Na Vilavet, o volume de trabalho aumenta consideravelmente no verão, ou não fosse o Algarve um dos locais de eleição para as férias de portugueses e estrangeiros. A sazonalidade é apenas um dos grandes desafios desta clínica, inaugurada há 13 anos e gerida por um casal de médicos veterinários oriundo do norte do País. Em 2015, foi tempo de remodelar totalmente a estrutura e dar uma nova vida ao espaço.
Fundada em 2007 pela mão de Ivo Lima da Silva e Joana Leonardo, a Vilavet – Clínica Veterinária, localizada em Vila Real de Santo António, é o projeto profissional do casal. Os médicos veterinários, oriundos de Braga e do Porto, respetivamente, licenciaram-se em Medicina Veterinária pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e realizaram o estágio de final de curso no Hospital Veterinário do Algarve. Apesar de terem voltado ao Norte, a vontade de regressar ao sul do país nunca desvaneceu. Assim que surgiu nova oportunidade de trabalhar no Algarve, não hesitaram e por lá ficaram… até hoje.
Além de cofundador da clínica com Joana Leonardo, Ivo Lima da Silva acumula o cargo de diretor clínico. Apesar de ter encontrado boas condições laborais em comparação com a oferta da época – estávamos então em 2005 -, rapidamente percebeu que não tinha possibilidade de progressão de carreira na clínica de pequenos animais. “As pessoas acabavam por estagnar ao fim de dois, três anos de carreira. Um ano depois, houve a hipótese de nos lançarmos num negócio próprio e avançámos”, conta o médico veterinário. Pelo caminho ficaram outros projetos e clínicas noutras zonas do Algarve, mas, em 2020, o foco está totalmente na Vilavet.
Composta por uma equipa de quatro médicos veterinários em full-time e uma médica veterinária em part-time [dedicada sobretudo à área de cirurgia], a clínica conta ainda com duas auxiliares de veterinária e um responsável pela área de grooming. Há um verdadeiro trabalho de equipa entre todos, o que sempre correspondeu ao objetivo de “tentar protocolizar ao máximo o trabalho e as orientações técnicas que são dadas a todos os elementos”, refere o diretor clínico. É seguido um fio condutor que une os vários elementos, embora seja dada atenção à liberdade profissional de cada um, às especificidades dos estilos de trabalho e às abordagens individuais. “Fazemos periodicamente uma discussão dos casos que acompanhamos, em equipa. Normalmente, todos estamos por dentro das situações e, sempre que existem dúvidas, esclarecêmo-las uns com os outros, num grande espírito de entreajuda.”
No que respeita aos tutores, é com agrado que o diretor clínico tem denotado que “uma grande percentagem de clientes aceita bem sugestões quanto à profilaxia necessária e tem o devido cuidado em cumprir os protocolos que a equipa sugere”
É com este ambiente familiar que a clínica tem crescido e superado melhor os momentos de grande volume de trabalho que obrigam a uma motivação extra quando a maioria das pessoas se encontra de férias. É que, ao contrário do que acontece noutras zonas do País, na Vilavet a sazonalidade e a localização da clínica numa zona balnear trazem desafios acrescidos. “No verão, temos dias que são muito difíceis de gerir e sentimos, por vezes, que deveríamos ter uma equipa reforçada, como acontece na hotelaria, por exemplo. Mas é muito difícil fazê-lo durante um mês ou dois para as especificidades técnicas que temos. Mesmo para áreas como a de receção ou auxiliar veterinária, um ou dois meses seria apenas o tempo de formação”, explica Ivo Lima da Silva. Chegar ao fim do verão com “a equipa intacta e motivada” é uma das prioridades, pois é “fácil sentir que os elementos acabam esta época do ano completamente desgastados”. Há que gerir não só o aumento do fluxo de trabalho, como também as emoções que se vão adensando entre todos.
Quando é preciso recrutar elementos para a equipa, um dos grandes entraves que se coloca prende-se com o momento imobiliário que Portugal vive atualmente. “As condições laborais e as propostas que fazemos são acima da média, os colegas até ficam muito interessados, mas a grande dificuldade é conseguir arranjar casa para se poder viver durante todo o ano e a um preço razoável. Estamos numa zona onde muitas pessoas arrendam casas durante nove meses e, durante o verão, pedem aos inquilinos para sair de forma a poderem arrendar à semana, no decorrer das férias. É um modelo um pouco estranho”, defende o médico veterinário.
Renovação das instalações
Enquanto clínica generalista, de primeira opinião, é muito variada a casuística que chega à Vilavet diariamente. Por esse motivo, uma equipa multidisciplinar dá resposta às exigências que surgem. Cada elemento tem tentado evoluir numa área diferente através da formação contínua. Joana Leonardo, por exemplo, concluiu duas pós-graduações em comportamento animal e já recebe alguns casos referenciados por colegas que reconhecem os seus conhecimentos nesta área, aperfeiçoados de forma mais afincada desde 2014. A vertente comportamental acaba por ser um dos serviços diferenciadores da clínica, que também investiu num novo ecógrafo, em tempos, para que a resposta em cardiologia seja realizada com maior qualidade.
Em 2015, a Vilavet recebeu uma cara nova. “Fizemos uma remodelação total das áreas de atendimento ao público: receção, consultórios e salas de espera. Apesar do espaço ser pequeno, criámos duas salas de espera, dois consultórios e áreas de recobro separadas, para cão e para gato.” Assim, o atendimento passa a ser orientado e diferenciado no que à medicina canina e felina diz respeito, prática uniformizada, a partir desta data, em toda a clínica. “Renovámos o nosso bloco operatório e modernizámos os equipamentos de monitorização cirúrgica, iluminação, mesas de cirurgia, entre outros. Originalmente, a área de estética ficava dentro da clínica, mas a direção encontrou uma loja, a 20 metros da clínica, um espaço fechado só dedicado ao grooming.” A ideia por detrás da mudança foi tornar a Vilavet mais funcional, e o rebranding e a mudança de logótipo que ocorreram na mesma altura completaram o processo.
A clínica tanto recebe casos referenciados como os referencia. “Como temos feito formação, conseguimos dar uma boa resposta a praticamente todos os casos que temos, o que também nos deixa satisfeitos. Julgo que, hoje em dia, este trabalho em rede e continuado, entre os colegas com forte interesse na área, é fundamental para que os casos sejam devidamente encaminhados, de um lado para o outro, através de uma estrutura que não é formal, mas que funciona bem”, avança Ivo Lima da Silva.
“Fazemos periodicamente uma discussão dos casos que acompanhamos, em equipa. Normalmente, todos estamos por dentro das situações e, sempre que existem dúvidas, esclarecemo-las uns com os outros, num grande espírito de entreajuda” – Ivo Lima da Silva
Sempre que a equipa considera que não tem conhecimentos técnicos ou científicos para dar resposta a uma determinada área, é preferível não arriscar. Por esse motivo, foi decidido, há cerca de três anos, não fazer mais protocolos de quimioterapia no espaço da clínica. “Fazíamos algumas situações pontuais e muito específicas, mas percebemos que a nossa estrutura não seria a mais adequada para providenciar tratamentos com citostáticos”, explica o diretor clínico, adiantando que a sugestão aos clientes, nestes casos, passa por realizar este tipo de tratamento em hospitais veterinários. “Sabemos que esta é uma limitação para alguns tutores, mas preferimos não realizar tratamentos para os quais não temos certificações nem a infraestrutura adequada.”
O lema da Vilavet é oferecer a solução que está disponível para que o cliente possa decidir em conformidade. “Mas, por vezes, um centro que tenha uma equipa mais alargada e que reúna condições para uma maior monitorização são motivos suficientes para referenciarmos um caso”, esclarece o médico veterinário.
São muitas as doenças crónicas que a equipa acompanha com grande proximidade, algumas delas, semanalmente. Mas são os casos agudos que acabam por ser “mais gratificantes”, porque se resolvem mais rapidamente e, por norma, com um desfecho bem-sucedido. Apesar de não terem realizado nenhum estudo que avalie a casuística da Vilavet, as situações mais frequentes são “patologias gastrointestinais, problemas dermatológicos, doenças cardíacas, doenças infeciosas e/ou transmitidas por vetores que se manifestam muito no Algarve”. A oncologia também tem um peso maior na prática clínica, em comparação ao que se passava há uns anos, fruto dos tempos. “Estamos mais atentos, o diagnóstico vai sendo feito de forma mais assertiva e encontram-se mais casos”, adianta Ivo Lima da Silva. No verão, também é frequente chegarem pacientes acompanhados por colegas de Lisboa que recomendam a clínica durante o período de férias dos donos no Algarve.
Maior sensibilização para a profilaxia
Com um horário aos dias úteis, das 10h30 às 13 h e das 15 h às 19 h, a Vilavet está também aberta aos sábados, das 10 h às 13 h. “Temos urgências que funcionam por contacto telefónico e sempre que acompanhamos casos que necessitem de monitorização contínua e noturna, reencaminhamos para hospitais veterinários da região.”
Os domicílios são muito pontuais e ocorrem quando os donos – sobretudo idosos com maior dificuldade de deslocação – não conseguem assegurar a ida presencial à clínica. Mas esta não é uma alternativa que agrade a Ivo Lima da Silva: “Sabemos que a clínica domiciliária é muito limitada. Até uma vacinação ao domicílio – que parece algo tão simples – pode ser muito complexa caso o animal tenha um choque anafilático”, sublinha.
Quanto à sua atividade, o médico veterinário considera que a evolução da medicina veterinária tem sido notória ao longo dos anos. “Temos profissionais muito bons e competentes, muitos colegas diplomados que voltaram para Portugal, o que pode vir a criar os embriões para, quem sabe, um dia mais tarde, podermos oferecer residências e especialidades em Portugal”, defende. No entanto, também é da opinião que o funcionamento de medicina veterinária ainda não está bem estruturado. Por exemplo, o código deontológico e de conduta nem sempre é seguido, ou mesmo reconhecido, pelos profissionais. “Existem colegas que nunca leram o código deontológico. E isto é algo que me faz alguma confusão: como é que alguém começa a trabalhar, se inscreve numa ordem profissional e não lê os estatutos e o seu código de conduta? Como é que isto ainda acontece?”, questiona. O diretor clínico da Vilavet critica ainda a “atual inexistência de estrutura e de hierarquização profissional”. Por outro lado, a falta de diferenciação da oferta acarreta outros problemas: “Começamos a entrar por outros caminhos, como por exemplo, a guerra de preços”, alerta.
Para o futuro, não tem dúvidas quanto ao que gostaria de assistir no setor: “A estandardização e nivelação do trabalho que é realizado na primeira opinião.” No que respeita aos tutores, é com agrado que tem denotado que “uma grande percentagem de clientes aceita bem sugestões quanto à profilaxia necessária e tem o devido cuidado em cumprir os protocolos que a equipa sugere”. Tudo para que, no final de cada dia, a equipa tenha a certeza de que tratou cada paciente com “honestidade e profissionalismo”.
* Texto publicado originalmente na edição de fevereiro de 2020 da revista VETERINÁRIA ATUAL.