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Congresso ESVONC

“O paradigma do cancro significar uma ‘sentença de morte’ está a mudar”

Felisbina Queiroga
O Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia Veterinária (ESVONC) decorreu este ano na cidade de Las Palmas, ilha Gran Canária, e reuniu especialistas em Oncologia não só da Europa, como do mundo. Felisbina Queiroga, professora da UTAD, marcou presença e faz um resumo dos principais momentos do evento.

Primeiro dia – tumores mamários da cadela

“Neste congresso foram discutidos temas de grande importância e atualidade para a oncologia veterinária e para a oncologia humana. No primeiro dia, as sessões foram dedicadas aos tumores mamários da cadela, com especial destaque para o impacto que o estudo destes tumores pode ter na evolução da medicina humana, no âmbito da investigação de domínio translacional. São inúmeros os investigadores, entre os quais a nossa equipe de investigação, que defendem o estudo dos tumores espontâneos dos animais, como modelos para o estudo dos tumores de humanos”.

 

“Ainda recentemente, a nossa equipa publicou num jornal científico de medicina humana – Seminars in Oncology 2017 Aug;44(4):288-300 – um artigo onde apresentamos as semelhanças clínicas e moleculares dos carcinomas inflamatórios de mama entre a cadela e a mulher e que desde já convido todos os colegas a ler”.

Segundo dia – Cuidados paliativos

 

“No segundo dia, a manhã foi dedicada aos cuidados paliativos em oncologia. No final, durante a mesa redonda, um dos temas com maior destaque foi a questão do Burnout na profissão médico-veterinária. Infelizmente pudemos constatar que este problema é transversal na sociedade, não respeitando fronteiras. Assistimos a relatos, alguns bastante comoventes, de colegas de diferentes países. Temos na realidade uma profissão muito desgastante a nível físico e psicológico”.

Terceiro dia – Oncologia internvencionista

 

“O terceiro e último dia foi marcado pelo tema da Oncologia intervencionista, do inglês “Interventional Oncology”, onde foram apresentadas novas modalidades terapêuticas em medicina humana e analisadas as possibilidades de, num futuro próximo, virem a ser aplicadas em medicina veterinária. Na minha opinião estes foram os aspetos mais relevantes, no entanto todo o congresso esteve pleno de conferências de elevado nível, quer nas conferências plenárias, quer nas sessões de comunicações livres e posters”.

Em relação à participação de Felisbina Queiroga no congresso “apresentei dois trabalhos do nosso grupo de investigação, um deles realizado em colaboração com o Moores UCSD Cancer Center, dos EUA, intitulado ‘Identification of the claudin-low subtype in canine mammary tumors’ e outro realizado em Portugal e intitulado ‘Assessment of the Interleukin 35 immunoexpression impact in malignant canine mammary tumors through a multivariate statistical survival analysis’. Participei ainda, em âmbito de pré-congresso, nas reuniões do “Cancer Board”, um grupo de trabalho promovido pela empresa farmacêutica Boehringer Ingelheim e composto por 12 especialistas de vários países, nove somos europeus (3 Espanha, 1 França, 1 Reino Unido, 1 Polonia, 1 Noruega, 1 Hungria, 1 Portugal), dois são dos EUA e um do Japão”.

 

Neste âmbito, Felisbina Queiroga participou como oradora na mesa redonda dedicada ao tema “O futuro da Oncologia”, onde se pretendeu desenvolver uma análise estratégica com vista à realização futura de ações de âmbito clínico e de investigação.

E quais as principais novidades no campo da oncologia veterinária?

“Destaco o desenvolvimento da imunoterapia, pois acredito que em breve iremos ter muitas novidades a este respeito. Existem já várias empresas que estão a desenvolver novos medicamentos neste campo e, na minha opinião, é uma das áreas que irá sofrer maior desenvolvimento na próxima década. Neste sentido, a nossa equipa de investigação tem vindo a desenvolver vários trabalhos relacionados com o infiltrado inflamatório presente no estroma dos tumores de mama. Constatámos, e já se encontra publicado, que existe relação entre a quantidade de Macrófagos e Linfócitos presente no estroma do tumor e o prognóstico destas neoplasias, o que vem apoiar o desenvolvimento de vacinas anti-tumorais, tal como já foram desenvolvidas para o melanoma canino (a Oncept, vacina do melanoma é um bom exemplo)”.

Outro aspeto que Felisbina Queiroga considera relevante é “a importância que estamos a dar à qualidade de vida dos animais com cancro. O cancro, mesmo em estados avançados, pode ser tratado por forma a minorar os sintomas e a permitir uma boa qualidade de vida dos animais. Hoje dispomos de várias técnicas de tratamento. Para lá da cirurgia e quimioterapia convencionais, podemos contar com a eletroquimioterapia, quimioterapia metronómica, imunoterapia, os inibidores da tirosina quinase e, claro, os inibidores da Cox-2, que em combinação com outros tratamentos também constituem uma opção terapêutica”.

“Infelizmente no nosso país não dispomos de Radioterapia, o que seria realmente uma mais-valia. O paradigma do cancro significar uma “sentença de morte”, está a mudar. Hoje encaramos este diagnóstico como uma doença que queremos tornar crónica, também nos nossos animais, tal como tem vindo a acontecer em medicina humana”.

Nota: Fotografia retirada da Platforma DeGóis

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