional. O grupo IVC Evidensia Portugal quis aproveitar o momento e estabeleceu um protocolo entre a faculdade e o Hospital Veterinário do Bom Jesus para que seja formada a segunda especialista europeia em Medicina Interna em território nacional, que depois trabalhará nas unidades minhotas.

“O que queremos é que as duas equipas [a do hospital e a que referenciou] estejam a trabalhar para o mesmo objetivo [a saúde do animal]” – Brigite Pedro, especialista europeia em Cardiologia

Aproveitar o ADN que funciona bem

Se para a formação da equipa e para a dinâmica de referenciação foi aproveitado muito do conhecimento adquirido na unidade de Braga, para o desenho físico das instalações de Guimarães não foi diferente. “A parte estrutural bebeu muito do ADN e da configuração que temos no hospital de Braga. Fizemos alguns ajustes inerentes àquilo que em tempo real percebemos que funcionou pior, ou que poderia funcionar melhor na obra, mas o ADN é muito semelhante”, explica Fernando Silva.

Num piso térreo, o front office recebe os clientes com uma dinâmica minimalista que se estende depois aos consultórios – três dedicados a gatos e três dedicados a cães, com salas de espera também separadas por espécie – a partir dos quais os profissionais drenam os casos para uma zona de trabalho em open space “um espaço amplo, comum, onde as pessoas trabalham e é ali que acaba por ser o coração do hospital no dia-a-dia”, refere ainda o responsável. É dessa zona que os casos são encaminhados para as diferentes hospitalizações, para os exames complementares de diagnóstico ou para os blocos de cirurgia.

João Araújo acrescenta à descrição do amigo e sócio que também os internamentos estão divididos por espécie e por condição clínica – doenças infeciosas e não infeciosas – e que existem ainda jaulas especialmente equipadas para a prestação de cuidados intensivos, com controlo de temperatura, oxigénio e humidade. As duas salas de cirurgia estão já em pleno funcionamento e há o plano para, em breve, se começar a fazer intervencionismo na área da Cardiologia, estando a equipa apenas a aguardar a chegada do material necessário. Há ainda espaço para, quando as necessidades assim o exigirem, o hospital possa crescer em área.

Novidade nas instalações foi a criação de uma sala unicamente dedicada à realização de eutanásias. “Sentimos que a eutanásia – muitas vezes feita no consultório ou, menos comum, no internamento – não era realizada num ambiente correto, que permitisse ao tutor e à equipa fazer as coisas de forma mais tranquila, sem constrangimentos de tempo ou de barulho. Não podemos esquecer que esse é um momento difícil para o tutor e também para a equipa que tratou o animal, viu como as coisas evoluíram e chegaram ao fim de linha. É um momento muito especial que devemos cuidar e dignificar”, explica João Araújo.

Nas instalações há ainda espaços para a realização de exames complementares de diagnóstico – análises completas, ecografia, fluroscopia, endoscopia rígida e flexível, radiografia – e existe ainda uma ambulância veterinária caso seja necessário levar o animal à unidade de Braga realizar algum procedimento ou ser visto por algum profissional das áreas diferenciadas.

No primeiro andar do hospital, funciona a sala de formação (ver caixa) e estão localizadas as zonas mais reservadas para utilização privada da equipa.

A terminar a conversa com, foi abordado o dinamismo do mercado da medicina veterinária. Afinal, no espaço de poucos meses abriram dois hospitais veterinários na cidade de Guimarães. João Araújo admitiu terem ficado “surpreendidos”, mas acredita que “há espaço para colaboração, para coabitarmos em conjunto. Estamos todos no barco e vejo como objetivo principal que haja uma maior capacidade de oferta para as clínicas da região, que são muitas, e para os tutores”.

Uma visão partilhada com Fernando Silva, para quem “será sempre melhor trabalhar num mercado onde há boa energia e boa colaboração. Portanto, da nossa parte, sempre existirá margem para a melhor colaboração possível, a melhor entreajuda”.

Mariana Pacheco, responsável pela Academia IVC Evidensia Portugal explica que o primeiro objetivo desta valência será “sem dúvida, assegurar uma boa formação interna”

Guimarães também recebe primeira academia física da IVC Evidensia na Península Ibérica

Além de inaugurar uma nova abordagem ao mercado médico veterinário em Portugal por parte do grupo internacional, o Evidensia Guimarães Hospital Veterinário também acolherá a primeira academia física para formação profissional do IVC Evidensia.

Quando foi desenhada a estrutura da unidade hospitalar, delineou-se que o primeiro andar iria ser alocado à academia que servirá para “a formação das nossas equipas de médicos veterinários, de enfermeiros e de rececionistas”, começa por apresentar João Araújo.

À frente desta nova valência está Mariana Pacheco, médica veterinária formada pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto que decidiu dedicar-se em exclusivo à área da formação, coordenando e desenvolvendo cursos e programas formativos para as equipas veterinárias. Na conversa com a VETERINÁRIA ATUAL,  a responsável pela Academia IVC Evidensia Portugal explica que o primeiro objetivo desta valência será “sem dúvida, assegurar uma boa formação interna” para os funcionários do IVC Evidensia, numa primeira instância para os que trabalham nos vários CAMV do grupo em Portugal e, eventualmente, no futuro aproveitar a proximidade da região norte a Espanha e criar sinergias com os profissionais do grupo do país vizinho.

Mariana Pacheco adianta ainda que já começou a trabalhar no programa de formação para 2025 tendo por base a opinião dos colaboradores. “No ano passado houve um questionário feito aos profissionais do grupo que identificaram as áreas nas quais gostariam de receber mais formação e, acima de tudo, queremos cobrir as necessidades identificadas nesse feedback do questionário”, explica a médica veterinária. E assim sendo, para setembro está já agendado um curso presencial na área da Cardiologia ministrado pelos dois diplomados europeus, Brigite Pedro e João Neves, e também está marcada uma formação em ecografia abdominal por Philippa Weston, médica veterinária no hospital veterinário de Braga e especialista diplomada pelo Colégio Europeu de Diagnóstico Veterinário por Imagem.

Apesar de as formações presenciais irem começar a fazer parte do quotidiano dos profissionais, Mariana Pacheco assegurou que a aposta nos webinares formativos vai continuar permitindo que os profissionais possam, posteriormente, manter-se em contacto com o formador e aceder às gravações na plataforma gerida pelo IVC Evidensia.

*Artigo publicado na edição 194, de junho, da VETERINÁRIA ATUAL

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