Escrevo enquanto viajo de volta ao Reino Unido (RU) para mais uma temporada a trabalhar. Claro que o Brexit é assunto incontornável para todos os Colegas que trabalham ou consideram trabalhar no RU. Nesta questão, tal como em tantas outras relativas ao Brexit, a única certeza é a incerteza.
Muitos Colegas saberão que, além de trabalhar no RU como médico veterinário (MV), colaboro com a maior empresa do sector, a Vets4Pets, no sentido de ajudar a recrutar veterinários em Portugal. Em conversas anteriores com responsáveis da empresa fiquei a saber que já existiam planos de contingência para o Brexit. A Vets4Pets opera quase 400 CAMV de vários tipos, na maioria de 1ª opinião, mas incluindo um número crescente de centros de referência e hospitais. Conseguir manter um recrutamento a par do seu crescimento tem sido uma dificuldade da empresa e para isso tem contado com uma contribuição significativa de MVs estrangeiros, nomeadamente os provenientes da União Europeia (UE).
Não será então de estranhar a preocupação da empresa face ao Brexit. Certamente, as restantes corporates também partilham a preocupação, assim como as empresas mais pequenas e as independentes. Face ao crescimento do sector e a uma regulação apertada da oferta do ensino, o sector veterinário no RU tem-se mantido muito dependente da contínua chegada de MVs estrangeiros. No dia em que se conheceram os resultados, as entidades mais importantes do sector no RU (RCVS, BVA, BSAVA, NOAH) emitiram declarações referindo que estão cientes do possível impacto do Brexit no sector, mas que vão aguardar a evolução da situação para delinearem ou aplicarem planos de contingência.
Situação dos MVs já a trabalhar no RU
A única certeza é a incerteza. Mas neste caso, quase todos acreditam que nada mudará para estes profissionais. O sector colapsaria sem os MVs da UE actualmente a trabalhar no RU. Poderá acontecer que os mesmos tenham de formalizar a sua presença no país, com um visto de residência, por exemplo. Aliás, aqui aplica-se o que alguns responsáveis pelo corpo consular já recomendaram: os cidadãos portugueses no RU devem requisitar esse tipo de visto ou mesmo dupla nacionalidade, se elegíveis.
Impacto sobre MVs que queiram começar a trabalhar no RU durante o período de transição
A única certeza é a incerteza. Este será provavelmente um período importante para quem considera vir a trabalhar no RU no futuro. Nesta fase, efetivamente o RU continua a pertencer à UE e, por isso, as regras devem manter-se inalteradas até uma saída formal. O que quer isto dizer? Que, por exemplo, continua a haver reconhecimento de cursos automaticamente, que o RCVS continua a aceitar inscrições nos mesmos moldes que atualmente, que podemos pedir o NINO (número de Segurança Nacional), encontrar emprego e ser tributado.
Dadas as incertezas, espera-se que muitos MVs da UE aproveitem este período para se registar no RCVS. No entanto, visto que não se sabe como o RU procederá relativamente a novos imigrantes, o registo no RCVS poderá não garantir a possibilidade automática de trabalho, uma vez completada a saída da UE. Acredita-se mesmo que muitos MVs poderão acabar por se decidir a emigrar neste período, de modo a diminuir as incertezas.
O que passará depois da saída efetiva?
Pois, incerteza… Muitos acreditam que muita coisa se manterá inalterada. Provavelmente, o RCVS continuará a manter a acreditação dos cursos dos países da UE e possivelmente manterá um processo facilitado de registo. Pode acontecer a inclusão da necessidade de provar um nível suficiente de inglês para esse registo, por exemplo.
A maior incerteza, porém, advém dos trâmites expectáveis para se poder trabalhar. Mesmo aqui se espera que a relação do RU com a UE permita desenvolver um processo facilitado para cidadãos da UE mas uma das grandes questões do referendo foi exactamente a imigração…
Viver na incerteza
Tanto os stakeholders do sector veterinário no UK, como os MVs da UE que consideram trabalhar no RU aguardam os desenvolvimentos dos próximos tempos. Planos de contingência foram delineados e decisões individuais podem ser tomadas com base nos recentes e futuros acontecimentos. O sector veterinário no RU é um dos mais desenvolvidos do mundo, apresentando oportunidades de carreira únicas tanto a nível técnico-científico, como em termos salariais, progressão de carreira e empreendedorismo.
As empresas britânicas deste sector, crescentemente dependentes de mão-de-obra qualificada estrangeira, aguardam ansiosamente o que esta fase de transição trará. A Vets4Pets mantém os planos de crescimento dinâmico (abertura de novos CAMVs e aquisição de centros de referência) e continuará a necessitar de MVs estrangeiros, proporcionando aquilo que se pode classificar como um ambiente de trabalho standard no RU. Vem sendo considerada no top britânico das melhores empresas para se trabalhar nos últimos anos. A empresa já apostara, com a minha ajuda, no recrutamento de MVs portugueses e certamente continuará a fazê-lo, em especial depois do Brexit e neste período de transição.
Quanto às incertezas, ninguém pode garantir nada neste momento. Certamente que se seguirão tempos interessantes, mesmo se confusos.