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“A realização do 26.º Congresso EVSSAR no Porto representa um momento de grande relevância para a medicina veterinária portuguesa”

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Quase 20 anos depois, Portugal volta a receber um Congresso da European Veterinary Society for Small Animal Reproduction (EVSSAR). A 26.ª edição do encontro major da Medicina de Reprodução veterinária na Europa decorre esta semana e conta o apoio do Grupo de Interesse Especial em Reprodução Animal (GIRAC), da Associação Portuguesa de Médicos Veterinários Especialistas em Animais de Companhia (APMVEAC). Paulo Borges, coordenador do GIRAC fala à VETERINÁRIA ATUAL sobre a importância deste encontro para a comunidade veterinária nacional e faz uma breve análise do panorama da Medicina de Reprodução.

“A realização do 26.º Congresso EVSSAR no Porto representa um momento de grande relevância para a medicina veterinária portuguesa, quer do ponto de vista científico, quer institucional”, é com estas palavras que Paulo Borges, coordenador do GIRAC e especialista europeu em Medicina de Reprodução pelo European College of Animal Reproduction, apresenta o encontro que terá lugar de 3 a 5 de julho no Centro de Congressos da Alfândega do Porto.

 

Esta será a segunda vez que Portugal acolhe o encontro major da Medicina de Reprodução veterinária europeia, após uma edição realizada no Estoril em 2007. Voltar a receber este evento 18 anos depois, na opinião do especialista europeu, “reflete não só a evolução da medicina reprodutiva em pequenos animais no nosso país, como também o crescente envolvimento de colegas portugueses em redes científicas internacionais e na própria direção da EVSSAR”.  De recordar que Paulo Borges é, atualmente, também vice-presidente da sociedade europeia que reúne os médicos veterinários europeus que se dedicam à reprodução de animais de companhia.

Com o objetivo de dar respostas aos desafios quotidianos dos profissionais que se dedicam a esta área do saber da medicina veterinária, o programa científico do 26.º Congresso EVSSAR foi desenhado de forma a ser “vasto, atual e multidisciplinar, refletindo a riqueza e complexidade da medicina reprodutiva em pequenos animais”, assegura Paulo Borges.

 

Estão previstas mais de 50 apresentações orais, 4 keynotes principais, diversas sessões paralelas e a estreia de simpósios dedicado a médicos veterinários nacionais, enfermeiros veterinários e criadores. Assim, logo no dia 3, decorrerá o simpósio “The microbiota in the perinatal period: human perspectives and future direction for companion animals”, com o patrocínio da Royal Canin, e no mesmo dia está programado um simpósio dirigido aos criadores. No sábado terá lugar um simpósio de enfermagem, organizado em colaboração com a Associação de Enfermeiros Veterinários Portugueses (AEVPORT).

O também vice-presidente da EVSSAR destaca entre os temas mais relevantes a conferência de abertura, no dia 4, que está entregue a Alain Fontbonne, especialista europeu em Medicina de Reprodução de pequenos animais, que irá falar sobre o conhecimento atual — e também o que ainda está por descobrir — na biologia reprodutiva de gatos.

 

Daniel Combarros, especialista europeu em Dermatologia, abordará as complexas interações entre pele e hormonas sexuais e Maja Zakosek Pipan virá da Eslovénia para falar de novos conceitos em neonatologia, centrando-se na relação entre saúde intestinal e vitalidade neonatal.

A “gestação felina e as suas ‘misteriosas’ particularidades serão o tema da conferência de Sabine Schaefer-Somi, uma referência europeia em fisiologia da gestação”, acrescenta o médico veterinário.

 

Além destas intervenções, o congresso contará ainda com sessões que abordarão temas como a Andrologia, a tecnologia, a biotecnologia e a ética reprodutiva, nas quais participarão nomes como Marc Yeste, Jane Morrell, Helio Autran de Morais, Sebastian Arlt, Stefano Romagnoli e Wojciech Niżański e está prevista uma mesa-redonda sobre Ética e Seleção Responsável – “Future-Proof Breeding” – durante a qual serão discutidos os desafios atuais e futuros da reprodução em cães.

Sobre a participação nacional no encontro, Paulo Borges destaca as apresentações clínicas inovadoras de Graça Lopes, Rita Payan-Carreira, Ana Celeste Bessa, Inês Jerónimo, Joana Carvalho e Maria Carlos Pereira, “mostrando o dinamismo da medicina reprodutiva em Portugal”.

“O congresso também integra uma forte componente jovem e académica, com uma competição de estudantes, apresentações de casos clínicos e investigação aplicada, além de uma área expositiva com mais de 100 pósteres científicos”, acrescenta Paulo Borges.

“A comunicação entre médicos veterinários e criadores continua a ser, em muitos contextos, um ponto crítico e muitas vezes negligenciado na formação e na prática clínica.” – Paulo Borges, coordenador do GIRAC da APMVEAC

Preconceito e falta de formação dificulta comunicação

Por todo o programa do evento perpassarão algumas das temáticas que afetam os profissionais que se dedicam a esta área do saber da medicina veterinária, nomeadamente as conversas por vezes complicadas, mas necessárias, entre médicos veterinários e criadores. Este é, reconhece Paulo Borges, um “tema central para o GIRAC”, como já tinha assumido à VETERINÁRIA ATUAL aquando da criação do grupo de interesse especial da APMVEAC. “A comunicação entre médicos veterinários e criadores continua a ser, em muitos contextos, um ponto crítico e muitas vezes negligenciado na formação e na prática clínica. Em Portugal, ainda existe alguma distância — cultural, técnica e até emocional — entre as duas partes, o que pode gerar mal-entendidos, desconfiança e resistência à implementação de boas práticas”, volta a reforçar o responsável.

Na perspetiva do médico veterinário, continua a faltar formação em comunicação e “muitos veterinários não se sentem preparados para gerir conversas delicadas, sobretudo quando envolvem decisões clínicas, investimento económico ou expectativas irreais por parte do criador” o que se associa, muitas vezes, a um “histórico de desvalorização mútua pois ainda persiste algum preconceito — por parte de alguns colegas — em relação aos criadores, o que não ajuda a construir pontes”. Por outro lado, acrescenta, “muitos criadores veem o veterinário apenas como alguém que ‘executa’ procedimentos, sem o reconhecer como parceiro técnico”. Além disso, a ausência de protocolos partilhados, a inexistência de linhas de orientação claras e partilhadas sobre reprodução, maneio neonatal ou critérios éticos de seleção “faz com que muitas decisões sejam tomadas de forma reativa e não preventiva”, sublinha.

IA: chegou para ficar, também na medicina de reprodução

Outro tema que, certamente, irá estar presente em muitos momentos do programa e em conversas entre os profissionais presentes será a utilização da Inteligência Artificial (IA) no campo da Medicina de Reprodução em veterinária. Segundo Paulo Borges, “a Inteligência Artificial está a introduzir-se rapidamente na medicina veterinária, sobretudo em áreas como o diagnóstico por imagem ou a triagem do risco, mas também na reprodução assistida assistimos a avanços”. E, embora a IA no campo da Reprodução Veterinária ainda seja emergente, “já existem exemplos promissores com impacto real na prática clínica” que poderão explorados e discutidos no encontro, nomeadamente ao nível das avaliações padronizadas que ajudam a reduzir erros humanos e a melhorar a consistência clínica, no processamento de grandes volumes de informação que ajudam à tomada de decisão, no apoio em situações de emergência e complicações e no afinamento dos tratamentos hormonais, temporizações e seleções genéticas com base em dados históricos, o que irá permitir aumentar as taxas de sucesso com maior sobrevivência neonatal e gestão proativa que conduzem a melhores índices clínicos e económicos.

Esterilizações: o que há de novo?

O encontro anual da EVSSAR será também uma oportunidade para abordar e debater as mais recentes guidelines da World Small Animal Veterinary Association (WSAVA), publicadas em 2024, sobre o controlo da reprodução em cães e gatos, as quais incluem inovações sobre a abordagem minimamente invasiva, nomeadamente por técnicas laparoscópicas, e a recomendação da ovariectomia (OVE) “como técnica preferencial quando se pretende eliminar as hormonas sexuais, por ser menos invasiva, mais rápida e estar associada a menos complicações”.

Paulo Borges recorda ainda que o documento da WSAVA tem também recomendações ao nível das alternativas não-cirúrgicas de controlo da natalidade – nomeadamente no que diz respeito ao uso de implantes deslorelina (agonistas-GnRH), contracetivos hormonais, vacinas anti-GnRH, e castração química (intra-testicular) – úteis em animais com contraindicações à cirurgia e ainda fornece orientações para o uso racional de antibióticos e para a gestão da dor pós-operatória.

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