Quantcast
Entrevista

Sabe quem é a veterinária portuguesa que deu cartas no Congresso Europeu da ECVIM-CA?

joana oliveira

É médica veterinária, professora e investigadora. Estivemos à conversa com Joana Tavares de Oliveira, a única palestrante portuguesa que marcou presença no Congresso Europeu da European College of Veterinary Internal Medicine – Companion Animals, que se realizou na Suécia entre 8 e 10 de setembro.

Como surgiu o convite para ser palestrante no European College of Veterinary Internal Medicine – Companion Animals?

O convite para ser palestrante no congresso do ECVIM-CA surgiu do interesse suscitado no comité da European Society of Veterinary Nephrology and Urology (ESVNU) por uma das minhas últimas publicações, um artigo de revisão científica sobre a terapêutica da Bladder Pain Syndrome/Interstitial Cystitis (BPS/IC), anteriormente denominada Cistite Instersticial, um trabalho realizado em co-autoria com o Prof. Buffington do College of Veterinary Medicine da Ohio State University e o Prof. Paulo Dinis da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

Qual o tema da sua palestra?

A palestra incidiu sobretudo na abordagem diagnóstica e classificação clínica que são realizadas em Medicina Humana para a Cistite Intersticial, no sentido desta poder servir de base a um plano de diagnóstico mais aprofundado, a ser realizado pelos Especialistas aos quais os Médicos Veterinários Generalistas referem casos.

Esta instrução é necessária dado que a falta de conhecimento sobre a etiologia da doença em gatos resulta numa inadequada abordagem, sendo que também não há níveis de evidência ou graus de recomendação das terapias usadas em Medicina Felina.

Quais as principais conclusões que apresentou?

As conclusões estão relacionadas com a necessidade de excluir completamente doenças com sinais do trato urinário inferior muito semelhantes, mas que em nada se relacionam com a Cistite Intersticial, tais como a cistite bacteriana para a qual uma urocultura é sempre necessária, a urolitíase e outras perturbações não só urológicas, mas também do foro reprodutivo, sistema nervoso periférico e aspetos miofasciais.

Concluí também dizendo que a classificação esquematizada e standardizada, proposta pela European Society for the Study of Interstitial Cystitis (ESSIC), através de cistoscopia com hidrodistensão e biópsia é fundamental para se prosseguir para um algoritmo de maneio da doença e que, embora com este conhecimento não exista uma cura definitiva, tanto o médico, como o paciente têm que estar cientes de que poderão chegar a um controlo dos sintomas. Esta é a perspetiva realista que tem que ser tida em conta.

Quais as reações à sua palestra?

A audiência, constituída por Internistas Veterinários com especial interesse em Nefrologia e Urologia, ficou extremamente empolgada com a possibilidade de transpor o conhecimento clínico da Medicina Humana para a Medicina Veterinária, ao invés do habitual uso unidirecional do animal como modelo de doença.

Entre outros, o Presidente da ESVNU questionou-me em particular sobre a opinião relativamente a realizar em gatos uma prova diagnóstica com doxiciclina após resultados de uroculturas normais e especiais negativos, conforme mencionei ser realizado em senhoras com Cistite Intersticial. Respondi afirmativamente, que concordava que fosse instituída.

Era a única palestrante portuguesa?

Sim. Infelizmente até agora temos poucos especialistas diplomados pelo Colégio de Medicina Interna. Este evento é profundamente virado para a formação contínua dos membros do Colégio, assim torna ainda mais gratificante poder estar presente como oradora num evento deste nível científico no seio da minha própria classe.

É frequente fazer este tipo de palestras no estrangeiro?

É algo frequente realizar palestras no estrangeiro, particularmente na área da inflamação crónica e Oncologia, que têm vindo a ser o foco da minha investigação. Até hoje posso dizer que em apenas um outro encontro em que falei, em Harvard, me tinha sentido tão entusiasmada e esperançosa relativamente ao futuro de uma Medicina Veterinária em que os clínicos não só se envolvem e participam, mas também lideram equipas de investigação contribuindo para um progresso cada vez mais rápido a nível da Investigação Translacional e Comparada.

Em Portugal, no dia-a-dia, em que consiste o seu trabalho?

O meu dia-a-dia, as minhas semanas aliás, dividem-se entre Lisboa, onde sou Professora, regente de Medicina de Animais de Companhia, Clínica Oncológica e Atividades Hospitalares na Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, e o Porto onde realizo investigação no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S), um consórcio que reuniu os três grandes laboratórios de investigação, IPATIMUP, IBMC e INEB à Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, com o objetivo de mais rapidamente transformar a investigação básica em inovação clínica. E finalmente assumo as funções de Consultora e Diretora Médica nos Centros de Atendimento Médico Veterinários do grupo PetVet, que fundei e onde tento agora transmitir o conhecimento e exigência à prática clínica diária.

No site do ESVNU, no link para a sua apresentação destacam que participou em dois capítulos de livros e tem 20 peer-reviewed papers. Pode falar um pouco sobre o seu percurso?

O espírito crítico e a vontade de saber mais foram os grandes motores que me levaram a seguir a carreira académica, tendo-me doutorado relativamente cedo, aos 27 anos conforme planeei. O que não planeei foi o imenso gozo que tiraria da investigação científica, a qual continuei, nem da atividade docente, que logo comecei como voluntária tendo depois sido convidada a ser Professora Afiliada no ICBAS-UP, afiliação esta que, em conjunto com aquela que sempre mantive com o IPATIMUP – agora integrado no i3S – me permitiram construir uma carreira sólida num ambiente estimulante e enriquecedor.

Quais os seus objetivos a curto prazo?

Como investigadora não são diferentes daqueles dos meus colegas: fazer mais e melhores projetos, orientar de perto os meus alunos de Mestrado e Doutoramento de modo a que possam eles próprios seguir o caminho do rigor científico. E como clínica ajudar a transpor e a realizar esta ponte entre a Saúde dos Animais de Companhia e a Saúde Humana, tanto dentro, como fora de portas. Neste âmbito surge um novo projeto de Consultadoria em que pretendo disponibilizar e implementar procedimentos e protocolos em Medicina de Animais de Companhia à semelhança do que é prática clínica comum em Medicina Humana.

 

Este site oferece conteúdo especializado. É profissional de saúde animal?