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Hospital Veterinário das Laranjeiras: Há 15 anos a apostar num negócio de emoções

Hospital Veterinário de Telheiras Destaque Veterinária Atual
Com uma equipa de aproximadamente 20 profissionais, o Hospital Veterinário das Laranjeiras (HVL) é pioneiro em várias áreas de referência e tem como desafio constante “a consolidação da equipa, da dinâmica interna e da racionalização dos processos internos”. Desde procedimentos simples a tratamentos mais complexos, como hemodiálise ou quimioterapia, o hospital responde a várias necessidades com serviços personalizados e à medida dos clientes.

Luís Cruz e Ana Maldonado, ambos médicos veterinários, decidiram criar o projeto do HVL há 15 anos. Casados e pais de três filhos, assumem respetivamente as funções de diretor clínico e administradora responsável pela gestão do hospital. “No início, eu era o único médico veterinário e tinha um assistente. O nosso objetivo nunca foi ser uma estrutura grande, mas sim uma organização que servisse os nossos propósitos que passam por celebrar esta relação entre proprietários e os seus animais”, explica Luís Cruz.

O HVL assume-se como parceiro da relação com os clientes, do bem-estar e da saúde dos animais. “O médico veterinário é hoje um consultor a tudo o que diz respeito à área animal e tem de se ver a si próprio como essa fonte de respostas porque, se não formos nós a ceder essa informação, os clientes vão procura-las a qualquer outro sítio”. Luís Cruz tinha terminado o curso, participado num projeto no Porto e trabalhado na clínica de animais de companhia da Faculdade de Medicina Veterinária quando achou que seria o momento ideal para apostar na vertente empresarial. E assim foi criado o HVL nas instalações em que se mantém até hoje.

Com uma equipa composta por nove médicos veterinários a trabalhar a tempo inteiro, quatro a cinco médicos veterinários em regime de outsourcing para consultas esporádicas, um enfermeiro e nove auxiliares, o HVL é considerado “um hospital de referência ao nível da endoscopia, dos cuidados intensivos, da cirurgia, da medicina interna, crescendo a partir daí para outros serviços”, esclarece o diretor clínico. Atualmente, o hospital tem uma unidade “pioneira” de hemodiálise e relançou o interesse na diálise peritoneal em Portugal. “A dermatologia continua a ser uma área clássica de cuidados veterinários e há especialidades que representarão cada vez mais o presente, mas que representam novos desafios para o futuro: a cardiologia, a geriatria e a radiologia de intervenção”. O facto de os animais terem uma maior longevidade origina um maior número de casos de cancro, sendo que o HVL tem uma resposta ao nível de tratamento oncológico.

O Hospital aposta na formação e educação dos clientes através da valorização e diferenciação dos serviços. “Há que fornecer soluções personalizadas, customizadas, atentas ao detalhe e à medida de cada cliente. Quando recrutamos pessoas para trabalhar connosco e para integrarem a nossa equipa costumamos dizer que a condição essencial para trabalhar neste negócio é adorar pessoas, porque o facto de se gostar de tratar animais é um ponto assente e que não é discutível”, avança Luís Cruz. É neste aspeto que entra a fidelização dos clientes assente sobretudo na confiança. “Esta só surge da relação que se estabelece e que vai sendo criada ao longo dos tempos. Temos de ser leais com os nossos clientes, fornecer-lhes as informações de que necessitam e estabelecer uma relação de longo prazo com os mesmos. Este é um negócio emocional e tem de estar à altura desse desafio”, acrescenta.

Gerir o negócio durante a crise

Um dos aspetos mais referidos pelos entrevistados foi a chamada concorrência desleal, não só ao nível de preços mais baixos praticados por algumas clínicas médico-veterinárias, mas pela “fuga aos impostos”. Numa altura muito caracterizada pela concorrência low cost é importante “encontrar excelentes relações de qualidade/preço. Temos de fornecer valor para a aquisição de serviço que é feita por parte do cliente. Há clientes que, em determinada altura da vida, querem gastar pouco dinheiro, mas que nem por isso deixam de ser exigentes com os serviços que procuram. Esses clientes podem ter menos rendimentos, mas adoram os seus animais e temos obrigação de lhes fornecer uma solução e inclusive avaliar algum stresse por não terem possibilidade de oferecer uma solução ideal para o seu pet. Temos de ir ao encontro destas expetativas não havendo espaço para frustrações”, reforça Luís Cruz.

“Temos de ser leais com os nossos clientes, fornecer-lhes as informações de que necessitam e estabelecer uma relação de longo prazo com os mesmos. O nosso negócio é um negócio emocional e tem de estar à altura desse desafio” – Luís Cruz 

Todos os colaboradores do hospital têm contrato de trabalho, acesso a seguro e a medicina do trabalho, havendo uma grande preocupação para ter todos os aspetos legais. “É uma gestão difícil. Em certas alturas, cada passo que damos tem de ser muito bem pensado. Julgo que há espaço para todos desde que as pessoas trabalhem de forma honesta. Continuamos a achar que estamos no ramo certo e que é esta a melhor forma de trabalhar”, explica Ana Maldonado. Para o diretor clínico é preciso entender que uma consulta por 15€ por 15 minutos é o mesmo preço que uma consulta de 40€ por 30/45 minutos. “Não é uma solução e nem é low cost”, afirma. No HVL, tal como em outras estruturas com os mesmos objetivos, os custos fixos ”têm de ser altos, pois só assim se consegue manter equipamentos e técnicos de suporte de vida sofisticados e equipas rotinadas”.

Ainda assim, ambos consideram que a conjuntura económica trouxe aspetos positivos e muitas mudanças benéficas para os CAMV’s. “É certo que as pessoas começaram a automotivar-se de forma diferente”, sublinha a administradora. Também a relação custo-benefício começou a ser um aspeto central do negócio. “Os cuidados preventivos tornaram-se essenciais para dar melhor qualidade de vida aos animais de companhia. Há que educar as pessoas para entenderem a verdadeira importância dos cuidados veterinários”, acrescenta o diretor clínico. Luís Cruz acrescenta que o HVL teve o privilégio de atravessar todo o período de crise (desde 2008 até ao momento) “em crescimento”, ainda que a programação mensal do negócio passasse a ser menos previsível. “Depois de meses muito bons podem suceder meses irregulares. Há certa uma irregularidade na nossa atividade, que não acontecia antes deste período”.

Partilha de experiências

Um outro paradigma criado com a crise foi a necessidade de colocar os colegas a falar uns com os outros. “Temos o privilégio de aprender todos os dias com colegas de pequenas clínicas e de grandes centros veterinários que partilham as suas experiências. A ideia de não estarmos sós e de discutirmos os nossos problemas é muito importante. Gosto de pensar que temos a honra de ter um grupo de colegas veterinários amigos, a nível nacional, que representa uma autêntica força de elite nas várias áreas de Medicina Veterinária de animais de companhia. Nós valemos aquilo que vale a nossa rede”, defende. É por este motivo que o maior projeto do HVL é “a consolidação da equipa, da dinâmica interna e da racionalização dos processos internos. A partilha de experiências com colegas da área é fundamental pois estamos a falar de pessoas irrequietas, que não se acomodam e que, pelo facto de viverem fora do meio urbano, nos trazem problemas que, não sendo os nossos atualmente, poderão vir a ser no futuro. Este cruzamento de informação é essencial para o nosso trabalho”.

Luís Cruz chama ainda à atenção para uma maior “feminização da profissão”, ou seja, o facto de haver mais mulheres a trabalhar na área permitiu maior humanismo e segurança em referenciar. “As mulheres são menos dadas a se sentirem diminuídas e não têm problemas de ego em sugerir uma solução dada por um parceiro, solução essa que é complementar do seu próprio centro veterinário”. A referenciação surge assim, de forma natural, como uma extensão do seu próprio centro. “Também só se consegue isto com uma relação de confiança que, por vezes, demora anos a construir, mas que se estabelece em pequenos detalhes”, explica. O desafio diário do HVL passa por manter a equipa irrequieta e proactiva na procura de soluções que sirvam quer a sua ambição e realização profissional, mas ao mesmo tempo os objetivos da organização. “Cada um de nós pode ser uma empresa, mas todos temos de nos identificar com uma determinada cultura organizacional orientada para o cliente e para o seu animal. O cliente tem de sentir que pode contar connosco. Em última análise, ele sente que somos seus parceiros e não tanto fornecedores de serviços”, sustenta o diretor clínico.

Para o casal nem sempre é fácil separar a vida pessoal da profissional, mas é algo para o qual se disciplinam. “Ter três filhos, três gatos e um cão ajuda-nos facilmente a esquecer os problemas profissionais e a termos novas questões para resolver. Com inteligência, senso comum e bom humor achamos que não há desafios difíceis”, afirma Luís Cruz. Considera um verdadeiro privilégio ter a sorte de adorar o que faz. “Estar bem na profissão ajuda-nos a estar bem como pessoas”. Ana Maldonado acrescenta que tem de haver um grande esforço para conseguir “desligar” da parte profissional. As funções de ambos são distintas e foram divididas logo no começo do projeto. “Desde muito cedo começámos a dividir as responsabilidades, o que sempre facilitou bastante. Quando chegamos a casa, tem de haver uma grande disciplina para não permitirmos que os problemas profissionais interfiram no dia-a-dia familiar”, sublinha.

Hotel dos gatos e presença na internet

Há alguns anos, os proprietários do HVL quiseram deixar os seus gatos num hotel e verificaram que a oferta do mercado era praticamente inexistente ou pouco confortável e adequada. Foi assim que surgiu a ideia de integrarem um hotel para felinos nas instalações do próprio hospital. “Quisemos criar uma estrutura com as condições que consideraríamos essenciais para deixar os nossos gatos. No fundo, o hotel foi criado para resolver um problema nosso, mas que considerarmos ser uma lacuna no mercado”, afirma Luís Cruz. Na sua opinião é “obrigatório” para um profissional de Medicina Veterinária ter animais de companhia para perceber o outro lado e compreender “as fragilidades e as emoções dos clientes”. Ter animais de estimação permite-lhes tornarem-se “mais humildes e humanos”.

As novas tecnologias são também uma peça fundamental, quer do HVL, quer da loja que o integra (e que também tem uma componente online). “Temos o Facebook do hospital e outro para a loja. São páginas muito dinâmicas”, explica Ana Maldonado. O site do HVL permite o esclarecimento de dúvidas por parte dos clientes, além de dar a conhecer a equipa e os serviços do hospital. Os clientes podem também aceder a uma área de vídeos onde têm a possibilidade de aprender procedimentos que à partida parecem simples, mas que podem ser complexos para alguns proprietários de animais de companhia, como por exemplo cortar as unhas ao gato, escovar os dentes de um cão ou administrar um comprimido a um animal de companhia.

Luís Cruz e Ana Maldonado confessam que têm muitas ideias que gostariam de pôr em prática desde que houvesse “tempo e recursos para avançar”. Estão constantemente à procura de mais e novos desafios, de continuar a apostar na diferenciação e na relação de parceria com os clientes através de uma equipa motivada e de soluções personalizadas.

Um dos aspetos que mais preocupa Luís Cruz é a excessiva proliferação de profissionais em medicina veterinária. “Como vice-presidente da Ordem dos Médicos Veterinários lamento que haja uma certa irresponsabilidade por parte das universidades. Há uma pressão de procura enorme por veterinários que façam inspeção mas há cada vez menos pessoas interessadas em fazê-lo. O Estado tem interesse em pagar cada vez menos aos seus funcionários. É um trabalho de altíssima responsabilidade havendo, no entanto, necessidade de mais colegas dedicados a essa área”, fundamenta Luís Cruz. Na sua opinião, as universidades devem ser “penalizadas” mas isso só acontecerá “quando mudar a forma como são financiadas”. A licenciatura em Medicina Veterinária “é muito fashionable e tem um marketing muito próprio. Qualquer universidade de veterinária, independentemente da sua qualidade, vai ter sempre uma grande facilidade em preencher todas as vagas”, acrescenta.

Artigo publicado na edição de maio de 2015 da revista VETERINÁRIA ATUAL

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