O Síndrome de Disfunção Cognitiva (SDC) é uma doença neuro degenerativa dos cães e gatos idosos que é caracterizada pelo declínio cognitivo gradual e aumento da doença cerebral. Baseados apenas em sinais clínicos, o SDC tem sido tradicionalmente diagnosticado em cães com 11 anos de idade ou mais. No entanto, cães que apresentam alterações na memória espacial poderão ocorrer entre os 6 e os 8 anos de idade. Esta função está altamente dependente do lobo frontal, sendo aqui que ocorre atrofia e acumulação de substância beta-amilóide antes de outras áreas cerebrais. Em gatos, baseados em dados mais limitados, a performance cognitiva e motora parece iniciar o seu declínio aproximadamente aos 10-11 anos de idade, mas a mudança funcional nos neurónios do nucleus caudado foi já observada a partir dos 6-7 anos de idade.
Uma vez que muitas doenças, incluindo o SDC, podem apresentar primeiramente sinais comportamentais, a identificação prematura destes sinais é importante tanto para a saúde, como para o bem-estar do animal. No entanto, apesar de alterações como níveis de atividade, respostas alteradas a determinados estímulos, mudanças na interação social, ansiedade, alterações do ciclo do sono-vigilância, eliminação inadequada, confusão ou deficits de memória serem muito comuns em situações associadas a envelhecimento cerebral ou SDC, outras doenças com origem não-comportamental têm de ser descartadas numa primeira fase.
Várias associações americanas (AAHA, 2005; AAFP, 2008) referem nas suas orientações para o paciente sénior que deveria ser feito um exame anual com um check-up laboratorial para pacientes de idade média e duas vezes por ano para seniores. Além disso, referem ainda que os tutores deverão ser sempre questionados sobre mudanças que possam ocorrer quer na saúde física, como comportamental (mental). A não ser que o veterinário seja proactivo a questionar os donos sobre sinais específicos, frequentemente estes não são reportados, presumivelmente porque os tutores pensam que são insignificantes ou não são tratáveis.
Também o papel do Enfermeiro Veterinário (EV), que contacta diretamente com os tutores e com os animais, na maioria das situações desde a chegada do animal até à saída, é fundamental. O EV deverá não apenas estar atento a sinais/sintomas descritos pelo tutor (momento ideal para atuar), mas também ser proactivo na busca de informações que possam ser úteis para o diagnóstico do veterinário. Além disso, este contacto privilegiado com o tutor leva a que a formação informal, com transmissão de informações sobre os sinais de SDC, deva fazer parte das tarefas diárias do EV.
Num estudo com cães com idades compreendidas entre 11-16 anos sem sinais de doença sistémica, 28% dos cães com 11-12 anos e 68% com 15-16 anos apresentava pelo menos um sinal de SDC. Noutro estudo com um grupo de 14 cães com SDC, todos os cães vieram ao veterinário para uma consulta anual de revisão e os tutores não reportaram qualquer alteração comportamental até serem ativamente questionadas pelo veterinário. Num estudo com gatos seniores que vieram à clínica para a revisão anual, 154 tutores de gatos com 11 anos ou mais foram questionados sobre sinais de SDC. Depois de eliminarem 19 gatos com problemas “médicos”, 35% tiveram um diagnóstico de SDC; 28% de 95 gatos com idades entre 11 e 15 anos e 50% de 46 gatos com mais de 15 anos.
Tendo em conta que 85% dos casos de SDC não são identificados é de extrema importância que os veterinários, os EV e restante staff tenha conhecimentos sobre os sinais desta doença, informando os tutores da importância de os reportarem. Poderão ainda ser usados questionários que permitam uma avaliação rápida e extensiva do problema em cada visita. Poderá ainda ser fornecida alguma literatura validada para educação do tutor sobre os cuidados geriátricos.
Relativamente aos sinais clínicos observados e que deverão ser questionados/transmitidos aos tutores, estes estão representados pelo acrónimo DISH: a) Disorientation (desorientação); b) Interaction (mudanças na interação com pessoas e outros animais); c) Sleep (mudanças no ciclo sono-vigilância) e d) Housesoiling (eliminação errática ou inadequada). Uma vez que a atividade também poderá demonstrar alterações ao longo do tempo em animais com SDC, adicionou-se um A para Atividade, passando atualmente a considerar-se o acrónimo DISHA.
De forma semelhante, em humanos com Doença de Alzheimer e outras demências associadas com a idade, a ansiedade, os problemas de sono e agitação, podem ser associados com o declínio cognitivo e a disfunção do lobo frontal. Existem tabelas de vários autores com resumos destes sinais, sendo que poderão ser adaptadas para um questionário a usar com os tutores dos animais idosos que esteja disponível na sala de espera e preenchido enquanto aguardam pela sua vez. Em gatos, os clínicos tendem a assumir que o SDC tem sinais semelhantes aos observados em cães.
Uma vez identificados os sinais, qualquer condição médica que possa causar ou contribuir para os sinais deverá ser descartada. Uma vez que animais geriátricos têm frequentemente múltiplas doenças concomitantes, o diagnóstico de um problema médico também não descarta a possibilidade de SDC. O diagnóstico precoce oferece uma oportunidade de tratamento também precoce de forma a que complicações possam ser prevenidas, o declínio comportamental possa ser travado, a longevidade possa ser aumentada e o bem-estar possa ser assegurado. Com o “tratamento” destes animais pretendemos melhorar a sua cognição, atrasando este processo. Infelizmente, o elixir da juventude ainda não foi encontrado e sabemos que não iremos conseguir parar o processo, apenas atrasá-lo.
Até ao próximo mês…. e sempre pelos animais!