A mesa-redonda “Posicionar o CAMV em áreas específicas da veterinária” – em destaque na 3ª edição das Conferências Veterinária Atual − lançou o debate sobre a urgência de personalizar e direcionar os serviços do setor.
Carolina Mesquita, médica veterinária com prática em dermatologia e responsável pela PeloVet começou por contar o seu percurso mais ligado à dermatologia veterinária quando estagiou em Barcelona, há 14 anos. “Para mim, a dermatologia era um autêntico pesadelo e foi ao assistir a consultas do Dr. Carlos Vich que percebi que esta área tinha um potencial enorme.” Ao perceber que sentia algumas lacunas pessoais relativamente a esta especialidade, optou por apostar precisamente nela, encarando-a como um desafio. “Depois das vacinas, os problemas de pele são das primeiras causas de procura dos clientes em consultas e envolve situações muito desafiantes”, afirmou, explicando a criação do seu próprio negócio, a PeloVet.
Ana Paula Resende, diretora clínica da Vetvisão – Centro de Oftalmologia Veterinária explicou que fez dez anos de ambulatório e que foi percebendo, ao longo do tempo, que já trabalhava para “mais de 50 clínicas e hospitais e já não conseguia dar resposta.” Acabou por optar sedear-se dois dias por semana em parceria com colegas da medicina interna e, nessa altura, sentiu um impacto porque os colegas estavam muito habituados que se deslocasse às clínicas onde havia uma grande partilha de aprendizagens, mas acabou por ser muito difícil. “Comecei a perceber que fazia sentido criar um espaço exclusivamente dedicado à oftalmologia. A Vetvisão não tem vacinas, pipetas, rações, conseguiu-se investir em equipamentos de oftalmologia que só são rentáveis para quem faz isto todo o dia e vê muitos animais.”
Joaquim Henriques é consultor em oncologia no Onevet Group e também partilhou o percurso desde que terminou o curso. “Um dia, decidi partir para Cambridge e comecei a deparar-me com alguns tratamentos, como radioterapia, quimioterapia, outro tipo de terapêuticas e apaixonei-me.” Seguiram-se tempos de dedicação à formação, com um grande esforço pessoal que o obrigou a realizar cursos no exterior que o levaram a ser responsável por várias atividades e reconhecido pelos colegas na área de oncologia. A diferenciação profissional “é um investimento com retorno”, referiu o médico veterinário porque “um cliente dedicado procura um serviço especializado”. Ao assumir um oncologista, o CAMV vai ter de acompanhar e rentabilizar o investimento.
Sónia Miranda, vice-presidente da Ordem dos Médicos Veterinários (OMV) e diretora clínica do Anicura Atlântico Hospital Veterinário contextualizou a evolução da sua carreira e salientou que quando começou a trabalhar neste último CAMV, sabia que o objetivo passaria obrigatoriamente por reunir centros de especialidade que se complementassem. Apesar de afirmar que ainda não há a capacidade de ter todas as especialidades, defendeu que “algumas delas complementam-se de tal maneira que podem responder ao facto de as pessoas estarem cada vez mais exigentes”. Essa exigência significa que estão mais disponíveis para determinados procedimentos que trazem valor acrescentado.
Na qualidade de vice-presidente da OMV, Sónia Miranda debruçou-se sobre as alterações legislativas que valorizam mais o papel do animal na sociedade. “Há um cuidado cada vez maior e sentido crítico do que é a causa animal.” Referindo-se ao período da covid-19, sublinhou o posicionamento dos animais nas famílias durante a pandemia. “Está na altura de haver seguros efetivos para os animais para que as pessoas possam fazer determinado tipo de procedimentos e não faz qualquer sentido que a nossa atividade seja taxada com um IVA a 23%.”
Nesta conversa, ficou também saliente a proliferação dos grandes grupos económicos como sinónimo de experiência profissional e de capacidade de investimento e também a questão do grau de especialista através do Colégio Europeu. “A posição da OMV é conhecida e não difere da que tinha há alguns anos. Há um regulamento que esteve em auscultação pública para poder ser aprovado que defende a existência dos especialistas do Colégio Europeu e dos denominados certificados a nível português de todos os colegas que tenham feito o seu percurso em determinada área com provas dadas” explicou Sónia Miranda. “Já tivemos uma tentativa de implementar uma situação destas especialidades em Portugal, mas não estando nos Estatutos da OMV, acabou por não ter validade. As alterações estatuárias estão a demorar tanto tempo porque dependem de uma aprovação a nível da Assembleia da República.”
Neste momento, está a haver uma reavaliação legislativa sobre a existência de ordens profissionais. “Primeiro temos de perceber em que ponto a nossa Ordem profissional irá ficar e tentar que seja adaptada àquilo que são as necessidades que todos sentimos. Estamos todos de acordo que esta situação dos especialistas deve ser regulada”, acrescentou. Ana Paula Resende referiu que houve a necessidade de desbravar muito caminho e que pertence a uma geração em que o acesso a esta formação não existia da forma como se apresenta hoje. “Acabam por ser os colegas a reconhecer o nosso trabalho. Relativamente a este reconhecimento se tornar mais formal e regulado, é urgente e um passo fundamental a ser dado.”