É num ambiente familiar e de camaradagem que a Clínica Veterinária Patas da Linha tem vindo a conquistar clientes. Mais do que cuidados veterinários, o que ali se encontram são histórias partilhadas numa ligação emocional entre donos e animais. Afinal, este é um local em que se privilegia a vida e tratamentos de qualidade.
Chama-se Sardanisca, é uma gata preta, e ainda que não tenha sido intencional, acabou por transformar-se numa espécie de mascote da Clínica Veterinária Patas da Linha, no Murtal, concelho de Cascais. “Era uma gata de rua que entrava e saía da clínica conforme lhe apetecia, começou a dormir aqui e a criar uma certa ligação com os clientes. A dada altura, deve ter passado por um processo de envenenamento e teve uma falha hepática aguda, e eu tive de tratá-la. Podemos dizer que a Sardanisca nos adotou”, explica a diretora clínica, Andreia Rodrigues. É uma história com final feliz, reforça a médica veterinária, que acabou por ficar com ela quando a sua gata faleceu.
Aqui, é fácil sentirmo-nos em casa. Na receção, além do quadro com a mensagem “Enjoy the little things”, está exposto um boneco, uma espécie de réplica da Sardanisca, elaborada e oferecida por uma cliente.
Nesta que pretende ser mais do que uma clínica de bairro – ainda que Andreia Rodrigues não ambicione transformá-la num hospital –, o objetivo é crescer sustentadamente. “Queremos ter as melhores diretrizes e trabalhar bem. Gostaria que esta proximidade, numa ótica familiar que damos aos pacientes, mas também aos seus donos, se mantivesse no futuro.” É fácil perceber a intenção quando se entra na clínica: aos poucos, os donos vão chegando e interagindo com outros perante o olhar atento da auxiliar de veterinária, Amélia Oliveira, que trabalha com a diretora clínica desde a inauguração, em fevereiro de 2017, e que tem demonstrado uma enorme vocação para esta área.
“Na altura, foi a única entrevista que fiz, pois houve uma empatia imediata entre nós. Percebi desde logo que era a pessoa com quem queria trabalhar. Tem sido o meu braço direito, um grande apoio na clínica, faz uma excelente gestão de clientes, os animais adoram-na e tem imenso cuidado com os clientes”, explica Andreia Rodrigues.
Mais recentemente, a equipa cresceu com a entrada da médica Mariana Gomes, que está atualmente em part-time e veio conjugar as áreas de interesse da diretora clínica (dermatologia e cirurgia), uma vez que gosta de anestesia, de cardiologia e de medicina interna. “Já apostámos numa formação que a Mariana mostrou interesse em fazer. Licenciou-se há dois anos, é atenciosa com os pacientes e vai começar a tempo inteiro no próximo mês de outubro.” Acérrima defensora do bom ambiente em equipa, afirma que é fundamental “os colaboradores sentirem que têm apoio para crescer” e tenta compensar o seu esforço, sempre que possível, através da atribuição de prémios pecuniários quando a faturação cresce e supera as expectativas. “Faço questão de agradecer, sempre que possível, a dedicação das pessoas que trabalham comigo. O que faz uma boa clínica e um bom hospital é a equipa. Por mais que as instalações e os equipamentos sejam importantes, se eu tiver pessoas contrariadas a trabalhar comigo, não vai funcionar e isso reflete-se nos cuidados que prestamos.”
Com um total de 160 m2, o espaço composto por dois pisos, de 80 m2 cada, ainda só funciona no superior, estando previstas obras de alargamento das instalações no inferior. “Já estamos muito bem equipados, temos raio-X, análises clínicas, ecografia. Só investimos no ecógrafo seis meses depois de termos aberto portas, e no raio-X, um ano depois da inauguração da clínica. Como já tinha trabalhado em clínicas e hospitais muito bem equipados, senti necessidade de evoluir. Tem sido um investimento gradual, mas consolidado”, defende a diretora clínica.
Diferentes casos clínicos
Blake é um cão labrador, de um ano, que tem atopia. Veio à consulta acompanhado da tutora, Beatriz Gonçalves, de 23 anos, porque faz frequentemente otites por Malassezia, uma levedura presente na pele dos cães. Paciente da clínica desde muito pequeno, é notória a ligação já criada com a médica veterinária. Ao avistar Andreia Rodrigues, que faz questão de ir recebê-lo na receção, salta para o seu colo e demonstra alegria no reencontro. Já no consultório, para consulta de controlo da otite, dez dias depois do início do tratamento, é preciso força redobrada para que o incómodo da observação do conduto auditivo com otoscópio não desvie a atenção. “Já está muito massacrado e não gosta de ser mexido”, diz a dona. E não há nada como um biscoito para ajudar a serenar o stresse, defende a médica. “Está bastante melhor”, partilha Rodrigues, realizando posteriormente uma citologia para controlar a presença do micro-organismo em questão e confirmar o que olho clínico parecia demonstrar. “O tratamento está a correr bem e o Blake está bastante mais confortável”, salienta.
Antes desta consulta, a médica tinha acabado de operar a Mel, uma cadela com um mastocitoma no membro posterior esquerdo. “Fez-se remoção cirúrgica após ter realizado duas sessões de quimioterapia, que permitiram que o tumor reduzisse de maneira a ser possível remover com margens suficientes. Foi também retirado cirurgicamente o gânglio linfático, que faz a drenagem da zona do tumor primário”, explica.
O final da tarde foi reservado ao gato Luna, com 12 anos de idade. Com um diagnóstico de inflamação intestinal crónica, foi à Patas da Linha fazer uma ecografia de controlo após o início da medicação. “Ecograficamente, o intestino está a recuperar a arquitetura normal e o Luna está neste momento a aumentar de peso, tendo os vómitos e diarreias controlados”, contextualiza a médica.
Animais que carregam histórias de vida
Quando a clínica abriu, os serviços de dermatologia e de cirurgia estariam à partida assegurados, pois têm sido as áreas em que Andreia Rodrigues mais tem apostado em interesse e formação. “Gostava de ter uma sala de cirurgia para serviços mais rotineiros e outra para cirurgias que necessitem de uma assepsia diferente. Para isso, seria importante ter uma sala maior no piso inferior para procedimentos cirúrgicos que exijam cuidados diferenciadores e isso poderá fazer sentido se tivermos alguém a trabalhar connosco que goste da área de ortopedia e neurologia, por exemplo, para complementar a oferta que já temos.”
O crescimento da clínica tem sido estruturado e feito à medida que os serviços vão estando disponíveis. “Já estamos com um projeto para um hotel de gatos e gostaria de ter um consultório específico para eles, com música ambiente e um espaço mais calmo, no piso inferior, pois são animais peculiares e que entram mais em stresse nas consultas veterinárias.” A previsão é que o piso inferior esteja a funcionar daqui a cerca de um ano, estando ainda equacionado o alargamento do horário. Atualmente, a clínica está aberta todo o ano, de segunda a sexta-feira, das 10 h às 13 h, e das 15 h às 20 h, e aos sábados, das 10 h às 13h30, fechando ao domingo.
“Tentamos prestar o melhor serviço ao dono para que ele sinta que é respeitado quando vem à clínica, mas também ao animal, porque estamos a tratar de uma vida. E essa vida não pode ser desvalorizada”, defende a diretora clínica. É por isso que dá atenção aos pormenores, mas também às histórias que surgem diariamente. “Há pessoas que perderam um filho e que transferem as suas emoções para o animal de companhia. Outras estão sozinhas e o cão ou o gato são a sua única alegria”, destaca Andreia, sublinhando que, mais do que tratar de pacientes, tenta perceber as histórias de animais que, não raras vezes, “são a única tábua de salvação dos donos”.
A ideia de apostar num negócio próprio foi totalmente apoiada pelos seus pais, que mais recentemente confessaram ter tido algum receio de que algo não corresse bem. Porém, nunca o demonstraram para que a filha não sentisse qualquer entrave à sua decisão. Dois anos e meio depois, e com uma clínica a crescer, Andreia não tem tempo para ir de férias, mas sente-se realizada, confessa-se feliz e com a certeza de que foi a aposta certa no momento indicado. “Durante o ano em que estive a montar a clínica, não consegui estar centrada apenas nisso, tive de trabalhar em simultâneo. Tem sido um investimento pessoal muito grande, mas não estou de todo arrependida.” O espaço foi decorado e pensado à sua medida, tendo a médica escolhido cada pormenor, como a cor da parede ou a escolha do candeeiro em forma de girafa no seu consultório.
Aprendizagem contínua
Andreia Rodrigues nunca tinha trabalhado na zona onde abriu a sua clínica. No começo, os donos chegavam muito através da típica publicidade boca a boca que ainda hoje funciona e traz novos clientes. Com páginas de Facebook e Instagram, a clínica já tem hoje clientes mais fidelizados e sempre que denota alguma incapacidade económica por parte dos mesmos, defende que se discutam as alternativas disponíveis. “Damos um passo de cada vez, gerindo a carteira do cliente e tentando prestar o melhor tratamento mesmo com essa limitação.”
Ainda que haja possibilidade de fazer atendimentos urgentes (é disponibilizado um contacto de telemóvel de urgência disponível 24 horas), as consultas são previamente agendadas. No dia anterior, os clientes recebem um SMS que funciona como lembrete da marcação. Além disso, no dia de aniversário dos animais, é enviada uma mensagem de parabéns, algo que apreciam bastante. “Por vezes, ao receberem este SMS, e caso não venham há algum tempo à consulta fazer as rotinas do animal, acabam por fazer uma marcação. Não é com esse objetivo que o fazemos, mas é o que tem acontecido.”
No caso de receber um animal em estado critico que necessite de outro tipo de cuidados e/ou internamento, Andreia Rodrigues opta por referenciar para hospitais com colegas em quem confia. “A aprendizagem é um processo contínuo e acho que temos de estar em constante evolução e tentar aprender maneiras de trabalhar diferentes. Quando comecei a trabalhar, fazia noites no Hospital SOS Vet, em Almada, ainda que exercesse também durante o dia. Era muito cansativo, mas queria aperfeiçoar os meus conhecimentos e perceber como é que se trabalhava noutros sítios com mais pessoas e direcionadas para certas áreas”, destaca.
Da mesma forma que ajuda colegas sempre que o solicitem, também recorre a prestação de serviços e ao apoio de outros médicos veterinários, se necessário. “É muito bom haver esta parceria que considero muito saudável e que deveria existir mais na classe.” Quanto à responsabilidade social, a clínica disponibiliza apoio veterinário à Associação dos Gatos do Jardim, em São Pedro do Estoril, que se dedica a gatos abandonados e promove a sua adoção.
Em final de conversa, Andreia Rodrigues não tem dúvidas e afirma convictamente: “Portugal não é um cantinho da Europa em medicina veterinária, nós trabalhamos bem”.
PERFIL ANDREIA RODRIGUES
Andreia Rodrigues, 37 anos, é a primeira veterinária da família e sempre gostou de animais. Apesar de não conseguir situar no tempo quando é que decidiu que queria seguir esta profissão, não teve dúvidas no curso a escolher, no final do 12.º ano. Tirou o curso na Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa (FMV-ULisboa) e começou a assistir a consultas e cirurgias, a partir do terceiro ano, no Hospital SOS Vet, em Almada, por iniciativa própria. Era algo que fazia a nível extracurricular, porque tinha interesse em evoluir e saber mais.
Quando terminou o curso, estagiou durante seis meses no VetOeiras – Hospital Veterinário, experiência que lhe permitiu aperfeiçoar as bases que trazia da faculdade e adquirir mais prática. Depois de apresentar a sua tese de mestrado em tibial plateau leveling osteotomy, ou TPLO, na FMV-ULisboa, inspirada por Luís Chambel, um dos sócios deste hospital, esteve a trabalhar numa clínica na margem sul, e foi fazer um estágio rotativo pelos vários serviços, durante quatro meses, na Universitat Autònoma de Barcelona. “Foi uma opção, queria ter ido já com alguma base de trabalho para conseguir absorver o máximo possível, e adorei estar lá. Continuo a achar que tenho muito para aprender, mas na altura, já tinha passado por um ano de prática clínica, fui perceber o que se fazia lá fora, aperfeiçoar conhecimentos e tirar as minhas próprias conclusões… Quando estava em Barcelona, recebi uma proposta para trabalhar no VetOeiras. Voltei a Portugal e estive durante um ano neste hospital”, conta.
Posteriormente, passou por mais duas clínicas, e tomou a decisão pessoal de trabalhar fora de Lisboa. “Estive três anos no Hospital Veterinário do Oeste, na Lourinhã, com os médicos veterinários Nuno Leal e Pedro Requicha, onde trabalhei maioritariamente na equipa de cirurgia.” Foi aqui que sentiu que aperfeiçoou a sua técnica cirúrgica e aprendeu mais sobre medicina interna, mas optou por sair quando se sentiu muito cansada, tendo regressado ao SOS Vet. Em simultâneo, decidiu abrir o seu próprio espaço e foi desenvolvendo o projeto da Patas da Linha até à sua inauguração, em fevereiro de 2017.
A diretora clínica continua a apostar na formação, frequentando um a dois cursos por ano, e, quando não encontra um tema que lhe interesse particularmente, vai por sua iniciativa aprender com outros, em centros de referência fora do País, experiência essencial para replicar alguns procedimentos na sua clínica, por vezes simples, mas eficazes, até ao nível de reaproveitamento de materiais e de diminuição de desperdício.