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Animais de Companhia

Tolerância zero aos maus-tratos animais

Novas penas para maus-tratos a animais

O abandono animal, o (des)controlo de animais errantes, as adoções por impulso, a sobrelotação dos Centros de Recolha Oficial Animal são problemas que o setor enfrenta diariamente. Onde falta investir? Os cidadãos já estão sensibilizados? E as leis, são bem realizadas, mas não são bem aplicadas na prática?

A manifestação pela criminalização dos maus-tratos a animais realizada em janeiro deste ano, em Lisboa, não deixou ninguém indiferente desde logo pela enorme adesão. Agendada pela Organização Intervenção Resgate Animal, o motivo do protesto deveu-se ao facto de o Ministério Público ter pedido a inconstitucionalidade da norma que prevê essa criminalização. Na opinião de João Paulo Costa, médico veterinário municipal de Boticas, o sucesso da manifestação “representa a vontade cada vez maior dos cidadãos em fazer respeitar os direitos dos animais e o seu bem-estar. A lei, embora adequada e pertinente, não tem tido o efeito dissuasor pretendido, facto ainda mais notório com a perspetiva da sua alegada inconstitucionalidade”. Por outro lado, o também diretor clínico da Trás-os-Vet considera que “o poder governativo não tem tido a capacidade de gerir adequadamente esta situação, que sejam os cidadãos a demonstrar tal facto e a provocar os decisores no sentido de se encontrarem soluções viáveis, exequíveis e adequadas”.

 

A morosidade dos processos e o destino a dar aos animais que são vítimas de maus-tratos criam verdadeiros obstáculos ao bem-estar animal. João Paulo Costa dá um exemplo concreto: “Tenho uma cadela no Centro Municipal de Recolha Oficial de Animais de Companhia de Boticas (CMROACB) desde o dia 2 de março de 2022, estando o caso no Ministério Público, a aguardar uma decisão.”

Portugal tem 308 municípios e, até ao momento, não chegam a trinta aqueles a que aderiram a esta medida [Cheque Veterinário] que pode ser muito eficaz e fazer a diferença” – Pedro Paiva

 

Pedro Paiva

Também Nuno Paixão, médico veterinário e provedor Municipal dos Animais de Almada defende que a manifestação veio demonstrar a sensibilidade das pessoas com os direitos dos animais. Conta ainda que ele próprio esteve na manifestação e que encontrou pessoas que nunca estiveram ligadas a nenhuma iniciativa relacionada com os direitos dos animais e que “se deram ao trabalho de se deslocarem e participarem na manifestação, o que é algo muito positivo”.

 

Está a ser feito um trabalho na retaguarda por parte de associações de direitos de animais junto da Assembleia da República, de deputados e da Procuradoria-Geral da República e que confere a parte mais técnica e de alerta para pontos-chave. “É um trabalho menos visível, mas muito relevante no dia-a-dia.” Sublinha, no entanto, que faltam meios necessários a Portugal e que seria importante “haver melhorias por parte de quem compete tomar decisões e ter coimas mais facilmente aplicadas”.

Os maus-tratos contra animais de companhia são um crime desde 2014, ou seja, várias pessoas desde este ano têm vindo a ser condenadas em primeira instância perante a questão deste crime. Pedro Paiva, Provedor dos Animais de Lisboa suporta-se de alguns números. “Em cinco anos, foram denunciados cerca de dez mil crimes e 17 detidos por abandono dos animais. Através da Polícia de Segurança Pública, foram registados 1615 denúncias de crimes de abandono de animais e 2278 situações de maus-tratos. A GNR contabilizou 5330 crimes, 3385 por maus-tratos e 1995 por abandono.” Considerando que a lei atual “resulta e dá proteção jurídica a estes animais”, lamenta, no entanto, a recente decisão que o Ministério Público tomou junto do Tribunal Constitucional através do pedido da declaração de inconstitucionalidade da norma que criminaliza com multa ou prisão. “Perante estes números e estes recuos é normal que a manifestação do passado dia 21 de janeiro tenha tido a adesão a que assistimos.” O provedor não tem dúvidas de que esta “foi claramente uma manifestação de que a sociedade portuguesa está em linha com aquilo que é o avanço civilizacional em Portugal em relação ao respeito pelos animais e que a sociedade civil não tolera os maus-tratos animais”. O número de denúncias tem aumentado anualmente e o ano de 2022 foi aquele em que se registaram mais denúncias em relação aos maus-tratos animais, alerta Pedro Paiva.

 

Considerando que a nova lei tem impacto direto no comportamento das pessoas, há agora maior consciência da realidade, o que se consubstancia num maior despertar das pessoas “para as questões de maus-tratos e de abandono que se traduzem no aumento de contactos e de queixas que vão sendo feitos. Podemos avaliar e averiguar as situações que nos são apresentadas e tentar a resolução de problemas, de acordo com o que a legislação nos permite, no sentido de atingir o objetivo último que é o do bem-estar animal”, explica Paula Martins, médica veterinária de Sintra.

Quebrar o ciclo do abandono através da educação

Independentemente da evolução futura do quadro legal, importará sempre aumentar a sensibilização e contribuir para um maior sentido ético de responsabilidade, na opinião de Sofia Baptista, responsável pelo Pelouro da Proteção e Bem-Estar Animal da Câmara Municipal de Lisboa. “As autoridades policiais poderão desempenhar um papel relevante na prevalência da responsabilização, se for possível aumentando a incidência da fiscalização aos detentores”, defende.  Adotar um animal implica sempre uma enorme responsabilidade. Por isso, muitas das chamadas adoções por impulso podem ter consequências que originem devoluções ou o abandono animal, ainda que as causas sejam multifatoriais. Os cursos de formação já existentes noutros países como forma de preparação de futuros detentores antes de decidirem adotar ou adquirir um animal, podem constituir, a seu ver, “uma mais-valia social e um importante contributo para o sucesso pós-adoção, mas outra questão é a da imposição da sua obrigatoriedade”.

 “Sabemos que se verificam cerca de 20.000 adoções por ano, enquanto são abandonados/nascidos sem controlo, à volta de 35.000 animais, no mesmo espaço de tempo. Assim, é muito difícil lidar com este flagelo que cresce continuamente” – João Paulo Costa

Antes de tudo, há que “respeitar a dignidade animal para que as pessoas considerem que os seus animais são membros da família”, explica Nuno Paixão. “Com mais ou menos recursos, mais ou menos meios, atualmente, é possível ter animais e dar-lhes o mínimo de qualidade de vida aceitável. Nada justifica o abandono de um animal”, adianta. A ideia de formar futuros detentores de animais, não é inédita. “O nosso problema está numa má cidadania em relação aos animais. Relativamente a um possível curso em Portugal, o médico veterinário considera que pode ser positivo pois “à partida, só quem está mesmo interessado em ter um cão ou um animal de companhia é que se sujeita ou tem tempo para fazer esta formação.”

João Paulo Costa tem algumas dúvidas relativamente à aplicabilidade prática destes cursos e questiona como seriam realizadas estas formações, se de forma remota ou presencialmente. “Até poderiam funcionar nos grandes centros, mas no interior é mais difícil pois garantidamente que não haveria grande disponibilidade de formadores, já que prevejo, à semelhança do que é habitual no nosso País, algo muito formal, complicado, rígido e com imensa dificuldade de aplicação”, defende, destacando as especificidades da zona do País onde trabalha e vive. Ainda assim, concorda com a ideia de que os tutores devem ter formação. “Mas deve ser algo prático, de âmbito alargado. Nada de dar passos em falso e exigir o que não é exequível, como aconteceu com a obrigação de treino e sociabilização de cães, sem que houvesse treinadores credenciados e a oferta necessária pelo País.”

Adotar um manual de boas práticas e responsabilidades para entregar aos tutores “que implicaria a assinatura de uma declaração de compromisso acerca do conhecimento das boas práticas na detenção de animais de companhia” poderia ser uma boa medida além da importante e efetiva “fiscalização no sentido da aplicação das leis em vigor e penalização dos prevaricadores”, acrescenta o médico veterinário municipal de Boticas.

Também Paula Martins considera que só através da educação e da formação a vários níveis, em especial dos mais novos, será possível mudar mentalidades e comportamentos. No Gabinete de Saúde Pública, Segurança Alimentar e Médico Veterinário da Câmara Municipal de Sintra, são realizadas campanhas de educação e sensibilização junto das escolas do município, em lares e centros de dia.

Pedro Paiva corrobora a opinião da colega e adianta que a Provedoria dos Animais de Lisboa tem a ambição de conseguir incrementar um programa continuado em algumas escolas-piloto, entre 2024 e 2025, através de uma iniciativa continuada que incluísse alguns conteúdos programáticos que possam ser trabalhados durante todo o ano contrariando alguns projetos pontuais.

“Já temos um enquadramento legal suficiente para assegurar a qualidade no bem-estar animal, mas ainda alguma inexperiência na aplicação da própria lei e no método em si, desde a fiscalização à sentença final” – Nuno Paixão

Atualmente, tanto as associações como os CRO já tentam incrementar o que o provedor intitula de “perfect match”, ou seja, através de alguns procedimentos, o objetivo passa por combater a adoção impulsiva e momentânea associada a eventos, como os aniversários e o Natal, por exemplo. “Claro que a educação e a pedagogia são essenciais em todas as áreas e no que diz respeito aos processos de integração dos animais – num contexto de adoção, mas também de compra – ou seja, seria preponderante implementar mecanismos uniformizados que dessem esta resposta, no sentido de formar as pessoas e os detentores que querem adotar os animais, numa primeira abordagem”, defende Pedro Paiva. A solução futura poderá passar por formar as famílias no sentido de perceberem as verdadeiras necessidades dos animais enquanto integrados no seio familiar. “As iniciativas em contexto escolar são também muito importantes porque ao apostarmos no público específico – de crianças e jovens – que são ótimos veículos de informação e conseguem, eles próprios, capitalizar a mudança nos pais”, acrescenta.

No município de Sintra, além das campanhas de educação e sensibilização junto da comunidade, são intentados todos os esforços no sentido de conseguir adoções responsáveis que beneficiem tanto os animais como os seus detentores.Mantemos um contacto pós adoção com o detentor, no sentido de acompanhar o período inicial da adoção, pois trata-se do período mais complexo na adaptação do animal, do detentor e família, à nova realidade”, refere Paula Martins. Recentemente, uma nova parceria com treinadores acreditados “veio acrescentar novas possibilidades na reabilitação animal e na melhoria das condições das adoções”.

O impacto do aumento do custo de vida

Nestes tempos de incerteza, os animais de companhia podem desempenhar um papel relevante no equilíbrio de muitas famílias, como aconteceu, aliás, durante a pandemia. “Entre nós, e apesar da Casa dos Animais de Lisboa deter uma taxa de adoção alta, o número de adoções no ano transato sofreu um ligeiro abrandamento (cerca de 5%). Temos sentido que as pessoas estão mais apreensivas, fruto da atual situação económica e social”, explica Sofia Baptista.

A título de exemplo, a alimentação, especialmente as rações de qualidade, são responsáveis pela maior fatia nos custos da manutenção dos animais, mais de 80%. “Nos concelhos rurais não é ainda tão evidente pois ainda há muitos detentores que alimentam os seus animais com comida caseira, tal como na população com menos recursos económicos”, sinaliza João Paulo Costa. Ainda assim, nos concelhos do interior, o médico veterinário municipal tem denotado uma maior procura por rações baratas, de menor qualidade, o que se irá refletir na saúde dos animais a prazo.

“Os alimentos para animais deveriam ser taxados com a taxa mínima de IVA, tal como os serviços veterinários deveriam ser isentos do mesmo imposto, em linha com as restantes profissões ligadas à saúde”, sugere.

Ao contrário de outros locais onde a taxa de abandono possa aumentar devido aos motivos apontados, no município de Boticas, o médico veterinário tem notado uma maior redução na procura de cuidados médicos prestados aos animais, fruto da menor disponibilidade financeira sobretudo no que diz respeito às despesas com a profilaxia. Mas, no que respeita ao abandono pelos habitantes locais, não nota essa tendência. “Os animais errantes são muito mais o fruto de animais que lá são deixados ou perdidos na caça, os quais se reproduzem e exponenciam o problema.”

“Só mudando mentalidades no respeito ao bem-estar animal poderemos alterar o flagelo do abandono” – Paula Martins

No que respeita a taxas de adoção, em Boticas, denota-se uma enorme redução, o que leva a uma rotação muito pequena e a um período de permanência de canil muito prolongado. “Nos grandes centros é muito mais fácil promover as adoções. O envelhecimento dos animais reduz ainda mais as taxas de adoção. O cerne do problema continua a estar no enorme número de animais não identificados.” João Paulo Costa confessa que é ainda habitual “recolher animais sem microchip ou sem microchip registado”.

A realidade em Lisboa e noutros municípios é completamente diferente. Cada um tem a sua própria estrutura, realidade e contextos a nível nacional. No entanto, Pedro Paiva refere uma realidade tridimensional que ajuda a explicar os fatores que levam ao aumento do número de animais abandonados em Portugal, o que tem acontecido potencialmente desde 2020. “Em primeiro lugar, atravessámos a pandemia de 2019, o que fez aumentar o número de adoções, mas com o retomar da normalidade, cresceu o abandono dos animais de companhia especialmente nas grandes cidades.” O Provedor dos Animais de Lisboa destaca ainda a morte de muitos idosos durante o período pandémico e o facto de as suas famílias não terem condições para assumir a adoção e a integração dos animais. “Por último, o terceiro vetor tridimensional tem que ver com o aumento de desemprego por altura da pandemia e com a inflação, houve perda de poder de compra, o que aumentou o número de animais abandonados.”

Em Sintra, Paula Martins confirma que “infelizmente, já houve situações de despejos, motivados pela conjuntura atual, que envolveram famílias com animais”. Com a inflação e o aumento generalizado de preços, o impacto na vida familiar dos portugueses é notório “e os animais são, muitas vezes, os primeiros a sofrer a privação em termos das suas necessidades de saúde, alimentação e bem-estar, podendo chegar ao extremo do abandono”, salienta.

Pedro Paiva refere que o crime de abandono animal tem aumentado mais nas grandes cidades do País, com uma maior taxa, nomeadamente, em Lisboa, no Porto, em Leiria e em Setúbal retirando esta conclusão a partir de um estudo que foi realizado através da audição a representantes de associações de animais e “que veio demonstrar que as famílias começaram a retomar aos seus trabalhos de forma presencial e, em simultâneo, os animais passaram a ser devolvidos”.

Há que travar a adoção / compra de um animal por impulso. “A maior parte dos CROA já não permite que uma pessoa adote um animal de imediato para que haja sempre um período de reflexão”, explica Nuno Paixão.

Nestes tempos conturbados que vivemos, de muita incerteza, os animais desempenham um papel de equilíbrio nas suas famílias. “Entre nós e, apesar da Casa dos Animais de Lisboa deter uma taxa de adoção alta, o número de adoções no ano transato sofreu um ligeiro abrandamento (cerca de 5%). Temos sentido que as pessoas estão mais apreensivas, fruto da atual situação económica e social”, explica Sofia Baptista.

Mas, o problema vai além do abandono, refere João Paulo Costa, uma vez que “muitos detentores não cuidam adequadamente dos seus animais”. O médico veterinário municipal acha que é preciso mudar mentalidades e esclarecer a opinião pública “sobre a detenção irresponsável de animais, sobre as consequências da reprodução não controlada, sobre os riscos para a saúde animal e saúde publica, para a segurança de animais, pessoas e bens que a imensa quantidade de animais errantes existentes acarreta”. Além da formação nas escolas, considera que a divulgação nos media, nos canais públicos, com a colaboração de figuras públicas ou mesmo inserir esta temática em programas de grande audiência, como novelas, etc. seria importante para chegar a um maior número de pessoas.

Mecanismos para melhorar a situação

“Eu não acho que as nossas leis sejam más ou insuficientes. O que existe é uma dificuldade na aplicação da lei. Já temos um enquadramento legal suficiente para assegurar a qualidade no bem-estar animal, mas ainda alguma inexperiência na aplicação da própria lei e no método em si, desde a fiscalização à sentença final”, refere Nuno Paixão. A título de exemplo, o método de investigação criminal implica que se gaste muito dinheiro em exames forenses e em procedimentos de investigação.

Apesar de estar esperançado com os resultados do trabalho da Conservação da Natureza e das Florestas (INCF), o provedor dos Animais de Almada gostaria de assistir à criação de uma Direção Geral do Bem-Estar Animal. “Os animais de pecuária continuam a ter uma proteção menor do ponto de vista do bem-estar”, destaca.

As autoridades policiais poderão desempenhar um papel relevante na prevalência da responsabilização, se for possível aumentando a incidência da fiscalização aos detentores”Sofia Baptista

E no que respeita ao cheque veterinário, será uma medida eficaz que pretende dar uma maior continuidade na prestação de cuidados aos animais em risco identificados nos municípios? Pedro Paiva concorda, ainda que considere que a problemática é que o sucesso desta medida está na mão de terceiros, ou seja, se os municípios não aderirem, não há possibilidade de ser dada esta resposta. “Portugal tem 308 municípios e, até ao momento, não chegam a trinta aqueles a que aderiram a esta medida que pode ser muito eficaz e fazer a diferença”, explica Pedro Paiva. O Provedor critica o facto de existirem municípios que ainda não têm um Pelouro do Bem-Estar Animal nem um CROA.

Existe uma clara sobrelotação dos CROA em Portugal. “Diariamente somos confrontados com situações e pedidos aos quais tentamos dar resposta e encontrar soluções, também com o apoio das associações zoófilas com as quais temos parcerias e que nos dão uma ajuda preciosa”, explica Paula Martins.

João Paulo Costa começaria por promover uma fiscalização mais apertada dos animais para verificação da sua identificação eletrónica e respetivo registo no SIAC, com efetivas penalizações para os prevaricadores. Além da “formação obrigatória dos tutores e a implementação de restrições à detenção de animais”, o veterinário defende ainda “a criação de taxas especificas para animais vendidos, incentivando a adoção de animais, a redução do IVA da alimentação animal e a isenção nos serviços veterinários”.

O flagelo da lotação dos CROA preocupa os profissionais do setor. “É bom não esquecermos que o problema de base neste momento é uma população de cerca de 50.000 animais errantes que se encontram nos CROA”, explica João Paulo Costa. E refere ainda mais números que nos devem fazer refletir: “Sabemos que se verificam cerca de 20.000 adoções por ano, enquanto são abandonados/nascidos sem controlo à volta de 35.000, no mesmo espaço de tempo. Assim, é muito difícil lidar com este flagelo que cresce continuamente.” Na mesma medida em que as taxas de adoção diminuem, os animais vão envelhecendo nos centros de recolha e essa é mais uma condicionante da sua possibilidade de adoção. “Alguns destes animais vivem em stresse permanente, como que condenados a prisão perpétua”, defende.

O crescimento da sociedade tem sido mais rápido do que aquilo que a lei impõe ou o legislador faz leis sem pensar na sua aplicação prática, acrescenta Nuno Paixão. “Os CROA, os abrigos e as associações continuam com sobrelotação. A minha missão é defender o bem-estar animal e também considero que não é ético tirar um animal da rua e condená-lo a uma ‘prisão perpétua’ pois esta solução não se coaduna com o interesse do seu bem-estar”, refere.

A estratégia a implementar deverá ser sempre como “um todo” e não enquanto medidas avulsas, consideram os médicos veterinários ouvidos para esta reportagem. “Julgamos ainda fundamental implementar a política de gestão de animais errantes (INCF) a nível nacional, aprofundar as ações de educação das novas gerações e de sensibilização da população em geral, promovendo ativamente as decisões de adoção responsável”, explica Sofia Baptista.

Muito melhorou, mas muito há a melhorar. Com a certeza, porém, de que não pode haver qualquer tolerância para os maus-tratos animais.

Investimento em esterilização

“Considerando os anos de atraso do nosso País relativamente a países onde esta prática já se encontrava generalizada e oficialmente instituída há muitos mais anos do que em Portugal, considero que tem sido feito um trabalho notável, face ao panorama económico do nosso País, relativamente a economias com mais recursos económicos do que a nossa”, defende Sofia Baptista. Mas, sublinha, “este investimento não é ainda o satisfatório”.

No que respeita ao município de Sintra, Paula Martins confirma que o investimento em esterilização “é muito grande”. Diariamente, de 2ª a 6ª feira, são realizadas no CROA, esterilizações de canídeos e felídeos, desde animais errantes recolhidos pelo CROA e gatos de colónias CED, até animais de famílias carenciadas, através do programa “Animallife”. O município de Sintra “investe também no Programa Municipal de Esterilização em parceria com clínicas e hospitais veterinários privados do concelho, permitindo o apoio da esterilização de animais dos munícipes”, explica. O município pretende ainda reforçar a educação e a formação da comunidade. “Só mudando mentalidades no respeito ao bem-estar animal poderemos alterar o flagelo do abandono”, adianta.

Do ponto de vista social só há benefícios para a esterilização. “Nós estamos constantemente a recolher ninhadas nas ruas de felinos que deveriam ter sido esterilizados porque a irresponsabilidade das pessoas é que conduziu ao nascimento destes animais”, explica Nuno Paixão. O médico veterinário tem dúvidas se o investimento tenha sido suficiente ou se “o dinheiro terá sido mal aplicado”. E critica os detentores que deixaram as suas gatas engravidar por não as terem esterilizado. “A partir do momento em que fosse obrigatória a identificação eletrónica compulsiva no meio da rua, passaria a responsabilizar-se o detentor”. Do ponto de vista de justiça social, considera que “quem tem dinheiro deveria pagar a esterilização completa e quem não tem ficaria isento desse pagamento, mas neste momento, tal é a urgência, que a esterilização deveria ser compulsiva. O Estado deve contribuir para que tal aconteça.”, salienta Nuno Paixão.

João Paulo Costa defende “a obrigatoriedade de esterilização dos animais, em situações a determinar, salvo o caso dos criadores, caçadores, cães de rebanho, entre outros exemplos idênticos, caso necessário, face a uma comprovada ineficácia de outras medidas”, ainda que considere que possa também ser algo muito restritivo e imperativo.

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