A propósito do Animal Health Investment Europe, evento que pretende ligar os grandes players da indústria de saúde animal com empreendedores nesta área, Calan Smith, diretor de portefólio de saúde animal da Kisaco Research, organizadora do evento, esteve à conversa com Jean-Luc Michel, diretor global de marketing estratégico da farmacêutica Boehringer Ingelheim. Uma entrevista para perceber as tendências da indústria no setor dos animais de companhia e o futuro da saúde animal.
Quais é que pensa ser as mais importantes tendências do setor de animais de companhia por regiões (Europa/EUA/resto do mundo)?
O setor de animais de companhia continua a crescer mundialmente pelo impulso da importância do papel do animal de estimação na família. Este laço reforçado entre humano-animal fez com que a maioria dos detentores de pets os veja como parte da família. Por sua vez, isto leva a que tanto veterinários como detentores procurem melhorar a longevidade e, mais importante, a qualidade de vida dos seus animais. As melhorias nos cuidados de saúde animal resultaram numa população animal mais envelhecida – as mudanças trazidas pela idade associadas à saúde das articulações, obesidade, oncologia e doenças cardíacas são agora comummente observadas pelos médicos veterinários. A tecnologia em desenvolvimento vai permitir fazer um diagnóstico mais cedo, intervir mais cedo e monitorizar a progressão das doenças, permitindo aos detentores um acesso otimizado a cuidados de saúde para os seus animais.
O acesso a múltiplas fontes está a revolucionar a forma como as pessoas obtém informação sobre a saúde e bem-estar dos seus animais. Apesar de o seu veterinário continuar a ser uma fonte importante de informação, outras, como a Internet e as redes sociais, têm agora um papel significativo de influência sobre os comportamentos e atitudes dos detentores. Tal é particularmente evidente nos millennials, que em grande parte procuram informação e compram bens num ambiente digital, o que mudou radicalmente o panorama no qual trabalhamos.
Apesar de estas serem tendências globais, há algumas diferenças regionais significativas na forma como a prática veterinária está a evoluir. Uma tendência importante, que começou nos EUA mas que agora se verifica na Europa e em certas regiões da Ásia, é a corporativização das clínicas veterinárias. À medida que as empresas centralizam a tomada de decisões sobre os cuidados de saúde nas clínicas do seu grupo, as dinâmicas de compra mudam. Uma única decisão pode agora afetar uma parte significativa do nosso negócio.
Como é que a forma como comunicam com os detentores de animais de companhia / produção mudou ao longo dos anos e como é que vê a vossa relação com estes detentores a evoluir no futuro?
Há 20 anos, por exemplo, o modelo de comunicação para os parasiticidas de animais de estimação era muito simples. O nosso trabalho era trazer produtos para o mercado que respondessem às necessidades dos veterinários e donos, ganhar o apoio dos veterinários na recomendação destes produtos e depois alavancar este apoio com os detentores para gerar procura. Apesar de os dois primeiros elementos deste modelo continuarem relevantes e importantes, a forma como impulsionamos a procura começou a mudar. Ao olharmos para o futuro, será crucial perceber onde é que os consumidores querem obter informação e estar preparados para informá-los e influenciá-los ao longo desse caminho.
Mais importante, também temos de os capacitar a fazer decisões de compra e agir com base nelas.
A tecnologia permitiu-nos criar uma mensagem mais personalizada, alcançando os donos certos, com a mensagem certa, na altura certa. Os detentores de animais, enquanto consumidores, esperam que as marcas saibam quais são as suas necessidades e critérios, e as empresas que compreenderem o consumidor podem então fornecer soluções apropriadas e desejadas. Compreender como construir apoios para os nossos produtos nas comunidades online, profissionais e de detentores será uma das chaves para o sucesso. Tal vai exigir a provisão de informação atraente e de valor para os nossos consumidores que lhes permita compreender o papel fundamental que as nossas marcas têm nas vidas dos seus animais.
Dados sugerem que os detentores de animais têm relutância em sair de casa para visitar uma clínica veterinária e que preferem fazer as suas decisões e compras online. Como é que isto afeta a vossa estratégia?
Os detentores de animais têm de ser ensinados que os cuidados de saúde apropriados para os seus animais devem sempre incluir o veterinário, mas as nossas estratégias devem ter em conta as necessidades dos donos. Precisamos de entender quando e como é que querem aprender, considerar e comprar as nossas marcas. A nossa estratégia foca-se em manter a recomendação do veterinário como fulcral, mas considera as novas formas através das quais esta recomendação pode ser realizada. A nova tecnologia implica que a ligação do animal ao veterinário já não tenha de envolver a clínica e, ao facilitar essa conexão virtual, bem como as mais convencionais, iremos continuar a mostrar o nosso compromisso em colaborar com os veterinários enquanto reconhecemos as necessidades em mudança do dono.
Qual é a sua opinião sobre a consolidação em curso e corporativização das clínicas de animais de companhia?
Esta tendência vai continuar à medida que as entidades procuram investir numa área em expansão. A expansão além das clínicas veterinárias para o ramo do diagnóstico, distribuição e alimentação animal, como vimos com empresas como a Mars, vai consolidar toda a indústria de pet care, e não só na área da saúde animal. Para nós, enquanto empresa de saúde animal, isto vai influenciar significativamente a forma como nos relacionamos com estas entidades em mudança. É cada vez mais importante desenvolver parcerias sólidas com estes grupos aos quais podemos fornecer soluções médicas ao longo da vida para prevenir ou gerir doenças e prolongar a vida dos animais. Isto alinha-se bem com a nossa estratégia de fornecer as melhores soluções para responder e exceder as expectativas dos detentores. O nosso objetivo continua a ser que as nossas marcas proporcionem uma mais-valia significativa para as clínicas, para os veterinários, para os seus clientes e para os animais dos seus clientes, independentemente da sua estrutura corporativa.
Até que ponto é que a tecnologia “usável” (wearables) e a monitorização da atividade dos animais de companhia / produção faz parte do vosso foco?
A tecnologia usável continua a ser de interesse estratégico, especialmente se puder ligar o dono ao veterinário e / ou se puder ajudar a atingir melhores cuidados para o animal. Um fator-chave será alavancar a tecnologia para criar mais valor para o nosso portefólio de produtos como parte de uma gestão de saúde e bem-estar integrada para os nossos clientes.
A tecnologia wearable e a monitorização estão a tornar-se mainstream, e isto pode dar-nos a oportunidade de criar mais soluções integradas que proporcionam experiências de marca mais compensadoras para os consumidores, o que é ainda mais importante hoje para garantir a diferenciação.
Quais são atualmente as necessidades ainda não respondidas no setor dos animais de companhia?
Para nós, responder às necessidades ainda não abordadas passa por identificar e fornecer soluções terapêuticas ou preventivas em novas doenças ou introduzir métodos novos e revolucionários que melhorem os atuais padrões de cuidados.
O diagnóstico e intervenção precoces continuam a ser uma oportunidade desperdiçada em muitas doenças e identificá-las cedo, através de soluções de monitorização fáceis e eficazes, levaria a cuidados otimizados ao longo da vida. Os gatos continuam a ser um desafio significativo e uma oportunidade. Apesar de os gatos serem extremamente populares em muitos países, apenas uma porção recebe cuidados veterinários consistentes.