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Animais de Companhia

Bastonário da OMV admite abandonar grupo de trabalho para o bem-estar animal

Jorge Cid
Jorge Cid diz não estar disponível para “manobras políticas” e continua a defender permanência da pasta dos animais de companhia na DGAV.

O bastonário da Ordem dos Médicos Veterinários (OMV), Jorge Cid, ameaçou abandonar o grupo de trabalho de bem-estar animal criado pelo Governo, depois de o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, ter anunciado, na última segunda-feira, já ter escolhido Laurentina Pedroso para o cargo de provedora dos animais.

O grupo de trabalho teria sido incumbido de indicar critérios para a escolha do cargo, contudo, o nome foi revelado sem qualquer consulta ao grupo. O bastonário soube que o convite já teria sido feito em reunião com o ministro do Ambiente e diz que não estar disponível para “show-offs”.

 

“Fui convocado para uma reunião na última segunda-feira. O senhor ministro do Ambiente pediu-me para reunirmos, para trocarmos impressões, e qual é o meu espanto que apresenta que já tinha convidado para provedora do animal a professora Laurentina Pedroso. O que disse foi que fiquei estupefacto com a notícia, não pela pessoa em si, mas o ter sido nomeada uma pessoa à revelia deste grupo de trabalho, que tinha essa função”, explicou o bastonário em declarações à VETERINÁRIA ATUAL.

O grupo de trabalho para o bem-estar animal foi criado por despacho ministerial do Ministério da Agricultura no início de julho e anunciado no Parlamento pela ministra Maria do Céu Antunes na sequência de um incêndio que expôs as más condições de dois abrigos na zona de Santo Tirso, no norte do País. De acordo com Jorge Cid, o grupo foi criado não só “para estudar a problemática dos animais errantes”, mas também para decidir o destino de uma verba “que estaria disponível até setembro para ser aplicada no combate ao abandono e elencar o perfil do provedor do animal”, acrescenta.

Para o representante da OMV, o grupo tem estado a “trabalhar do ponto de vista técnico e não do ponto de vista político”. Jorge Cid assume mesmo não estar disponível para “manobras políticas”.

 

“Quando o senhor ministro anuncia isto, senti-me ultrapassado. Senti-me eu e, com certeza, os meus colegas de grupo. Portanto, o que eu disse ao senhor ministro foi para se entender com a senhora ministra da Agricultura, porque há descoordenação aqui […]. Pessoalmente, não estou disposto a participar em manobras políticas. Ou há uma intenção séria de tratar estes problemas com a retidão e o tecnicismo que são necessários para esta problemática, ou se querem arranjar medidas políticas e ‘show-offs’, eu não estou disponível.”

Jorge Cid relembrou ainda que o grupo está “a trabalhar pro bono e para fazer as coisas de forma séria”, reiterando que “enquanto houver um perfil de seriedade e de interesse real em resolver situações” estará presente, mas que “o problema vai ter de ser resolvido”. Para o bastonário, “o grupo de trabalho [nomeado pelo Ministério da Agricultura] está a ser completamente desvalorizado por outro ministério”.

 

“Levantei questões ao senhor ministro do Ambiente que têm de ser resolvidas. Ou há um reforço no interesse que este grupo continue a trabalhar ou se este grupo estiver a trabalhar e for só, como se costuma dizer, ‘para inglês ver’, não estou disponível.”

“Verbas deveriam ser aplicadas à DGAV”

Sobre a transição dos animais de companhia e de pequeno porte para a tutela do Ambiente, Jorge Cid diz-se “contra” e “intransigente” em relação à sua posição.

 

“Sou completamente contra, porque acho que os animais, num ‘todo’, têm de estar na DGAV [Direção-Geral da Alimentação e Veterinária], que é a autoridade veterinária nacional. O que se deve fazer, e tenho dito isso publicamente, e enviei cartas ao Governo, é que deve ser criado um departamento especifico para o tratamento de toda a problemática dos animais de companhia, dotada de meios humanos e financeiros, desde a contratação de médicos veterinários especialistas na área do bem-estar, saúde pública, etc., na área dos animais de companhia”, sugere o bastonário. “O problema é que, ao longo dos anos, tem havido um grande desinvestimento na DGAV, quer em recursos humanos, quer em recursos financeiros e, portanto, fazer omeletes sem ovos é muito difícil.”

Jorge Cid refere que, pelo feedback que tem recebido, “esta solução vai contra a maioria dos médicos veterinários”.

“Têm-me ligado de todo o lado, desde associações a colegas individuais, a darem-me todo o apoio para eu defender até à última a continuação dos animais de companhia na DGAV”, revela o representante da OMV.

“Sou intransigente em que o bem-estar animal e saúde pública têm de ser competência dos médicos veterinários, nunca abrirei mão disso. A saúde e bem-estar animal e saúde pública são da competência dos médicos veterinários, ‘ponto final’”, remata.

O representante da OMV defende que as verbas que vão ser atribuídas ao Ministério do Ambiente para esta problemática – “ficar com os animais de companhia” –, deveriam ser aplicadas à DGAV, por forma a “criar uma estrutura com esse fim, mas dentro da ‘casa’ normal que sempre foi e que tem competências para o efeito”.

Segundo o bastonário, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICFN), que ficou com a pasta dos animais de companhia no seguimento da sua retirada da DGAV, “não tem sequer tradição ou conhecimentos nesta área, tem de ir contratá-los”.

Propõe, por isso, a manutenção dos assuntos dos pequenos animais na DGAV, especialmente se esta puder contar com a verba que será alocada ao ICNF: “Se há dinheiro para contratar estas pessoas todas para irem para o ICNF, então, invistam também em recursos na DGAV e, então sim, vamos pedir responsabilidades à DGAV, desde que lhes deem condições.”

O responsável critica ainda a atuação do Governo quanto à DGAV nos últimos anos, afirmando que este não tem demonstrado “nenhum interesse […] em investir” na entidade.

“Mais de metade das câmaras municipais não têm médicos veterinários municipais. Isto tinha de ser nomeado pela DGAV e não é porque não há dinheiro, ao longo dos anos não tem havido dinheiro para isto. Portanto, é o primeiro sintoma de que realmente querem afundar a DGAV”, acusa.

Reiterando que nunca pertenceu à DGAV, o bastonário insiste que a decisão “não tem pés nem cabeça”.

“Em vez de investirem numa estrutura que existe, centenária, e dar-lhe meios para desenvolver novas valências, vão criar uma que não tem tradição nem conhecimentos na área. Isto parece-me completamente absurdo.”

As competências sobre os animais de companhia e animais de pequeno porte passarão para a tutela do Ambiente a partir de 1 de janeiro de 2021.

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